Quem é Keno ?

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    Entrei sorrateiramente na caverna e me escondi atrás de uma grande rocha, a luz que havia visto era produzida por uma enorme fogueira, suas chamas quase tocavam o teto, em frente à ela Keno estava de pé com as palmas das mãos viradas para cima como se estivesse recebendo algo. A caverna era ampla e repleta de rochas no chão, atrás da fogueira havia um túnel o que indicava que a caverna devia ser muito maior, não estávamos nem na metade da montanha, esta caverna talvez se estendesse até o topo.

   Voltei toda minha atenção à Keno ,ele parecia muito concentrado no que quer que estivesse fazendo, ele dizia algumas palavras mas era baixo de mais para que eu pudesse ouvir, seu rosto estava com uma expressão assustadora que só piorava com a luz da fogueira . Assim que terminou de pronunciar as palavras Keno ergueu as mãos para cima , repentinamente a fogueira começou a produzir fumaça em uma quantidade muito maior e esta envolveu o corpo de Keno completamente, no começo era possível ver seu corpo através de fumaça negra, mas logo ela se tornou tão espessa que eu não podia ver mais nada.

    Quando a fumaça desapareceu meu coração  acelerou de tal forma que eu mal podia respirar. Keno estava muito mais alto, agora eu alcançava apenas a altura de sua cintura, suas mãos enormes agora possuíam garras afiadas, ele usava uma espécie de toga preta que era presa apenas de um lado e cobria até os pés, em seu rosto havia uma cicatriz que ia da bochecha até o queixo fazendo uma falha em sua barba grossa, seus olhos não expressavam nenhum tipo de sentimento, suas íris antes, castanhas agora eram completamente pretas , mas o pior estava logo à cima, de sua testa saíam dois chifres grossos e levemente achatados que passavam pela lateral da cabeça e se curvavam para cima próximos as orelhas.

    Comecei a correr, em uma tentativa de fugir da tal criatura mas ela já havia me visto e com apenas 5 passos me alcançou, tentei correr mais mas tropecei em uma pedra na entrada da caverna e caí deitada de barriga para baixo, quando me virei para levantar a criatura já estava por cima de mim. Senti todos os meus membros tremerem, meu coração acelerar cada vez mais, o suor escorrendo pela testa enquanto aquilo aproximava o rosto do meu. Ele colocou a mão direita em meu pescoço e começou a apertá-lo, suas garras monstruosas arranhavam a pele de minha nuca, senti meu rosto esquentar e minha cabeça latejar, naquele momento tive a certeza de que morreria ali, estava quase perdendo os sentidos, aquela coisa me mataria e ninguém nunca ficaria sabendo, eu nunca devia ter subido aquela montanha, nem me envolvido com Keno mesmo que pouco, afinal, era por ele que eu estava ali, e agora ele me mataria.

    — Por que veio  aqui? — Sua voz também estava mais grossa, mas esta foi a ultima coisa que eu ouvi antes de desmaiar.

   Acordei deitada em  um colchão de palha no chão, sobre mim havia uma manta de lã crua, ao meu lado esquerdo estavam um copo de água e um pedaço de pão. Eu estava em uma espécie de quarto dentro da caverna, as paredes de pedra apresentavam riscos como se alguém marcasse o tempo que estivera ali o que me assustou um pouco, os tais riscos ia até o teto e se estendiam por todas as paredes. Alguém estivera preso ali por muitos anos, o que era mais estranho era que não haviam grades ou qualquer coisa que impedisse qualquer um de entrar ou sair daquela câmara. 

    Era muito escuro lá dentro pois era impossível que a luz do sol entrasse, só era possível enxergar pelas grandes velas espalhadas por todas as pedras da câmara, o que a tornava ainda mais assustadora, mas o pior de tudo era a abertura da câmara, não havia luz nenhuma vinda de fora, não dava p saber o que tinha lá.

