22 de julho de 2016 - Irina Merkulova

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(Quinn)

"Como é que você consegue comer isso?" Provei um pouco da tal carne vegetariana feita com soja do prato de Rachel. "Tem gosto de papel com um pouco de sal, pimenta e orégano."

"Como você consegue comer isso?" Apontou para o meu filé ao ponto e fez cara de nojo. "É um pedaço de cadáver temperado com um pouco de sal, pimenta e orégano."

"Mas é um cadáver muito gostoso! Quer provar?" Cortei um pedaço da carne e ofereci. Rachel fechou a cara e voltou a se concentrar no prato do almoço dela.

Estávamos num pequeno restaurante próximo ao escritório na Bad Things na Madison. Era, em teoria, o último dia com a minha noiva em muito tempo que passaríamos separadas. Rachel embarcaria no sábado para Los Angeles para começar a gravar o filme parte rodado por lá, parte rodado no México. Seria dois meses, pelo menos, de gravações. No meu caso, na segunda-feira começaria a minha rotina de acordar cedo para pegar um trem até Nova Rochelle, onde ficavam os estúdios próprios da Bad Things e começar a preparar o trabalho para as gravações da série. Iria ajudar no trabalho de gripagem, testar equipamentos, fazer ajustes, participar das reuniões finais e definir os últimos detalhes de agenda. Tudo para, na semana seguinte, estar tudo certo para os atores chegarem e começarem a trabalhar, assim como o restante do pessoal de apoio e de produção. Os atores filmariam três vezes por semana apenas, teriam um dia extra de filmagem na semana apenas em caso de necessidade. Era suficiente para uma comédia de meia hora e, assim, eles teriam uma vida social e pessoal bem equilibrada. Nós trabalharíamos um pouco mais, com sempre.

Teoricamente, eu teria sempre as sextas-feiras de folga, uma vez que fui deslocada para a série e passaria a cumprir a carga horária dela e não mais a regular da agência. Significava que se eu tivesse de trabalhar das seis da manhã às duas da madrugada em plena segunda-feira, teria de cumprir a carga juntamente com todo o pessoal da produção e direção. Por isso que existe um dormitório coletivo lá dentro do estúdio em caso de alguém não ter hotel, trailer ou casa para ir. Eu não sei se encararia uma viagem de pouco mais de uma hora com trocas de estações depois da meia noite para estar de volta às sete da manhã. Não compensaria. Era melhor dormir no estúdio. Eu também não tinha carro, o que encurtaria a minha viagem em quase meia hora, muito menos condições de comprar um por enquanto.

Mas não era isso que dominava os meus pensamentos por hora.

Rachel e eu iríamos nos casar. Desta vez, espero eu, para valer. Eu não virei a namorada perfeita, mas tinha de admitir que cresci quando passei a morar com Santiago. Passei a dividir mais a casa em vez de querer ser chefe dela. Também penso muito mais em ter trabalhos que me façam feliz do que aqueles que possam prover salário. Ainda tinha minhas convicções e manias, mas se a intenção de Rachel era me ensinar algumas lições, além de me punir, missão cumprida.

"Estava pensando que um jantar surpresa seria uma boa ocasião para contar a novidade a nossas famílias." Divaguei. A gente não contou antes porque estávamos dando um tempo até o luto pela avó de Rachel terminar. Seria desagradável disparar a novidade dias depois do enterro. "Pode ser depois das suas filmagens. Talvez no início de outubro. O que acha?"

"É mais elegante e formal do que fazer por telefone."

"Ou disparar o anúncio em plena festa de casamento dos seus pais." Provoquei.

Rachel ficou vermelha. Ela se arrependia amargamente por ter feito aquilo: disparar entre amigos e estranhos um casamento de um noivado que sequer durou. Mas agora precisávamos pensar em algo maduro e sério.

"Então ficaremos oficialmente noivas num jantar. A gente pega a sua mãe para ir a casa dos meus pais em Columbus e anunciaremos. Essa parte não é difícil. O que faremos com o seu pai agora que você voltou a falar com ele?"

Saga Casamento (história 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora