O toque úmido e salgado das ondas do mar são ferozes e invasivos em minha pele. Enquanto tento emergir, a pressão da água me puxa para as suas profundezas. Debato meus braços e pernas. Alcanço a superfície e puxo todo o ar que consigo para dentro dos meus pulmões.
Após esse segundo de trégua, o jato espumoso força meu corpo para que eu me mantenha imóvel. Afundo entre as bolhas salgadas. Minhas mãos insistem em não desistir.
Cedo à necessidade de tentar subir e entrego o meu corpo à vontade da maré. A água salgada agora invade minhas narinas e boca. Tusso, e tudo o que eu consigo é inundar o meu pulmão com a água do mar.
Esse é o gosto da morte? O fim é cercado de água e sal? Meu corpo enfim consegue naturalmente alcançar a superfície. Sem lutar, deixo o fluxo das águas me levar para o meu destino. Tento inspirar um fio de ar. Da minha boca e narinas jorra água junto com uma secreção. Meu corpo expurga o que foi inalado. Talvez haja uma esperança para mim. Como vim parar aqui, não sei.
Com meus ouvidos levemente surdos da pressão da água, ouço um som que parece vir das ondas "Mariiiiina".
Consigo recuperar um pouco de força e projeto o meu corpo para a frente, movendo braços e pernas para ganhar impulso com a maré. "Mariiiina".
Não sei dizer se é uma voz. Parece mais um canto angelical. Algo sagrado, ritmado com o som de harpas. "Mariiiina".
Consigo avistar um facho de areia há uns 200 metros de mim. Tento tocar meus pés no chão, mas ainda é impossível. As ondas me atrapalham, tentando me sugar novamente para dentro delas. A água e o sal tentam me cegar. "Mariiiiina".
O canto está cada vez mais próximo. "O mar está me chamando?", me questiono, não me permitindo pensar nisso mais do que um segundo. Preciso continuar a luta pela minha sobrevivência.
Meus pés enfim conseguem tocar o fundo do mar. Fico com metade da minha cabeça para fora da água. Tento desajeitadamente remar com os braços para continuar a minha fuga. A pressão do mar me puxa para trás, mas meus braços e pernas são mais fortes desta vez. "Mariiiiina".
Neste momento, não sei explicar o que acontece. "Mariiiina". O canto, mais próximo de mim, parece vir de dentro da minha cabeça. "Mariiiiina". Dois pares de mãos esverdeadas enlaçam minha cabeça e me afundam para dentro da água. Só consigo enxergar cotovelos verdes com barbatanas e escamas enquanto luto contra eles. Uma cauda longa e arroxeada tapa a minha visão com bolhas salgadas. Tento respirar e atingir a superfície, mas esse par de mãos com membranas natatórias entre os dedos são mais fortes do que eu. "Que porra é essa?", penso, enquanto sou sugada para o fundo por essas forças descomunais.
"Mariiiiina". A voz me chama. "Mariiiiina". Não consigo mais ter forças para lutar. "Mariiiina". Deixo-me ser levada. "Mariiiiina". Talvez esse seja o meu destino. "Mariiiiina". Talvez esse seja o meu fim.
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Hoje tem prólogo + capítulo 01 de bônus. É só continuar. No final do capítulo 1 tem um recadinho pra vocês! <3
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Profundezas
FantasyMarina é uma jovem comum. Seu maior dilema é tentar lidar com a superproteção de sua mãe, Janaína, sobretudo quando ela se aproxima do mar. Após Janaína ficar desempregada, elas precisam voltar para a casa abandonada da família, à beira-mar. Em uma...