Capítulo 12 - "E você sente falta daqui?".

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Ah, mas que sensação era boa aquela.

Essa tal felicidade parecia ser um verdadeiro milagre.

Edna saiu do consultório e decidiu aproveitar e dar mais um de seus passeios pela cidade. Ela foi fazer algo que sempre teve vontade, foi dar uma volta no metrô de São Paulo. Ela entrou na estação Paulista do metrô, na linha verde, Edna achava os vivos criativos, usar cores para identificar as linhas das estações! "Ah, que coisa mais legal!" pensou enquanto pulava pela catraca, os vivos não faziam aquilo, eles usavam um negócio de plástico para liberar a entrada. Não era atoa que os vivos são o que são. Ela desceu pela escada rolante, para ela a diversão começava ali, pois que coisa fantástica era isso, as pessoas não precisavam andar, simplesmente deixavam que a máquina fizesse o trabalho duro.

Morthy desceu e foi seguindo as pessoas, ali já havia uma plataforma onde aguardavam o trem, mas Edna sabia que mais adiante havia outra máquina rolante, mas dessa vez era uma esteira, uma esteira rolante! "Eles não precisam descer escadas e também não precisam andar pequenas distâncias, esses vivos são fenomenais", pensou enquanto ia apressada passando no meio das pessoas. Era bom não poder ser vista pelos outros, assim ela não passava vergonha, Edna gostava disso, mas tinha seus momentos de solidão. Momentos em que desejava ser vista, ser ouvida e de sentir o toque quente em sua pele pálida e fria, mas aquilo só era possível em casos específicos, casos em que o cliente já esteja entre os dois mundos, o vivo e o morto. Entretanto, nesses momentos Edna simplesmente não tinha nada de interessante para dizer... Faltava-lhe assunto.

Enfim, lá estava ela, Edna Morthy, a dama de preto parada no meio na esteira rolante. Houve um momento em que ela não conseguiu se conter, saiu da esteira que vinha e tentou andar sobre ela no sentido contrário, mas parecia que ela permanecia parada – que coisa mais louca! Edna gargalhou daquilo, gargalhou tanto que perdeu o fôlego, ela se recompôs, ficou parada e tentou imitar os vivos, mas parecia ser tão sem graça ser vivo, Edna achava que eles não aproveitavam a vida. Podiam se divertir ali, no meio do metrô, mas não o faziam, seguiam seu caminho com pressa e sem nenhum sorriso no rosto – "esses vivos não aprendem mesmo!", pensou.

Ela viu um rosto familiar, um rosto familiar no meio daquela multidão, era outra morte, o novato, o tal do Felipe Mortie. Edna decidiu segui-lo, seria bom conversar um pouco com alguém além do doutor, assim ela perguntaria como estavam as coisas, se estavam sentindo sua falta na organização. "Ótima ideia", pensou se apressando para acompanhar Felipe, mas ele ia mais rápido do que ela, logo estavam na plataforma da linha amarela. O metrô logo chegou, Edna entrou num vagão depois dele, mas por sorte ela conseguia andar de uma ponta a outra da locomotiva – aquilo era uma maravilha da tecnologia. Edna Morthy estava prestes a falar com Felipe, mas interrompeu seus passos, pois Felipe Mortie estava ali a serviço, a serviço da morte...

Seu cliente parecia ser um homem, devia estar na casa dos cinquenta anos, o cabelo era quase todo grisalho, era do tipo gordinho, estava bem acima do peso, pelo o que Edna pôde distinguir, essa seria a razão, o motivo de sua morte. Felipe parou diante do homem que estava de pé, próximo da porta do vagão, apontou o dedo indicador sobre o peito de seu cliente, quase que imediatamente ele sentiu uma dor em seu peito, era o coração que depois de tantos anos não conseguira resistir a mais um dia.

— Pois é, seu Antônio, quem mandou comer tanto fast food? — Disse Felipe num tom de deboche, ele não esperava que alguém conseguisse lhe ouvir, então disse tudo aquilo que tinha vontade. Mas Edna estava escondida no meio de uma rodinha de vivos, só observando Felipe Mortie fazer seu serviço ao longe. — Sua hora chegou, seu Antônio! Hahahaha! Quem mandou comer todas aquelas batatinhas fritas, ou tomar todos aqueles refrigerantes? — Felipe dizia enquanto o cliente, seu Antônio, caia no chão do vagão e se contorcia de dor.

A Morthy no Divã.Onde histórias criam vida. Descubra agora