04

502 34 3
                                    

– DEMI?! – A voz dela soou cheia de pânico.

– Estou bem aqui. – Demi permaneceu de pé, sem enxergar nada na escuridão. Ela bateu as canelas no baú. Deixou a taça de lado com cuidado.

Que bom que fez isso, porque Selena agarrou o braço dela, assustando-a, o tremor incomum na voz de Selena refletindo nos dedos. 

– Desculpe. Não me dou muito bem com o escuro. 

Movimentando-se devagar, Demi foi tateando pela mobília até chegar ao lado dela. Nunca experimentara uma escuridão tão absoluta. Ela  não conseguia vê-la, mas sentia o calor de seu corpo, seu perfume, a energia dela pulsando através da mão em seu braço, ouvia o leve ofegar de pânico de Selena. 

– Não se dá muito bem?

 – É, eu não gosto nada dele. – A risada de Selena beirou o patético e tocou o coração de Demi. Como se tudo o que ela fazia já não fosse capaz de tocá-la. – A curiosidade me dominou, e eu consegui me trancar em um armário durante algumas horas quando tinha 4 anos. Fiquei desesperada. Desde então, a escuridão me apavora.

Selena riu outra vez, e se Demi não estivesse tão sintonizada às nuanças da voz dela, poderia não ter percebido o nervosismo ainda à espreita.

Indo contra todo seu bom senso – pois tocá-la, conforme ela descobrira minutos antes, definitivamente era insensato –, Demi segurou a mão de Selena.

– Está tudo bem. Estou aqui. Seu prédio fica sem energia com muita frequência?

– Já aconteceu duas vezes. Mas sempre durante o dia. – A voz dela soou mais segura, menos amedrontada, e a mão ficou mais firme. Tentou se soltar de Demi. – Estou bem agora.

Sua ligeira falta de ar a entregou. Selena não estava bem, mas fazia seu melhor para causar essa impressão. Demi lutava contra a ânsia de puxá-la para si, abraçar sua vulnerabilidade delicada e assegurar que estava tudo em ordem. Em vez disso, ela se contentou em apertar mais os dedos de Selena.

– Bem, eu não. Estou cega feito um morcego aqui. Onde guarda sua lanterna? – Ela quis saber.

Selena se voltou para ela, e seu rosto corou de encontro ao ombro de Demi, fazendo o coração dela acelerar. Era uma agonia estar tão perto dela, tocá-la, sentir o cheiro de Selena.

– Não tenho uma. Quebrou quando me mudei, e eu vivo me esquecendo de substituí-la. – A respiração de Selena era leve de encontro ao pescoço dela, e o cabelo brincava ao longo da mandíbula. 

– Tudo bem. Sem lanterna. Vamos ao plano B. Onde há uma janela? 

Os dedos de Selena se fecharam sobre os dela. 

– No meu quarto. Há uma no banheiro, mas é pequena. 

– Tudo bem. Guie-me até seu quarto. – Apesar da escuridão, ela fechou os olhos quando falou. Sob outras circunstâncias…

– Por aqui. – Selena a puxou pela mão. Em segundos ela trombou na parede. 

– Ai! Droga! 

– Desculpe, Femi… – Ela deu de ombros. – Presumo que você não tenha batido contra a parede. 

– Não. Estou no vão da porta.

 Brilhante. Selena ria dela. Na verdade, bater na parede foi um tanto engraçado, mas um golpe no ombro.

– Andar ao seu lado não vai funcionar. Irei atrás de você. – Ela pôs as mãos nos ombros expostos de Selena.

Na escuridão, Demi podia muito bem imaginá-la nua. Correção: era como se ela estivesse nua, do mesmo jeito que Demi a imaginara tantas vezes antes.

BlackoutOnde histórias criam vida. Descubra agora