Era nossa última noite de viagem. Decidimos ir embora pela manhã. Eu estava um pouco triste. Não queria embora dali. De certo modo, havia me acostumado ao som dos animais na floresta, sem poluição ou barulho irritante dos carros. Também sabia que esses meus pensamentos de criança mimada não me levaria a lugar nenhum. Nem tudo seria do jeito que eu queria e teria que ter isso em mente. Mesmo assim, partir de um lugar tão bom como aquele me deixava amargurada.
Os últimos dias tinham sido muito divertidos. Eu e Trevor havíamos feito várias coisas: caminhada, explorando a floresta; visitamos a cidade local; perdemo-nos algumas vezes graças a mim; redecoramos a casa novamente, apenas mudando os móveis de lugar; nadamos muito e Trevor havia feito alguns espetinhos para assarmos na fogueira que fizemos na beira do lago. Aproveitamos muito o que aquele lugar poderia oferecer e o principal: aproveitamos a companhia um do outro. Apesar de conversamos bastante, o assunto parecia render, sendo quase infinito. Trevor fazia questão de ouvir minhas histórias atrapalhadas e cheias de humor, mas sempre que pedia para me contar um pouco mais sobre seu passado, ele se negava, falando que era chato, que servia para fazer as pessoas dormirem ou ficarem no tédio. Por mais que minha curiosidade fosse grande, deixei esse assunto quieto e como minhas experiências de vida o divertia, continuava a contar. Sempre que parava para falar, Trevor dirigia toda a sua atenção a mim, como se naquele momento, eu falasse a coisa mais importante do mundo. Será que ele era assim com todo mundo? Ao mesmo que eu gostava daquela atenção, eu me sentia um pouco incomodada. Eu tinha algo que não estava acostumada.
Desci as escadas, quase tropeçando no meu próprio pé. Tinha acabado de tomar uma bom banho e descia para ajudar Trevor. Para o look da noite, escolhi uma blusa preta do Mickey e um short branco folgado. Atravessei a sala, rumo a cozinha. Naquela noite, ele vestia uma blusa social (que para ele era simples) branca com estampa de escrita, remangada até os cotovelos e uma bermuda jeans azul-escura. Tanto ele, como eu estávamos descalços.
Reparei que Trevor colocava a comida na mesa e passei a ajudá-lo.
- Foi rápido hoje. - comentei.
- A comida estava prática e rápida. - confessei ele, colocando as panelas na mesa.
- O cheiro está muito bom. - afirmei, sentindo meu estômago roncar.
- Então, vamos comer. Até porque já escutei seu estômago roncar. - exclamou ele.
- Não se comenta sobre os barulhos que uma pessoa faz, Trevor. É indelicado e ele estar roncando é culpa sua. Demoramos demais naquela caminhada. - expliquei, sentando na mesa.
- Certo. Assumo a culpa. - afirmou ele, se servindo.Rimos e comemos. Depois que a louça estava limpa e guardada, joguei-me no sofá. Por alguns minutos, não escutei barulho do Trevor, mas resolvi esperar mais um pouco. Foi questão de ter esse pensamento e voltei a escutar seus passos. Ele se sentou na poltrona ao meu lado e colocou a garrafa na mesa de centro, portando duas taças. Peguei a garrafa e li as letras que continha no rotulo. Devolvi ela na mesa e pensei sobre.
Trevor sorriu e me deu uma das taças. Respirei fundo, peguei a taça e a coloquei ao lado da garrafa, cruzando os braços na frente do tórax.
- O que foi? Eu achei essa garrafa na dispensa. Que tal fecharmos essa viagem com chave de ouro? -perguntou ele.
- Dispenso. - foi a única palavra que falei.
- Por que? Não tem graça beber sozinho. - afirmou ele.
- Vamos pegar estrada amanhã cedo. Não é seguro.
- Até amanhã, o efeito já passou.
- Mesmo assim, vou guardar isso.Levantei, segurando a garrafa pelo gargalo. Parei subitamente, sentindo um braço me segurar. Virei, dando de cara com Trevor. Vi sua mão se estender, pedindo a garrafa. Agora, eu estava brava. Empurrei a garrafa contra o peito dele e parei do lado oposto da sala.
- Qual é o problema, Elisa? - perguntou ele.
