☼ ☽ Número Oito ☽☼

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Eu estava usando um vestido.

Eu estava usando um vestido em casa.

Eu estava usando um vestido em casa numa noite de segunda-feira.

Se alguém me visse, eu provavelmente diria que os shorts limpos acabaram e estava muito calor pra colocar uma calça. Só que a verdade vergonhosa era que eu queria me sentir bonita, então tirei alguns pelos da minha sobrancelha com a pinça, passei uma base no rosto e prendi meus cabelos num rabo de cavalo arrumadinho. Minha mãe me viu no corredor e achou um amor.

Eu sorri com o elogio, seguindo meu caminho para a sala... até que meu celular vibrou.

Mateus Arantes: oi Lis

Foi horrível. Meu coração pareceu apertar. Eu paralisei. Sem respirar mais que o suficiente, sem piscar mais que o necessário. O momento era sufocante e pesado.

E, de novo, a campainha tocou.

Kauê trazia uma caixa de pizza desta vez.

— Você não fez isso! — eu gritei, com raiva.

Ele coçou a cabeça.

— O que foi, Elisa? — minha mãe gritou de lá do quarto.

— Kauê trouxe pizza pra gente! — fingi felicidade no tom de voz, mas estava fuzilando meu amigo.

— Me traz um pedaço aqui!

— Pode deixar, tia Nanda! — o filho da puta do Kauê respondeu.

Eu deixei que ele entrasse e fechei a porta numa batida forte.

Foda-se, tô irritada.

— Kauê Santos Lima! — eu disse lenta e firmemente. — Você não pode cooperar com o Arantes.

— O quê? — ele fingiu não saber do que eu falava.

— Nem vem! — o interrompi. — Ele me manda uma mensagem e você aparece pra ver/apaziguar minha reação. Eu não nasci ontem.

Kauê deixou a pizza no balcão e me segurou pelos ombros.

— Só vai ganhar pizza depois que conversar com ele.

— Me obrigue! — rangi.

— Tá bom. — Kauê vasculhou o bolso, apanhando o celular e começando a discar um número.

Ah não.

— Ah não!

Roubei o celular da mão dele e cancelei a ligação antes que Mateus atendesse.

Aí, mesmo inconformada, peguei meu próprio celular e visualizei a mensagem.

Elisa: oi

Elisa: não faz mais isso

Mateus Arantes: eu precisava da sua atenção, e você adora pizza

Elisa: não interessa

Elisa: eventualmente eu te responderia

Mateus Arantes: e quantos dias isso ia levar?

— É melhor você parar por aí. — Kauê aconselhou, espiando minha conversa.

Respirei fundo. Ele tinha razão. Quando a gente brigava, a gente se aproximava. E eu queria distância e pedi pro Kauê me ajudar nessa missão.

Elisa: ever dade. Boa jogada. O que foi, tá tudo bem?

Mateus Arantes: acho que tá. E você?

Elisa: tô suave

Mateus Arantes: achei um filme seu aqui em casa. Talvez você queira de volta...

Elisa: cê podia me mandar pelo Kauê, ele tá quase morando aqui mesmo

Mateus Arantes: ele também tem me enchido o saco, relaxa

Elisa: vou te devolver sua blusa e sua Polaroid por ele, tá bom?

Mateus Arantes: pode ser... tem mais alguma coisa sua que esteja comigo?

— Há uns meses eu até diria "meu coração", mas o jogo virou. — comentei maldosamente pro Kauê, que riu.

— Dor de cotovelo de ex-namorada é foda.

— Vai se ferrar! — mesmo irritada, eu ri.

Elisa: meu caderninho de trechos de filmes!!!

Mateus Arantes: achei que vc tinha me dado ):

Elisa: sonha

Mateus Arantes: vou pensar no seu caso

Elisa: quero tudo na minha mão até semana que vem

Elisa: é nois

Elisa: flws

Mateus Arantes: quero negociar pelo caderninho

Elisa: isso não é um divórcio, se liga

Larguei o celular com um sorriso no rosto.

Droga.

Eu amava conversar/brigar com ele.

— Pronto. — fiz uma cara de tédio pro Kauê e recuperei a sanidade. — Quero pizza.

Um Conto Não Depressivo Sobre DepressãoOnde histórias criam vida. Descubra agora