Era quase nove horas da manhã. Eu estava no limite, me sentindo suja e suada. Se eu tivesse sido esperta, teria dado um beijo no Lucas enquanto ainda era madrugada. Agora eu já estava toda acabada e sonolenta, e ele nem estava mais tentando dar em cima de mim.
Tudo bem, era meio que isso que eu queria. Eu nunca realmente ficava com os caras com quem conversava, e isso vai ser um daqueles problemas que eu vou levar até os quarenta anos, que é quando vou ter coragem de arranjar um terapeuta e decidir lidar com meus problemas afetivos. É. Está tudo normal no mundo caótico da Elisa.
— Até a Aline já foi embora. — fiz uma careta. — Eu nem sou próxima de vocês e estou praticamente morando aqui.
— Devia vir mais vezes. — o ainda bêbado Júlio disse, animado. — Meu Deus, quem diria que você era tão da hora?
Da hora. Cúmulo do absurdo.
— É. Hora de ir. — anunciei, me levantando do sofá. — Hasta la vista, queridos.
Os zumbis de ressaca que restavam na sala me responderam com murmúrios, o que me fez rir e tomar vergonha na cara para aceitar que a festa tinha mais do que acabado: tinha morrido.
— Eu te acompanho até a saída. — Lucas avisou.
— Eu sei o caminho.
Não, não foi grosseiro. Foi só óbvio. A porta de entrada estava a poucos metros de distância, pelo amor de Deus!
— Eu sei que você sabe o caminho. Eu quero te acompanhar, você me deixa te acompanhar. Somos amigos agora.
— Nós somos? — o olhei de soslaio, um sorriso desafiador beirando meu rosto.
— É claro que somos. O próximo rolê é na terça, tenha um feliz domingo e durma muito na segunda. Vamos numa Hamburgueria foda.
Parei rente a porta, surpresa.
— Você fala palavrão!
Lucas George revirou os olhos.
— É uma das primeiras coisas que aprendemos estudando outras línguas.
— Faz sentido. — ponderei, pensativa. — Então... somos amigos?
— Por enquanto. — ele afirmou, sincero. — Logo vamos nos aproximar, aí seremos muito amigos, aí vai implorar pra eu te beijar de novo e então seremos um casal.
— Beijar de novo? Por que eu imploraria pra-
Olha, eu não vou negar. Ele respondeu a minha pergunta da melhor maneira possível.
Num momento, eu estava confusa com a sensação de lábios ressecados contra os meus. Então eu senti uma mão segurando minha bochecha e a outra se posicionando na base das minhas costas, como que pra me impedir de me afastar. Mas foi só ele tocar a ponta da língua no meu lábio inferior que qualquer plano de escape foi embora. Minha boca abriu levemente, e minha língua teimosa quis conversar sem palavras. Não que meus braços tenham ficado quietos – eles logo se envolveram no pescoço do meu mais novo amigo.
Então, sim, nós nos beijamos.
Agora eu poderia implorar por outro beijo... Um dia.
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Um Conto Não Depressivo Sobre Depressão
Short StoryElisa Bonifácio é uma universitária como qualquer outra que você pode acabar encontrando na rua: não é a melhor da classe, mas tem sonhos e aspirações. Algo sobre seu sorriso contido e frases inteligentes pode acabar te atraindo, porém dificilmente...