- Nenhum. - confirmei, como se a palavra tivesse o significado oposto.
- Então, venha e tome uma taça. - comentou ele.
- Eu sou mais inteligente. Não bebo. - afirmei, sentindo um nó na garganta.
- Para de ser chata, Elisa. O que custa? - perguntou ele, indignado.
- Agora eu sou a chata? Por não querer beber? Você que está bancando o idiota com essa garrafa. - retruquei, elevando o tom.
- Sou idiota por querer me divertir? Até parece um crime!
- Deveria mesmo ser crime ser tão estúpido.Vi ele me ignorar e começar a abrir a garrafa. Bufei e disse:
- Não vou ficar assistindo isso.Sai da casa, batendo forte meu pé no chão. Sentei nos degraus da entrada e as primeiras lágrimas vieram. Por que ele não entendia que aquilo era um mal para ele? Eu queria tanto estar em casa. Passei a mão na nuca, deixando as lembranças horríveis invadirem minha mente. Eu sabia de como uma bebida poderia mudar uma pessoa. Meu pai era incrível e eu o amava, mas quando bebia, eu não reconhecia aquele homem. De calmo e atencioso, ele passava para agressivo, explosivo e muito irritado. Eu tinha medo. Medo do Trevor ter aquela mudança; de me fazer odiá-lo pelo meu passado e de querer que ficasse longe. E de repente, as memórias ficaram vivas na minha mente. Os gritos parecia mais altos e eram o motivo de minhas lágrimas caírem na terra. Tentei normatizar minha respiração e limpei bruscamente minhas lágrimas. Eu não queria voltar, não agora.
Olhei para frente e vi um coelho comendo tranquilamente. Tentei me aproximar devagar.
- Ei, amiguinho. Vem cá!- chamei-o.Ao me olhar, ele pulou para dentro da floresta.
- Não fuja de mim!- pedi, seguindo ele.Como se fosse uma deixa, o coelho correu mais e continuei seguindo seus pulos. Não que a floresta fosse perigosa, eu só queria ver aonde íamos parar naquela corrida. Até que tudo de ruim aconteceu. Eu não vi o exato momento que o coelho mudou de direção e continuei correndo na que estávamos. Um buraco se abriu debaixo dos meus pés e cai com tudo do chão. Trinquei os dentes, sentindo o impacto que minha cabeça deu contra superfície dura de uma pedra e senti uma dor irradiar pela minha perna esquerda. Eu não conseguia me mexer, muito menos sair dali. Pontadas de dor na minha cabeça me fazia a fechar os olhos cada vez mais. O ar frio percorreu meu corpo e deixei meu último pensamento escapar pelos meus lábios.
- Trevor, me ajuda...- disse, antes de desmaiar ali mesmo.Não sei quanto tempo passou, mas acordei com os gritos de Trevor. Ele me olhava da beira do buraco.
- Calma, Elisa. Eu vou te tirar daí. - comentou ele, desesperado.Não me lembro de sair daquele buraco, mas eu tinha um vislumbre de ter sido carregada pelo Trevor e ver seu olhar carregado de tristeza e agonia. Quando por fim, consegui acordar e dizer alguma coisa, já estava na casa. Percebi que estava deitada no sofá e decidi levantar. Minha cabeça parecia que ia cair e apoiei-a com as mãos.
- Ai, como dói. - resmunguei.
- Ainda bem que acordou. Estava tão preocupado. - confessou ele, se sentando ao meu lado.
- Por que está tão frio? - perguntei, começando a tremer.
- Não está tão frio, Elisa.
- Está sim. Muito frio.Vi ele olhar rapidamente para a lareira e depois se colocar de pé, pegando-me nos braços. Trevor me colocou perto das chamas e pude senti seu calor. Era tão bom. Estava sentada com Trevor, vendo as chamas. Senti ele tentar me colocar no chão por completo, mas passei meus braços ao seu redor, abraçando-o. O calor que vinha dele também era muito bom. Arrumei-me, colocando minha cabeça em seu ombro e decidi tirar um cochilo ali mesmo.
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Written In The Stars
Teen FictionElisa é uma garota comum. Está no seu último ano escolar e vive tranquilamente com sua mãe num apartamento em um bairro de classe média. Porém, sua vida mudou drasticamente quando um garoto entra em seu quarto. Trevor só queria liberdade e fugir d...