Aquilo que nos une : Sentimentos

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- Flora? – Chamou pela segunda vez.

Abri os olhos inchados pelas lágrimas que entretanto, durante o sono, tinham secado. Ele disse-me que já havíamos chegado e em seguida, acompanhei-o. O ar quente associado a uma certa brisa marítima longínqua fez com que sorrisse de leve. O tempo ali estava mais agradável e até pude tirar o casaco mesmo antes de entrar no táxi. Este levou-nos para uma casa que ficava próxima a um areal. Assim que pus os meus pés naquela areia, perdi-me na paisagem.

- Gostas?

- É lindo. – Respondi.

Na minha adolescência, nos primeiros romances que havia lido, via paisagens como aquelas descritas nos livros e sonhava em poder desfrutar delas, tal como os protagonistas o faziam. Pensei que a primeira oportunidade seria naquela viagem de lua-de-mel que acabou coberta por lágrimas e por isso, algo que tentava esquecer.

Agora, perante uma paisagem semelhante, podia ver o poder do tempo. Em questão de meses, a minha vida sofrera uma reviravolta e agora sabia que podia realmente, aproveitar um cenário daqueles, ao lado da pessoa que amava. Sonhara tantas vezes com isso. Mesmo com as coisas mais simples, como sentar-me ao seu lado no areal.

- Fico contente que tenhas gostado. Vou pôr as malas lá dentro. Podes ficar aqui a apreciar as vistas. Volto já.

Assenti, caminhando na direção do mar. Retirei as sabrinas e com elas nas mãos, aproximei-me da água salgada. Molhei os meus pés, sorrindo diante da sensação.

Estranhamente, o meu coração parecia mais leve. Sorri mais uma vez. Entendi que essa sempre fora, desde do princípio, a intenção do Dinis. Fazer com que me sentisse daquela forma. Sem vontade de chorar, apenas sorrir mesmo que fosse um sorriso leve e simples. Era o começo, de quem sabe, a cura para a minha alma, para o meu coração que parecia menos dolorido naquele momento. Quem sabe, fosse apenas uma coisa que durasse uns instantes mas mesmo assim, era importante para mim. Queria sentir como era respirar sem sentir dificuldade para tal.

E além desse alívio, nesses dias, senti-me mais do que nunca, amada por ele. Os momentos ao seu lado eram tão perfeitos que temia que se tratasse de um sonho.

Após a primeira semana, fiz alguns comentários sobre termos que regressar apesar de não ser a minha vontade mas acabou por convencer-me que o melhor era ficar mais um pouco. Cedia perante as suas palavras, os seus gestos de carinho e aqueles dias transformaram-se em semanas em que mantive muito pouco contacto com outras pessoas, excepto aquelas com quem me cruzava na praia, no mercado ou quando cheguei a visitar o pequeno centro de saúde por questões de rotina do bebé.

Contudo, não podia alimentar aquele sonho eternamente. Havia coisas para fazer. Lugares, para onde voltar e pessoas que não podia simplesmente esquecer.

Assim sendo, perante um cenário paradisíaco, diante do mar, à noite e sentados na areia, observando as ondas beijarem a areia em silêncio, tomei a iniciativa de falar.

- Dinis, precisamos conversar sobre uma coisa.

- O que se passa? – Perguntou, estranhando o meu ar um pouco mais sério.

- Sei porque viemos para aqui. – Falei. – Compreendo porque o fizeste e agradeço-te muito por tudo mas está na hora de voltar.

- Flora…

- Por favor, Dinis. Não podes parar assim os teus estudos, nem eu quero deixar o Conservatório para trás. Além disso, não posso esquecer as pessoas e nem aquela que decidimos de chamar a nossa casa. – Toquei no seu rosto. – Eu vou ser forte, por mim, por ti, pelo nosso filho e porque na verdade, tenho mais motivos para ser feliz do que qualquer outra pessoa.

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