a entrega vale o sacrifício de você chorar no metrô mais lotado da cidade. ao final do dia, você vai se lembrar que está vivendo a experiência mais insana que é viver sem medo ou resquício do que deixaram em cima dos seus ombros.
eu conheci um cara que não tinha essa força de bater no peito e assumir. medos, fugas e relacionamentos. acontece. é que eu sempre fui prematuro. sempre arrisquei, era tudo ou nada. ou eu amava violentamente ou ficava à merce das coisas que são rasas e não me tocam. eu fiquei com esse cara. eu olhei no olho dele e disse que a partir do momento que começasse a me doer, eu falaria e tentaria ir embora. não fui por mal, sabe? só existia um espaço entre minha entrega desmedida e a ausência de peito da parte dele. não o culpo. não mais. ele tá seguindo seu caminho, abraçando outros espaços, quem sabe corpos, vidas, tentando seu melhor para não se perceber sozinho e desamparado no universo. mas todos nós estamos, né? sozinhos e desamparados no seio do universo. o que eu estou tentando dizer é que há pessoas que se jogam e pessoas que ficam paradas, esperando. pessoas que estão prontas sempre que possível e pessoas que não nasceram prontas para nada. eu nasci: pronta e ereta. fui de dar amor mesmo, não nego. nem quero. é só que, sei lá, às vezes dói um pouco o vácuo que existe entre tanto que dou e o pouco que recebo. com esse cara foi meio que assim. eu estava lá na frente na corrida de quem se entregava mais e ele estava no começo da corrida, se é que tinha se despertado para vir atrás de mim. mas até que o sexo era bom. só que sexo acaba e no dia seguinte tem um vazio. eu não consigo nem te explicar. só sei que doeu em mim enquanto eu descascava cebola e pensava que talvez eu tivesse sido só mais um. não que eu precisasse ser o selecionado para alguma coisa muito especial. é só que eu estava ali, tão entregue, e ele tão longe, com medo.
as pessoas têm medo, né? deve ser isso. medo. de recomeçarem. de se permitirem sentir. de se pegarem afoitas ou imersas pela ideia de outro alguém entrando e ocupando os espaços no sofá, cama, quem sabe pensamentos. não as culpo. cada um com seus processos. é que pra mim é difícil não me jogar de cabeça. ser contido. me resguardar numa redoma irretocável, onde nenhuma dor me atingirá, onde nenhuma sensação mais maluca vai tomar conta de mim. eu gosto de sentir. o cheiro, o gosto, a vontade de estar perto. por essa razão a entrega vale o choro em pleno metrô lotado em horário de pico. porque é sinal de que você está se entregando com o coração mais honesto. pois seu coração tá pulsando e não morreu ou se entregou ao movimento do desinteresse. porque você precisa, vez ou outra, saber que está viva.
esse cara deve estar vivo também. mas não como eu. porque eu ainda deixo meu peito escorrer pelo asfalto.
eu gosto de sentir, caso contrário não respiro. as pessoas fogem em direção a muitas coisas.
qualquer lapso de superficialidade acende nelas uma fagulha. brilha os olhos relações vazias, ocas e rasas. é o mundo pós-moderno, talvez? sei lá, uma outra hora converso sobre.
é que hoje eu chorei no metrô. de saudade. porque eu entreguei até o que não tinha e ele, não sei. porque eu pulei da ponte e ele ficou me observando. e quando eu estava lá embaixo, já sozinho, cheguei à conclusão de que tudo bem ficar por lá. algumas pessoas têm medo, não é?
medo.
e algumas têm vontade de viver.eu tô vivendo. nem que seja morrendo de chorar nos transportes públicos por aí.
a entrega vale o sacrifício da lágrima.
Via:
_Textos cruéis de mais para serem lidos rapidamente
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Entre Linhas E Reticências (...)
FantasyEdit 1. Esse livrineo me acompanha a uns anos, nele contém escritos que descrevem algumas fases da minha vida e outros que só me tocaram. Ele acompanha alguns leitores também, e quando eu não puder mais adicionar textos ele ainda vai estar aqui pra...