☼ ☽ Número Quatro ☽☼

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Era quase nove horas da manhã. Eu estava no limite, me sentindo suja e suada. Se eu tivesse sido esperta, teria dado um beijo no Lucas enquanto ainda era madrugada. Agora eu já estava toda acabada e sonolenta, e ele nem estava mais tentando dar em cima de mim.

Tudo bem, era meio que isso que eu queria. Eu nunca realmente ficava com os caras com quem conversava, e isso vai ser um daqueles problemas que eu vou levar até os quarenta anos, que é quando vou ter coragem de arranjar um terapeuta e decidir lidar com meus problemas afetivos. É. Está tudo normal no mundo caótico da Elisa.

— Até a Aline já foi embora. — fiz uma careta. — Eu nem sou próxima de vocês e estou praticamente morando aqui.

— Devia vir mais vezes. — o ainda bêbado Júlio disse, animado. — Meu Deus, quem diria que você era tão da hora?

Da hora. Cúmulo do absurdo.

— É. Hora de ir. — anunciei, me levantando do sofá. — Hasta la vista, queridos.

Os zumbis de ressaca que restavam na sala me responderam com murmúrios, o que me fez rir e tomar vergonha na cara para aceitar que a festa tinha mais do que acabado: tinha morrido.

— Eu te acompanho até a saída. — Lucas avisou.

— Eu sei o caminho.

Não, não foi grosseiro. Foi só óbvio. A porta de entrada estava a poucos metros de distância, pelo amor de Deus!

— Eu sei que você sabe o caminho. Eu quero te acompanhar, você me deixa te acompanhar. Somos amigos agora.

— Nós somos? — o olhei de soslaio, um sorriso desafiador beirando meu rosto.

— É claro que somos. O próximo rolê é na terça, tenha um feliz domingo e durma muito na segunda. Vamos numa Hamburgueria foda.

Parei rente a porta, surpresa.

— Você fala palavrão!

Lucas George revirou os olhos.

— É uma das primeiras coisas que aprendemos estudando outras línguas.

— Faz sentido. — ponderei, pensativa. — Então... somos amigos?

— Por enquanto. — ele afirmou, sincero. — Logo vamos nos aproximar, aí seremos muito amigos, aí vai implorar pra eu te beijar de novo e então seremos um casal.

— Beijar de novo? Por que eu imploraria pra-

Olha, eu não vou negar. Ele respondeu a minha pergunta da melhor maneira possível.

Num momento, eu estava confusa com a sensação de lábios ressecados contra os meus. Então eu senti uma mão segurando minha bochecha e a outra se posicionando na base das minhas costas, como que pra me impedir de me afastar. Mas foi só ele tocar a ponta da língua no meu lábio inferior que qualquer plano de escape foi embora. Minha boca abriu levemente, e minha língua teimosa quis conversar sem palavras. Não que meus braços tenham ficado quietos – eles logo se envolveram no pescoço do meu mais novo amigo.

Então, sim, nós nos beijamos.

Agora eu poderia implorar por outro beijo... Um dia.

Um Conto Não Depressivo Sobre DepressãoOnde histórias criam vida. Descubra agora