Saga Casamento (história 2)

17 de novembro de 2016 - Nevasca

(Quinn)

"A única coisa que gosto desses alertas de temporais é a dispensa ao trabalho." Santiago disse enquanto arrumava a mochila. Kayla estava também no quarto esperando por ele. Os dois pegariam a estrada imediatamente para Long Island na casa de alguns amigos dela que ficava na parte alta da cidade.

Muita gente estava deixando a cidade por dois ou três dias. As escolas fecharam hoje. O metrô só ia funcionar até as quatro da tarde, e os ônibus circulariam até às dez da noite. A nevasca estava prevista para chegar no início da madrugada com rajadas de ventos de até 70 km/h. Os alertas na televisão diziam que o acúmulo médio seria de 10 a 18 cm, o que tinha tudo para ser um recorde, daí a preocupação porque um volume de neve desses de uma vez só a essa velocidade de vento costuma causar grandes estragos e até a matar.

Por causa da nevasca, só trabalhamos até terça-feira. Tudo bem que ficamos até a madrugada, mas dali a equipe de produção, elenco e filmagem foram dispensados pelo resto da semana. Na quarta, ficou o pessoal da infra para reforço de portas e janelas, além da proteção dos equipamentos. Mas eu ainda precisei trabalhar no escritório da Bad Things para fazer a reunião interna da equipe de produção da casa, sem interferências de gente da ABC de temporários ou do elenco. Era ocasiões assim que a gente usava para lavar roupa suja, acertar os pinos e montar estratégias para lidar com certos elementos, além de fechar mais ainda o nosso grupo da produtora.

O elenco sempre passava a imagem de total harmonia no set, mas não era assim. Apesar de o clima ser de profissionalismo, as discussões eram diárias. Por hora a ABC não fazia intervenções criativas, mas os atores já começavam a tentar palpitar na trama, o que era inadmissível. Foi por essas e outras que Gary mandou que os roteiristas saíssem de Nova Rochelle e passassem a trabalhar no escritório da Madison. Somente o editor de roteiros ficaria locado no set, até porque ele não tem autonomia para modificar storylines. O processo do roteiro da série era comprido. Havia a reunião dos roteiristas e produtores que definiam a linha da temporada. Criava-se uma pequena sinopse para cada episódio e alguns pontos que precisavam ser obrigatórios para a construção da temporada. Dalí, o roteirista trabalhava o episódio. Esse roteiro era aprovado pelo produtor ou produtores executivos com as devidas observações. Depois esse roteiro passava pela mão do editor, que fazia os ajustes. O editor também mexia em certos pontos para amarrar um episódio ao outro e promover a fluência narrativa.

De tempos em tempos os roteiristas e produtores voltavam a se reunir para promover os chamados "ajustes" motivados por ene razões. Às vezes um personagem torna-se popular e vale a pena dar a ele mais tempo de tela, às vezes a crítica aponta que um plot não funciona e seria estupidez continuar a insistir nele, às vezes o protagonista não funciona porque o ator não é bom suficiente e é preciso desviar o foco, às vezes um ator começa a dar problemas e começa o processo do "tchau" na história até que se possa cortar a cabeça dele.

Dianna foi um dos assuntos comentados com mais paixão por nós. Ela era uma boa atriz, o personagem dela teve boa aceitação, mas ela era intragável no estúdio. Uma diva. De fato, como poderíamos lidar com alguém complicado que rapidamente se tornava a grande estrela do seriado? Enquanto os chefões garantiram que iam lidar com ela, nós, os operários, só poderíamos contar até dez. No mais, os produtores estabeleceriam algumas regras gerais para conter a farra do elenco, inclusive no comportamento nas redes sociais. Depois de duas horas de avaliações, desabafos e alguns confrontos, toda a Bad Things foi dispensada. Foi como se recebêssemos férias coletivas inesperadas porque emendaria com o feriado de ação de graças. Foi uma festa em que todos comemoramos com cerveja, refrigerante e um pouco de vinho. As secretárias ligaram para pizzaria e encomendaram dez discos grandes. Não deu nem para o começo.