-Ellie, venha aqui conhecer as crianças. - Shawn me chamou para perto. Como não me mexi, ele veio até mim e começou a me empurrar em direção ao balcão. - Sorria pelo amor de Deus. - Shawn falou baixinho e me forcei a abrir meu melhor sorriso. - Digam oi para a tia Ellie Abigail, crianças.
-OI TIA ELLIE ABIGAIL!
-É só "Ellie", crianças. - os corrigi e dei um beliscão discretamente no braço de Shawn.
-Ela vai mostrar a biblioteca para vocês. Os dois andares... - Shawn me olhou, me desafiando enquanto esfregava o local que apertei.
-Posso falar com você um minutinho? - puxei ele pelo braço para longe do balcão – Eu não posso cuidar deles! Eles vão me devorar viva.
-Ué? Cade a Ellie invencível? Ela tem medo de crianças de 5 e 6 anos? Não acredito. - Shawn debochou de mim.
-Filho da mãe, eu ...
-Olhe o vocabulário! Você não quer que essas crianças saiam daqui com a sua boca suja, não é mesmo? - ele riu e voltou para as crianças. - O tour começa lá em cima. Vamos Ellie, mostre a eles as escadas.
Shawn me desafiou e agora não posso voltar atrás. Fui até o grupinho de crianças e perguntei para a professora que os acompanhava.
-Você vai vir também, certo? - eu estava torcendo para que ela dissesse que sim, pelo menos não teria que aturar essas pestes.
-Não Ellie, eles são todos seus. Apenas seus. - Shawn respondeu por ela enquanto se recostava na cadeira e cruzava os braços atrás da cabeça. Filho da mãe.
-Bom, as 17 h eu volto para pegá-los. Até mais. - a professora nos cumprimentou e saiu.
-Ellie é melhor você ir logo, um deles está se pendurando no corrimão. - Shawn apontou para um menino ruivo que estava tentando prender as pernas e ficar de cabeça para baixo. Mostrei o dedo para o Shawn e corri até o garotinho.
E que comecem os jogos!
A visita pelo andar de cima durou 30 minutos, teria sido mais rápido se eu não tivesse que parar a cada cinco minutos para tirar uma criança de perto da grade, tirar as que queriam escalar as estantes, colocar no lugar os livros que elas derrubavam "acidentalmente". Depois que falei tudo que sabia sobre o andar, descemos e eu comecei a seguir a minha lista de atividades:
1. Mostrar a biblioteca – tour completo;
2. Contar duas histórias;
3. Atividade artística (pintura)
4. Descanço.
Terminei de mostrar o andar debaixo, mostrei a sessão infantil e eles adoraram, aproveitei e pedi para que eles escolhessem um livro.... Não deu certo! Eles começaram a brigar, gritar, puxar os cabelos, chorar, eu entrei em desespero!
-Calma! Calma! - comecei a separar as brigas, os choros só aumentavam me deixando surda. -CHEGA! - gritei, assustando-os e fazendo as brigas pararem e eles me olharem perplexos. - Todo mundo sentado! Eu vou escolher os livros e não quero ouvir nenhum grito ou choro. - bati o pé e todos eles foram para a área reservada e sentaram quietinhos esperando o início da história.
Comecei a pelo conto de "João e Maria", parei algumas vezes para explicar conceitos e lições além de brigar com os mais bagunceiros e brigões. Demorei uns 15 minutos para terminar e peguei a segunda história "João e o pé de feijão". A parte favorita deles foi quando o gigante apareceu. Eles gritavam e comemoravam ao final de cada capítulo.
Eu já estava exausta, meu corpo pedia um banho relaxante e uma boa noite de sono. Coloquei os potes de tinta, canetinha e lápis de cor sob a mesa e peguei a pilha de folhas A4 e entreguei três para cada criança e pedi que eles desenhassem a sua parte favorita de cada história e o que eles mais gostaram da biblioteca.
Aproveitei que eles estavam quietos e sentei em uma mesa mais ao fundo com uma visão mais ampla da sala e das crianças. Até que eles não eram tão ruins, eram levados mas dava pra levar...
Aos poucos fui perdendo a batalha contra o sono, me arrumei na cadeira e dormi.
Acho que não foi uma boa ideia!
Shawn
Eu subestimei a Ellie! Ela conseguiu fazer com que as crianças ficassem quietas por mais de uma hora! UMA HORA! Pra quem queria matar cada uma, ela se virou muito bem.
