Prólogo

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Taehyung passou os olhos ao redor do ambiente, tentando focalizar qualquer coisa. A cena não só parecia em câmera lenta para ele, mas borrada e amarelada. Yoongi se encaminhava ao seu quarto com um pedaço do que parecia um pão francês pendurado na boca, e sua mãe se agarrava com seu novo namorado no sofá, numa distância consideravelmente pequena dele.

Olhou para baixo, tentando se localizar. A mente lerda processou fixamente a imagem do carpete velho e verde oliva abaixo de seu corpo, e percebeu que estava sentado no chão de pernas de índio. Na mesinha de centro adornada com uma carteira, diversas chaves e fileiras de cocaína, havia um indicador de que ele deveria consumir aquilo, um enroladinho de papel. Bem perto de seus dedos.

Ele não tinha noção de que já havia usado. Não tinha noção de absolutamente nada.

Apagou, mas só soube disso quando acordou no outro dia no mesmo lugar, e não havia mais nada na mesinha, nem ninguém ao seu redor.






Yoongi coletou o dinheiro das duas noites no clube dentro da única meia colorida (e amarela) na gaveta de meias, com a intenção comprar o bolo de aniversário de seu irmão mais velho. Taehyung faria vinte e cinco anos, enquanto ele tinha acabado de fazer vinte e três. Todas as noites fazia o strip tease, e o dinheiro era o que sustentava a casa, já que sua mãe não trabalhava e Tae tinha um vício para alimentar.

Para Yoongi, a discussão de que era injusto criá-los sozinho com o seu esforço já estava finalizada, porque já havia se acostumado a fazer aquilo e, apesar de se sentir sobrecarregado, ver Tae feliz era o mais importante. A mãe deles, por outro lado, que nem era mãe deles, Yoon simplesmente ignorava. Com o tempo, seu cansaço não importava mais, nem mesmo para ele.

Também tinha um vício a alimentar, e pouco a pouco ele exigia mais do moreno. Não se comparava com o uso descontrolado de sua mãe e irmão, ele ainda sabia onde estava se metendo.

Naquela noite, quando saiu para comprar o bolo para esperar Taehyung chegar da academia, não fazia ideia de que mais uma vez o pai biológico bateria em sua porta para tentar, sem sucesso, conversar e entender se estavam bem.

- Eu não suporto olhar para você. - Hiza disse calmamente, mexendo no celular escorado na porta da casa. Não via os filhos fazia dezoito anos, e naquele dia em particular insistiu em esperá-los. Sempre marcava horário com Kia, e entre coincidências como ter que desmarcar, não encontrar os filhos em casa, ser desencorajado pela ex-mulher e descobrir que eles se mudaram para outro estado outra vez, passaram-se todos esses anos.

- Você tem que sair daqui. - Ela repetiu três vezes, claramente afobada por algum motivo que Hiza não conseguia entender, fora que estava chapada.

- Eu procurei por vocês por dois meses seguidos, eu tive consideração em não envolver a polícia mais uma vez, e agora não vou voltar porque você decidiu que devo.

- Saia! -Ela gritou. Tae irrompeu pela porta ofegante, rindo sozinho e segurando uma lata de cerveja, e quando viu os dois, o riso sumiu. A porta bateu atrás dele, a roupa de academia estava toda molhada de suor, e a lata parecia bem torta em sua mão, prestes a derramar o líquido.

- O que ele faz aqui? - Taehyung bufou, jogando a lata no chão com raiva. O fato de molhar o carpete não pareceu incomodar nenhum dos dois como incomodou Hiza, porque eles sabiam que Yoongi limparia depois. Como ele limparia não era exatamente importante.

Hiza parecia perplexo, e Kia prestes a ter um colapso.

- Filho... - Ele murmurou emocionado. Os olhos marejados.

- Eu não sou seu filho. - Ele esbravejou tomado pelas drogas que esteve usando, depois gritou: - Você não é meu pai! - Sabia que, no fundo, ele sempre esteve disposto a ver o pai. Mas não podia ser tão fácil assim. Não depois de tantos anos o esperando.

Kia assentiu diversas vezes concordando, parecendo lunática para Hiza, e ele negou com a cabeça, ainda emocionado por ver seu menino crescido e vivendo miseravelmente. No fundo, Hiza sabia que estava se enganando todos esses anos. Sabia que encontraria algo deplorável. Só negou a vida toda e se esquivou dos próprios filhos.

O silêncio foi preenchido pelo barulho da porta abrindo, e Yoongi entrou na casa bem calmamente, segurando numa mão uma sacola com refrigerante e na outra um bolo de chocolate. Não havia sorriso em seu rosto quando entrou, nem um ar de felicidade, mas sim um de exaustão. Ao ver seu pai, entretanto, o rapaz petrificou. Um monte de emoções transbordaram em seus olhos, mas ele engoliu todas elas. De repente ele era o Yoongi insensível de sempre.

Ali estava o homem que viveu se escondendo de seus filhos. Seu pai.

Sick love ◈ myg+pjm {slow updates}Onde histórias criam vida. Descubra agora