Persuadir.

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Jungkook

Entro no SUV compacto da minha mãe, e vou pra casa de Kim Taehyung pela estrada que corre paralela à principal via que corta a cidade. Piso no acelerador e o velocímetro sobe rápido, noventa, cem, cento e dez, cento e vinte, o ponteiro tremendo e o carro fazendo o melhor que pode pra ser um carro esportivo.

No dia 23 de março de 1950, o poeta italiano Cesare Pavese escreveu: O amor é o grande manifesto; a urgência de ser, de ter alguma importância e, se a morte vier, morrer com valentia, com clamor — em suma, permanecer na memória. Um tempo mais tarde, entrou no escritório de um jornal e escolheu a foto de seu obituário no arquivo. Deu entrada em um hotel e, dias depois, foi encontrado esticado na cama, morto. Ele estava completamente vestido, com exceção dos sapatos. Na mesa havia dezesseis caixas de remédio pra dormir vazias e um bilhete: A todos perdoo e a todos peço perdão. Tudo bem? Não façam muita fofoca, por favor.

Cesare Pavese não tem nada a ver com dirigir rápido em uma estrada de Busan, mas entendo a urgência de ser e de ter alguma importância. Apesar de achar que tirar o sapato em um quarto de hotel e engolir um monte de remédio pra dormir não seja uma forma de morrer com valentia e com clamor, o que importa é a intenção.

Faço o carro alcançar os cento e trinta. Vou aliviar quando chegar nos cento e quarenta. Nem menos. Nem mais. É cento e quarenta ou nada.

Me inclino para a frente, como se fosse um foguete, como se eu fosse o carro. E começo a gritar, porque a cada segundo me sinto mais vivo. Sinto a adrenalina — mais do que isso sinto tudo á minha volta e dentro de mim, a estrada, meu sangue e meu coração batendo na garganta, e eu poderia acabar com tudo em um clamor valente de metal amassada e fogo explosivo. Piso fundo no acelerador e agora não posso parar porque estou mais rápido que tudo.
Então, no momento exato antes do meu coração ou o motor explodir, tiro o pé do acelerador e deslizo pra mim estrada segundaria, o carro me levando sozinho quando saímos do chão e aterrissamos com tudo, a alguns metros de distância, metade dentro e metade fora da vala, onde recupero o fôlego. Levanto as mãos e elas não tremem nem um pouco. Estão mais firmes do que nunca, olho em volta, pro céu estrelado e pro campo e pras casas escuras e adormecidas, e estou aqui... Estou aqui.

Taehyung mora a uma rua de Jisoo, em um casarão branco com chaminé vermelha em um bairro do outro lado da cidade. Quando chego ele está sentado na escada da frente, com um casaco gigante, parecendo pequeno e sozinho. Levanta rápido e me encontra na metade da calçada, então olha atrás de mim como se estivesse procurando alguém ou algumas coisa.

— Você não precisava vir até aqui.

Está sussurrando, como se a gente fosse acordar a vizinhança.

Sussurro de volta.

— A gente não mora em Los Angeles nem em Cincinnati. Levei, tipo, cinco minutos pra chegar. Bela casa, aliás.

— Olha, obrigada por vir, mas não preciso conversar. — O cabelo está envolto em uma bandana, e umas mechas estão caindo no rosto. — Eu estou bem.

— Nunca minta para um mentiroso. Sei reconhecer muito bem um pedido de ajuda, e acho que quase de um prédio com certeza se classifica como um. Seus pais estão em casa?

— Estão.

— Que pena. Quer dar uma volta? — Começo a andar.

— Não pra lá. — Ele puxa meu braço e me leva para o outro lado.

— Estamos evitando alguma coisa?

— Não. É só... hum... mais agradável pra cá.

Faço minha melhor imitação do Chula:

The froster brightness  [kth +jjk]Onde histórias criam vida. Descubra agora