Sai de trás do balcão da entrada e resolvi descobrir qual foi a mágica que Ellie usou. Chegando perto da sala, consegui ouvir risinhos infantis e barulhos de papéis sendo rasgados. Espiei pela fresta da porta e vi as crianças andando pela sala, sussurrando e passando lápis e canetas uma para as outras. Abri mais a porta e eles pararam, assustados no meio da sala. Ao fundo, um grupinho estava em torno de Ellie, cada um com uma cor de cantinha diferente, rabiscando seus braços. Um deles, com cantinha preta, estava preparado para riscar um bigode em Ellie.
Fiz sinal para que eles continuassem em silêncio e me seguissem para fora da sala. Expliquei a ideia que eu tive e pedi para que eles voltassem para a sala e fingissem que nada tinha acontecido.
Querida Ellie, a vingança é um prato que se come frio!!!
Em cinco minutos, corri até a quadra da escola e peguei a maior corda que encontrei. Voltei para a biblioteca e as crianças estavam todas quietinhas fingindo desenhar em suas folhas de papel. Os "seguranças" de Ellie estavam ao seu redor, atentos a qualquer sinal de que ela acordaria. Mostrei a corda para eles, entreguei uma ponta para um deles e começamos a amarrá-la. Depois do serviço finalizado, levei as crianças para fora da biblioteca e eles esperaram do lado de fora o ônibus encostar e a professora guiá-los para dentro. Acenei para meus cúmplices e voltei para a sala onde Ellie ainda dormia profundamente. Peguei uma das canetinhas que ficaram jogadas no chão e desenhei um coração em sua bochecha.
Me afastei e fui arrumar as coisas para fechar a biblioteca, já passou meu horário mas antes, peguei meu celular e tirei uma foto dela. Precisava de uma recordação desse dia. Aproveitei e mandei para o Brian:
"Me sinto vingado"
Guardei o celular e tranquei a porta. Ah doce Ellie. Vamos ver o que você acha de ficar trancada.
Shawn
Que merda de telefone!! Qual dessas crianças irritantes trouxe a porcaria do telefone? Eles não prestaram atenção quando eu disse que não devemos fazer barulho aqui? Abri os olhos devagar e aos poucos percebi que a vibração do telefone vinha do meu bolso. Mexi o braço para pegá-lo na mesa e...O QUE? POR QUE MEUS BRAÇOS ESTÃO AMARRADOS?
Olhei para baixo e vi que minhas pernas também estavam presas aos pés da cadeira. Eu vou matar quem fez isso!!!!! Pode apostar. Comecei a balançar os braços e percebi que as cordas foram diminuindo a pressão e soltando. Aos poucos consegui me soltar e peguei meu telefone na mesa.
"15 chamadas perdidas: Josephine Vadia"
Puta merda!!! Eu devo estar muito atrasada. Soltei minhas pernas e corri para fora da sala e encontrei a biblioteca toda apagada. Eu não acredito que ele fez isso! Shawn teve a coragem e a ousadia de me amarar e me deixar trancada aqui! Ele vai me pagar com a vida!!! Peguei minha mochila na sala e corri para a saída.
Vi uma luz do lado de fora, parecia uma lanterna, corri e bati no vidro da porta chamando atenção do vigia noturno.
-MOÇO! OH, MOÇO! Me ajuda.... - bati freneticamente no vidro.
-QUEM ESTÁ AI? - o vigia gritou e apontou a lanterna para o meu rosto, me fazendo fechar os olhos.
-Eu sou aluna e me deixaram trancada aqui. - ele procurou, no enorme molho de chaves, a da biblioteca.
-Como assim, moça? - finalmente, ele achou a chave e abriu a porta.
-Foi uma brincadeira e eu acabei perdendo a hora aqui. Muito obrigada. - sai correndo, deixando-o completamente confuso e sem entender nada. Cheguei no estacionamento, torcendo para que meu carro, ou melhor o do meu pai, ainda estivesse ali. Aproveitei para retornar as chamadas da Josy.
-SUA FILHA DA PUTA! CADE A MINHA IRMÃ?
-O Shawn me deixou trancada na biblioteca. EU TO MUITO PUTA!!!! - liguei o carro e sai da escola.
-O QUE? Me conta tudo. Eu devia ter chutado as bolas deles, na boa. - Josy começou a xingá-lo do outro lado da linha.
