UM ESTRONDO vindo da praia faz Marina acordar do desmaio. Ela levanta do chão ainda desorientada e aos poucos vai recobrando os sentidos, lembrando-se da conversa que teve há alguns minutos com a sua mãe. "Assassina... Jurada de morte... Pacto... ". Após ouvir tantos absurdos, ela lembra da mãe fazendo um movimento estranho com uma adaga prateada, o desmaio a seguir, e a explosão.
Marina corre o mais rápido que consegue para fora de casa, sem ter noção de quanto tempo ficou desmaiada. Talvez sua mãe ainda esteja ali por perto e ela consiga impedi-la de se matar. Do lado de fora ela para, sem saber se vai para a praia ou para a estrada. A lua cheia está no meio do céu. Já deve ser meia-noite. "Parabéns para mim, por esse aniversário de 18 anos de merda!", pensa.
Ao olhar em direção à praia, percebe que há um clarão no meio do mar, como se fosse um spot de luz que ilumina a superfície calma das águas salgadas em direção à lua. Marina não perde tempo e corre até lá para saber o que é aquilo.
A praia está deserta, sem sinal da festa havaiana que Martin havia falado mais cedo que teria. Ela percebe o vulto de uma mulher em pé, parada próxima ao quiosque, que possui uma luz fraca. Será Janaína? Ela utiliza todas as forças que ainda restam em suas pernas para chegar até a mulher, com aquela impressão costumeira de que está sendo vigiada pela escuridão.
Marina chega até a mulher e toca em seu braço, puxando-a para si. É Lorelei. Ela está com um olhar perdido, em estado de choque, olhando para o clarão.
- Lorelei! O que houve? Cadê todo mundo?
Lorelei olha para Marina e volta do estado de transe em que se encontra.
- Marina... Eu não estou conseguindo processar direito tudo o que aconteceu. Estava rolando a festa, o povo tocando ukulelê, comendo frutas, eu estava beijando o Martin tão gostoso! Daí a sua mãe passou correndo pela gente, se jogou no meio do mar e desapareceu.
- Como assim? Do nada?
- Sim. Do nada! Martin e Jonas saíram correndo atrás dela e me deixaram aqui. Eles disseram que voltariam daqui a pouco, entraram no mar, mergulharam e não voltaram mais. Eu fiquei aqui igual uma idiota olhando para o meio do nada, sem sinal de mais ninguém. Todo mundo da festa saiu correndo depois disso e se jogou no mar. Eu não consegui enxergar ninguém para pedir ajuda. Abri meu WhatsApp e o celular bugou. Não quer nem ligar mais. E quando deu meia-noite, houve uma explosão e saiu um clarão do meio do mar e... Será que eu estou ficando maluca?
Lorelei começa a chorar histericamente e Marina a abraça, tentando juntar todas as peças e fazer com que algo daquela noite imprevisível e confusa tenha algum sentido dentro da sua cabeça.
- Calma, Lorelei. Eu tenho tanta coisa para te contar, que não sei nem por onde começar. Você disse que a minha mãe se jogou no mar? E depois disso todo mundo também se jogou atrás dela? Aonde?
- Ali - Lorelei aponta para a direção em que Janaína se jogou mais cedo.
Marina caminha até o limite entre a areia e o mar. Ainda consegue se lembrar de não tocar a água. Ela olha para a luz branca que sai do meio do oceano e se projeta até a lua, como algo geometricamente calculado.
Um ruído nas costas de Marina chama a sua atenção. É como uma respiração acelerada, seguida de grunhidos, na escuridão. Marina decide não ter medo. Aquela história precisa ter algum sentido. Ela caminha em direção ao breu.
- Escutou um gemido, Lorelei?
- Não escutei nada. Eu estou com medo. Vamos embora daqui. - choraminga Lorelei.
Marina percebe a silhueta de algum ser muito alto encostado na árvore. Dois olhos úmidos, com uma pupila esverdeada e dilatada a encara. Ela não pode ter medo. Precisa lembrar das últimas palavras de Janaína: "Seja uma garota corajosa."
VOCÊ ESTÁ LENDO
Profundezas
FantasyMarina é uma jovem comum. Seu maior dilema é tentar lidar com a superproteção de sua mãe, Janaína, sobretudo quando ela se aproxima do mar. Após Janaína ficar desempregada, elas precisam voltar para a casa abandonada da família, à beira-mar. Em uma...