I Don't Even Know Your Name

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Não acredito que estou aqui! É a sétima vez esse mês que eu passo a tarde toda na escola, escondida em um canto da sala de música observando-o tocar. Já faz mais de um mês que eu passo todas as quintas-feiras prestando atenção no seu jeito de cantar, como seus sentimentos escoassem pelos instrumentos que ele toca...

Hoje ele escolheu a guitarra e está ensaiando uma música nova. Provavelmente uma autoral porque ela não me é familiar. A voz dele me carrega para longe de tudo, como um tipo de teletransporte para um lugar de paz, sossego e patos, pera ai, PATOS?

-Merda de telefone – procurei desesperadamente o celular dentro da mochila. A única que poderia ter esse toque era a desgraçada da minha melhor amiga/prima: Josephine.

-Tem alguém ai? - meu "muso" levantou e caminhou até o fundo da sala, me obrigando a me esconder atrás de um piano antigo. -Olá?

Como explicar o que eu estava fazendo ali? Como eu ia dizer que a mais de um mês eu venho aqui, escondida, assistir enquanto ele toca? Aparentemente ele desistiu de procurar a origem daquele som e voltou para o seu "mundinho". Esperei ele voltar a cantar e sai. Corri até os portões da escola, onde Josephine me esperava.

-Você demorou! O que estava fazendo, Ellie? - Josy, como seus amigos costumam chamá-la, estava encostada em seu, muito discreto, carro vermelho sangue com os braços cruzados e batendo o pé impaciente.

-Eu quase fui pega por sua culpa! Por que você colocou esse som de patos como toque?

-Eu queria algo diferente, poxa. Não se preocupa, no meu celular o seu toque é uma vaca. - Josy riu, me fazendo revirar os olhos. Ela sempre foi assim: excêntrica, divertida e louca. Josephine, na realidade, é minha prima, crescemos juntas até os 7 anos quando seus pais vieram para o Canadá. Pouco depois, quando completei 10 foi a minha vez de vir morar aqui com meus pais, desde então somos inseparáveis. - Alôôô, Ellie? Tá pensando no carinha da guitarra de novo?

-O que? Não. - corri para o lado do carona e entrei no carro. Josy entrou em seguida e ligou o carro.

-Você é tão corajosa, Ellie. Faz, acontece, briga com metade do mundo se for preciso, quebradoras de regras e tudo, mas não consegue chegar em um carinha e dizer: "Oi, acho sua música muito boa. Você é foda. Vamos dar uns beijos?"

-Credo Josy! Eu não sei explicar o que acontece comigo. Eu nunca fui a menininha tímida e envergonhada mas algo nele me faz ficar assim.

-Vocês dois me irritam e eu nem sei quem ele é. Enfim, pronta para grafitar? - Josy olhou pra mim, os olhos verdes brilhando de excitação.

-Eu nasci pronta meu amor. - sacudi minha mochila, fazendo os vidros de spray se agitarem dentro dela.

Josy e eu somos as "ovelhas negras" da nossa família cheia de médicos, advogados, engenheiros e militares, minha mãe diz que foi a influência de nossa avó que sempre foi muito ligada ao mundo das artes e sonhava em ser atriz. Esse amor foi passado para nós duas em todas as férias de verão em que íamos para sua casa no interior e ela sentava no piano e passávamos a tarde cantarolando canções infantis. Eu costumo dizer que minha paixão pela música surgiu por causa desses momentos, tanto que meu instrumento favorito é o piano. Josy absorveu seu amor pelas artes plásticas: pintura, desenho, escultura e, o seu mais novo hobbie: o grafite.

Uma vez por semana vamos para uma área abandona da cidade, cheia de galpões e armazéns desativados, grafitar umas paredes e alguns carros que são jogados lá. Desenho não é muito a minha praia mas gosto de ir para escrever alguns versos nas paredes e compor enquanto observo os outros amigos de Josy grafitarem. Mais ao sul existe um mirante onde é possível ver praticamente toda a cidade e eu costumo chamá-lo de "meu lugar", é para onde eu fujo quando preciso pensar, compor, sumir por um tempo... É o meu lugar favorito na cidade.

Josy estaciona o carro, nossos amigos já chegaram e acenam para nós quando saímos do carro. De longe vejo Matt largar sua lata de tinta e correr até nós.

-Finalmente! Achei que vocês não vinham hoje. - Matt abraçou Josy e depois passou o braço pelos ombros e nos levou até o seu mais novo desenho. - Quero que me digam a verdade: o que vocês acharam?

Matt era um excelente desenhista, dessa vez ele tinha pintado um par de olhos femininos, azuis refletindo o que parecia ser a nossa cidade. Esse trabalhado havia ocupado-o por semanas e já estava quase pronto, Matt queria inscrevê-lo em um concurso que ocorreria no mês seguinte, eu e Josy o incentivamos a participar, ele tem talento demais para ser visto apenas pelos frequentadores da arena – apelidada carinhosamente por nós por ter sido também utilizado como local para brigas de rua e disputas idiotas.

-É maravilhoso Matt! Parabéns! - abracei-o pela cintura enquanto Matt beijava o topo da minha cabeça.

-É lindo mas eu tenho a sensação de que já vi esses olhos antes. - Josy, andava de um lado para o outro analisando o desenho – Desisto, sou péssima de memória. Vamos pintar.

Josy correu até mim, pegando minha mochila e tirou os tubos de tinta. Seu último trabalho é um elefante indiano, todo colorido e enorme. Ela ficou viciada em filmes e na cultura indiana e, segundo ela, esse elefante representa o seu "eu interior".

-Não vai pintar hoje Ellie? - Matt perguntou me olhando puxar um antigo banco e sentava de frente para o trabalho deles.

-Hoje ela só consegue pensar no carinha da sala de música – Josy gritou enquanto caminhava de volta para o carro para buscar algo que ela esqueceu.

-"Carinha de sala de música"? Como assim Ellie? - Matt sentou do meu lado e pegou meu caderno de composições.

-Tem um cara lá na escola e ele é muito bom, tipo muito bom mesmo e...

-Ela não tem coragem de falar com ele. -Josy me interrompeu

-Não é verdade! - rebati, Matt me olhava sem entender nada enquanto Josy cruzava os braços e me encarrava com a sua melhor cara de "ata".

-É verdade sim! Você nem consegue chegar nele e falar que tá afim. - Josy voltou para seu grafite, mostrando o dedo quando joguei um tubo vazio de tinta em suas pernas.

-Você está afim dele? - Matt folheava meu caderno, meio distraído.

-NÃO! A Josy tá louca, eu só gosto das músicas dele. Só isso.

-Entendi! Você deveria falar com ele já que é só sobre música. Vocês podem se inscrever no show de talentos da escola, no final do ano.

-Sem show de talentos pra mim! Por favor! - ameacei ficar de joelhos e implorar, fazendo Matt rir antes de se levantar e voltar para o seu desenho.

Matt é um dos meus melhores amigos, eu o conheci pela Josy que virou amiga dele assim que chegou na cidade. Ele é um ano mais velho que nós duas mas está cursando o último ano também, em outra escola, estudávamos juntos desde que me mudei mas no nosso último ano, nossos pais resolveram que minha prima e eu tínhamos que trocar de escola diferente de Matt, já que seu pai, que trabalha com o pai de Josy no escritório de advocacia dele, que achou melhor não.

Coloquei meus fones com a melodia que gravei hoje antes da escola e continuei minha música.

One MississipiOnde histórias criam vida. Descubra agora