-Vou buscar a Chloe e daqui a pouco te conto tudo.
-Ok! Vou mandar uma mensagem pra ela avisando. Estou te esperando. - Josephine se despediu e desligou o telefone.
Acelerei o carro e peguei a rua principal em direção ao endereço que recebi por mensagem. Em menos de 10 minutos eu estava estacionando na porta da amiga da minha prima. Estava saindo do carro quando me dei conta dos meus braços rabiscados. Crianças infelizes!!! Peguei um casaco no banco de trás, passei as mãos em meu cabelo e sai do carro. Toquei a campainha e esperei, ouvi um "Já vai" masculino vindo lá de dentro.
Olhei para a rua, as casas eram muito bonitas, com jardins e árvores pelas ruas. Eu gostaria de morar aqui.
-Posso ajudar? - fui recebida por uma voz masculina. Me virei e encontrei um rosto familiar.
-Brian?
-Ellie? - Brian quando me reconheceu soltou uma enorme gargalhada.
-Do que você está rindo, mané? - nós dois olhamos para dentro da casa, Brian deu um passo para trás, abrindo mais a porta. Ele agora estava encostado na parede ao lado, chorando de rir.
-O que você está fazendo aqui? - meu sangue fervia de ódio. Eu queria enforcá-lo
-Eu moro aqui!!!
Eu dei um passo para dentro pronta para pular no pescoço dele.
-Shawn, quem é? E por que o Brian está rindo tanto? - quatro cabecinhas apareceram no corredor e nos olhavam sem entender a tensão enorme entre Shawn e eu. - Quem é você? - uma mulher loira, deu um passo parando na minha frente, me obrigando a quebrar o contato visual com o ele.
-É a minha prima Ellie, Tia Karen. - Chloe respondeu no meio do corredor. Foi quando olhei para as outras pessoas na sala: minha prima, sua amiga e o um homem que provavelmente era o pai do Shawn.
-Olá, muito prazer. Sou a Ellie. - estendi a mão para ela que apertou e abriu um enorme sorriso.
-Ela também é da turma do Shawn. - Brian comentou enquanto tentava recuperar o fôlego.
-Que mundo pequeno!! Seja bem-vinda! - Karen me abraçou.
-Obrigada. Eu vim buscar a Chloe. - olhei para minha prima que já tinha sumido com a amiguinha. Shawn ainda estava congelado no meio do corredor, me olhando preocupado.
-Este é meu marido, Manuel. - Karen fez sinal para que ele se aproximasse. Apertei sua mão também. - Eu convidei Chloe para o jantar, fique também Ellie.
-Obrigada mas...- ela me interrompeu
-Shawn, diga para sua amiga ficar! - ele coçou a cabeça, meio sem graça.
-Fica Ellie. Essa noite será memorável! - Brian passou o braço pelos meus ombros, fechou a porta atrás de mim e me puxou até a sala de jantar. Karen foi na frente com seu marido, sendo seguida por um Shawn nervoso.
-Ellie, você é nova na escola? - Manuel me perguntou antes de sentar na cabeceira da mesa.
-Sou sim. Meus pais acharam melhor que meu último ano fosse em uma outra escola, mais preparada.
-Você faz trabalho voluntário em hospitais? - Aaliyah, sentada ao lado de esquerdo de seu pai—Ou trabalha com crianças?
-Não. Porque? - olhei para Chloe, sentada entre sua amiga e eu.
-Tem um coração desenhado na sua bochecha. - minha prima encostou o dedo no meu rosto indicando onde estava o desenho.
-Parece o coração feio que o Shawn desenha. - Aaliyah comentou
-Parece mesmo. - Brian concordou rindo baixinho depois de olhar para o amigo que abaixava a cabeça para esconder o riso. Não me contive e chutei a canela do Shawn por debaixo da mesa fazendo-o ganhar um susto e se endireitar na mesa com uma careta de dor.
-Hoje tivemos a visita de algumas crianças na biblioteca. Eles só se parecem com anjos. - comentei
-Você trabalha na biblioteca? - Karen
-Na verdade é uma detenção. - respondi meio sem graça.
-Aah, você é a menina responsável por fazer o Shawn pegar duas semanas de detenção? Ele falou sobre você mas, pelo visto, estava errado.
-Shawn falou sobre mim? Que bom. O que ele disse? - apoiei as mãos embaixo do queixo e olhei para ele, sentado ao lado de sua mãe, vendo engolir em seco.