   Virei-me de costas para a tal abertura e acabei chutando algo  sem querer, era algo macio e fez um som parecido com um miado, sentei-me no colchão para ver o que era, então percebi que o som não só parecia um miado mas de fato era um miado, ao lado dos meus pés estava um lindo gatinho, seu rosto possuía listras em tons de cinza , seu focinho e boca eram brancos om um nariz rosado, suas orelhas também eram cinzentas e seu pescoço, peito e ombros eram brancos com um único circulo marrom no ombro direito, suas costas eram marrons, seu rabo listrado como a testa e as canelas. O gatinho veio andando em direção ao meu colo me observando com seus grandes olhos azuis e vesgos, ele esfregou a cabeça na minha mão, deito-se em meu colo e começou a ronrona

    — Pelo menos não estou sozinha, não é? — Ele olhou fixamente para mim como se prestasse atenção em cada detalhe.

   Deitei novamente no colchão e só então percebi que havia algo em meu pescoço, levei a mão até ele e percebi que se tratava de uma faixa que cobria o lugar onde a criatura havia me arranhado, pensei em me levantar e ir embora mas então me veio a cabeça " E se ele ainda estiver lá? "  Eu jamais teria chance contra ele, se me visse fugindo talvez ficasse ainda mais irritado... mas por que ainda não me matara? Por que eu ainda estava viva?

   Logo depois Keno entrou na câmara, não a criatura enorme e assustadora mas o homem que eu conhecera na taverna. Ele se sentou ao meu lado, olhou para o gato deitado em meu colo e este saio correndo na mesma hora.

   — Como se sente? — Perguntou ele, eu não sabia o que dizer, o medo era tão grande que não conseguia pensar — Não tenha medo... eu não vou machuca-la de novo — Ele pois a mão em meu rosto — Me desculpe, eu... perdi o controle quando a vi aqui em cima... não esperava por isso...

   — O que é você?—  Perguntei sentando novamente,  Keno parecia realmente arrependido mas eu ainda não podia confiar nele.

   — Você se lembra das lendas?  As histórias que velho Jack contava na praça?    — Sim... ele dizia que o mal estava na montanha — Fiz uma pausa para me lembrar melhor, estava tão confusa que era difícil pensar — Ele dizia que existiam criaturas ruins aqui... que eram governadas por um demônio .... eu não me lembro do nome dele, acho que era...

   — Kenoriam. —Disse ele com a expressão séria.

   — É você...  — Agora tudo fazia sentido... era por isso que Keno era tão interessado em tudo que via na Vila, porque ele nunca havia estado em uma, porque ele vivia sozinho, também era por isso que  havia dito que gostaria de me levar ao lugar de onde veio, ele já planejava me levar ali... mas uma pergunta ainda não fora respondida : Por quê ele não havia me matado? — Por que não me matou então? Por que cuidou do ferimento que você mesmo fez?

        — Por que eu gostei de você — Ele passou a mão em meus cabelos — Você é diferente... Quando desci a montanha estava atrás de duas coisas: A primeira era diversão, bebida, mulheres, me sentir vivo... Como não havia nenhum bordel na vila fui até a taverna, bebi e encontrei você, achei que serviria apenas para me mostrar o lugar, conversar um pouco e talvez me divertir — Ele deu um sorriso malicioso — Mas , percebi que talvez se enquadrasse na segunda coisa que eu procurava.

    — E o que era? — Perguntei com medo da resposta.

   — Um aprendiz, confesso que antes de entrar na taverna vi seu irmão saindo, a princípio pensei que ele seria um bom aprendiz, então o parei na rua fingindo precisar de informação mas ele disse que estava com pressa para encontrar a namorada, e um homem apaixonado não me valia de muita coisa.

     — Mas e por que eu? O que tem em mim que não tem em outo?

     —  Vida. —  Ele olhou  fundo nos meus olhos — Você não era como os outros, seus sonhos não eram como da maioria dos meus aprendizes , todos queriam ouro, terras, poder ... mas você  tinha sede de aventura, não tinha medo do desconhecido, pelo contrário, você queria conhecer a montanha. — Ele respirou fundo e abriu um sorriso — Eu já estava querendo traze-la para cá mas ia esperar que que confiasse mais em mim... mas pelo visto não precisei. Me desculpe pelo machucado... eu não esperava ninguém aqui à aquela hora e me assustei....

    — Tudo bem... vai melhor logo — estava doendo muito e a minha vontade era de dar-lhe um bom tapa mas achei que não seria prudente bater num demônio . — Aceito suas desculpas...

   —Que bom  — Ele parecia realmente feliz com a resposta, como se eu tivesse a opção de negar alguma coisa à ele  — Então, amanhã começaremos os seus estudos, minha aprendiz.

              

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