-Ah, ele disse que a menina que estava na detenção era muito rude, meio rebelde e insuportável, que não leva desaforos para casa, mas você é o oposto disso tudo! Você é tão doce Ellie.
Doce Karen, seu filho não voltará para casa amanhã.
-Que absurdo Shawn! Eu confesso que tenho uma personalidade muito forte mas também não sou assim. - comentei fazendo-o me olhar sem entender nada. Chutei sua perna novamente mas dessa vez não fui tão discreta. Brian notou e segurou uma gargalhada.
O jantar ocorreu sem nenhum problema (dei mais dois chutes no Shawn, mas ele vai sobreviver). Me ofereci para ajudar com a louça enquanto Chloe arrumava suas coisas e Karen aceitou.
-Caramba Ellie! Sua blusa está com uma mancha enorme de tinta. - Karen apontou para uma mancha azul na minha camiseta amarela.
-Faz e acontece mas não consegue lidar com crianças de cinco anos. - Shawn tinha acabado de entrar na cozinha e pegou um copo que eu tinha terminado de secar.
-Filho, empresta uma camisa sua para Ellie enquanto eu tiro a mancha dela.- Karen
-Que? - respondemos em coro.
-Que bonitinho, vocês respondendo juntos! Anda logo Shawn, leva ela no seu quarto e empresta uma camisa ou um moletom.
-Por mim ela pode ficar só de sutiã. - Brian apareceu na porta da cozinha.
-Você não toma jeito, não é Brian? - Karen virou de costas para mim para olhar para o Brian encostado no batente da porta. Aproveitei e levantei o dedo do meio para ele.
-Não precisa Karen! Posso tirar quando chegar em casa. - segurei a mão dela em forma de agradecimento—Não precisa se incomodar.
-Não é incômodo algum! Agora vão mas não demorem. O banheiro é no final do corredor. -Obrigada. - agradeci e subi as escadas atrás do Shawn, que parou em frente a segunda porta da esquerda.
-Não vou dizer bem-vinda ao meu quarto porque seria mentira. - Shawn encostou a porta assim que eu passei.
-Pode falar: é a primeira vez que uma garota, além da sua irmã, pisa nesse quarto não é? - andei até sua escrivaninha repleta de folhas de papel rabiscadas e amassadas. Temos alguém com dificuldade em compor nesta semana... Uma revista em quadrinhos presa embaixo do laptop chamou minha atenção: homem-aranha. - HQ de heróis, Shawn? Não sabia que você fazia a linha geek, se bem que faz sentido: introvertido, sempre com o fiel escudeiro, leitor voraz de HQ's... O verdadeiro estereótipo do virg...- quando virei para ver sua cara enquanto o zoava, não percebi o quanto perto ele estava: nossos corpos estavam quase colados, eu estava praticamente sentada sob a bancada
-Primeiro—Shawn me mostrou um dedo— Você não é a primeira garota a pisar aqui. Segundo— mais um dedo— Eu não sou virgem. E terceiro—ele mostrou mais um— O homem-aranha é foda, ok. - concordei com a cabeça, esperando que ele se afastasse mas não o fez. Shawn aproximou seu rosto do meu lado, sua respiração batia no meu rosto, eu sabia que deveria me afastar mas o máximo que eu consegui foi enrolar meus dedos no cabelo próximo a sua nuca.
-Sem querer ser "empata foda" mas a Chloe tá te chamando, Ellie. - Brian bateu à porta fazendo com que nos afastássemos rapidamente. Ambos respiravam com dificuldade.
-Toma, veste isso. - Shawn jogou uma camiseta preta pra mim. - Estou te esperando do lado de fora.
-OK. - respondi vendo-o abrir a porta.- Shawn! - chamei fazendo-o olhar para trás, peguei a primeira coisa que vi na escrivaninha: um peso de papel no formato de uma bola de futebol americano, e joguei na sua cabeça. Mas ele foi mais rápido e desviou, fazendo o peso acertar a portar e rolar pelo chão
-Porra!!
-É melhor você dormir de olhos abertos porque eu vou me vingar pelo que você fez hoje. - empurrei-o para fora e tranquei a porta. Troquei de blusa e sai, encontrando um Shawn meio descabelado e andando de um lado para o outro no meio do corredor.
-Me desculpa! Por... Tudo!
-Tá com medinho, é? Você aprontou, agora aguenta. - entreguei minha camisa manchada e desci as escadas. - Muito obrigada pelo jantar Karen e Manuel. Vocês são incríveis.
-Que isso! Não há de que. Amanhã o Shawn te entrega a camiseta limpinha.
-Digo o mesmo. Obrigada, vamos Chloe? Sua irmã deve estar querendo me matar. - peguei a chave do carro na bolsa enquanto Karen e Shawn nos acompanhavam até a porta. - Até amanhã companheiro de detenção. - a pisquei um olho para ele e entrei no carro, rumo a casa de Josephine. Chegou a hora do interrogatório.
Quinta feira – 4° dia de detenção
Fui recebida pelos gritos quase histéricos da Senhora Bernnet, ela estava a um passo de ter um infarto mas, antes de passar mal, ela me mandou arrumar e limpar toda a bagunça que eu deixei ontem. Shawn ainda não havia chegado (o que é estranho já que ele é sempre muito pontual) e assim que pisasse aqui seria bombardeado pelas perguntas e puxões de orelha da vovó.
Comecei a limpar as manchas de tintas das mesas, recolhi os papéis usados jogando-os no saco de lixo, deixados especialmente para mim (palavras da senhora Bernnet). Pouco depois escuto Shawn se desculpando pela bagunça.
-Sinto muito! As coisas ficaram loucas ontem. As crianças deram um baita trabalho mas eu garanto que até o final do dia, estará tudo limpo. - segundos depois escuto a porta se abrir e Shawn se jogar contra ela, apoiando-se nela e revirando os olhos.
-De saco cheio da vovó, Mendes? Que péssimo neto você é. - comentei enquanto pegava os lápis espalhados pelo chão.
-Eu não aguento mais esse castigo! Vou falar com o diretor, já paguei todos os meus pecados aqui. - ele abaixou para me ajudar.
-Nem pense em me abandonar, Mendes! - apontei um lápis partido para ele com a minha melhor cara ameaçadora fazendo-o rir.
-Vamos arrumar logo. Quero ir embora mais cedo, tem uma tempestade chegando.
-Você quer matar a detenção? Bateu com a cabeça? - comentei vendo - o revirar os olhos
-Eu tenho um compromisso hoje. - Shawn respondeu e se levantou para jogar os lápis no lixo.
-Sinto cheiro de mulher.
-Valeu Sherlock! Vamos limpar essas tintas. - ele me jogou um pano úmido e folhas de papel.
Ele ajoelhou do meu lado e começando a limpar as manchas da cadeira e do chão.
-Shawn olha pra mim, rápido. - puxei ele pelo braço fazendo-o me olhar assustado. Apertei a ponta de seu nariz, com meus dedos sujos de tinta vermelha, e comecei a rir.
-O que você fez Ellie? - ele pegou o telefone no bolso e olhou para a tela, vendo seu reflexo com a mancha de tinta. - É sério? Quantos anos você tem?
-Olha quem fala! Quem foi que desenhou, ou melhor tentou, um coração no meu rosto? Você tem noção do trabalho que deu pra tirar aquilo? - joguei a bolinha de papel que ameacei e joguei nele.
-Essa é a sua vingança? Esperava mais de você, Abigail.- Shawn cruzou os braços, recostando na parede.
-É óbvio que não. Eu só entro pra ganhar meu querido. O que é seu está guardado.
-Nossa, que medo! - ele debochou de mim
-Deveria mesmo! - joguei um pincel em sua direção.
Terminamos de limpar e fomos falar com a senhora Bernnet, que nos passou a tarefa de organizar os novos exemplares das enciclopédias.
-Ela podia mandar a gente para um lugar com menos poeira. Ninguém olha essas enciclopédias—reclamei
-Pelo menos ela não nos mandou limpar a escada e tirar chiclete debaixo das cadeiras. - Shawn deu de ombros.
Ficamos umas 2 horas organizando e limpando tudo até que a senhora Bernnet aviso que estava indo embora. Shawn a acompanhou até a porta e voltou minutos depois com uma cara apavorada.
-Você tem um bote salva vidas? Tá caindo o céu lá fora.
-Porra! Logo hoje que eu não vim de carro. Odeio pegar chuva de moto. - reclamei
-Você tem uma moto? - Shawn sentou sob uma das mesas atrás de mim
-Tenho, Mendes. Me passa aquelas ali. - apontei para uma pilha ainda dentro do carrinho.
-Ontem você estava de moto? Minha mãe nunca ia deixar você levar sua prima, se soubesse disso. - ele riu enquanto me passava os livros.
-Não, peguei o carro dos meus pais. Chloe detesta minha moto.
-Você deve ser uma péssima motorista. - Shawn comentou baixinho e ganhou um beliscão. - Eu sou ótima, ok? Um dia vou te levar pra dar uma volta.
-Nem morto! - o celular dele apitou, Shawn o pegou e sorriu.
-Mensagem do contatinho. Hum... - comentei e acabei recebendo um dedo do meio. Fiz a minha melhor cara de ofendida e sai de perto dele rindo.
Deixei o Shawn terminar de arrumar as enciclopédias e fui buscar um refrigerante em uma máquina próxima a biblioteca.
-Merda de máquina!! - comecei a dar chutes na tentativa de destravá-la e conseguir meu refrigerante ou, pelo menos, meu dinheiro.
-Achei que você tivesse ido embora. - olhei para o corredor atrás de mim, Shawn vinha em minha direção.
-Essa porcaria de máquina engoliu meu dinheiro e não quer me dar o refrigerante. Idiota.- dei outro chute mas dessa vez machucou meu pé. - MERDA! - reclamei, Shawn correu até mim e me ajudou a me apoiar na parede ao lado.
-Assim ela não vai funcionar!
-Então como é? Pedindo "por favor"? Sinto informar mas máquinas não escutam. - retruquei enquanto mexia meu pé na tentativa de parar a dor.
-É assim, ó! - Shawn deu um "soco" no centro da máquina e em segundos ouvimos o barulho da garrafa descendo e caindo na bandeja. - Viu? Toma aqui o seu refrigerante, esquentadinha. - me passou a garrafa e comecei a abrir o lacre
-Esquentadinha é o.... - o líquido explodiu na minha mão, voou refrigerante para todo os lados. Eu fiquei ensopada!
-Acho que já resfriou. - Shawn, encostado na parede mais distante e completamente seco, ria descontroladamente da minha desgraça.
-Babaca! - segurei a barra da minha camiseta, dava pra torcer de tão molhada que estava. - Não posso ir embora assim. Argh!! - chutei a máquina mais uma vez.
-Vamos voltar, eu tenho um moletom na mochila.- Shawn pegou a garrafa do chão e jogou no lixo. - Vai indo enquanto chamo alguém pra limpar isso aqui. - ele virou a esquerda e eu voltei para a biblioteca. A minha sorte é que ela estava vazia. Senhor Bernnett já devia ter ido embora por causa da tempestade.
Fui para o fundo da biblioteca, procurando um local longe do ar-condicionado, eu estava quase congelada quando Shawn entrou, com a cabeça baixa mandando mensagens no celular, chamei seu nome fazendo-o olhar para o fundo. Caminhei até o centro e me apoiei na mesa atrás de mim.
-Eu tô congelando aqui!!! Cadê aquele moletom que você me prometeu?
-Acho que gosto mais de você assim, quietinha, sem cara de emburrada e sem querer me bater. - ele riu
-Eu tô com frio mas ainda posso te bater. - ameacei ir para cima dele, Shawn fingiu se encolher de medo e foi até a nossa sala buscar.
-Aqui. - ele me passou o moletom preto com capuz.
-Muito obrigada! - peguei e fui até o banheiro dos funcionários que ficava escondido nos fundos da biblioteca. Tirei minha blusa molhada e guardei em um saco plástico. Voltei e encontrei o Shawn olhando pelo vidro da porta.
-Tá ventando muito? - perguntei fazendo-o olhar para mim.
-Acho que a escola vai precisar de um telhado novo. - Shawn me olhou dos pés à cabeça.
-Que foi? - perguntei
– Só tô pensando que se continuamos assim você vai levar meu guarda-roupa inteiro. - caminhando até mim, Shawn arrumou o cordão de regulagem do capuz. Estávamos muito próximos, seu polegar, no meu queixo, fazia um carinho suave. Senti sua respiração mais próxima, batendo em meu rosto, fechei os olhos esperando o...Bow!
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One Mississipi
FanfictionMais um dia e eu estou aqui parada, olhando-o tocar um dos melhores solos de guitarra que já ouvi. O jeito que ele toca, tão intenso e imerso no seu mundinho me encanta. A sua voz então... Queria ter coragem de me aproximar e elogiar seu trabalho ma...