(Carolina)
A semana estava a passar muito lentamente, hoje ainda é quarta e estou tão cansada como se fosse sexta. Como não estava ninguém para atender, peguei no meu telemóvel para ver o que se passava nas redes sociais. De repente sinto um vulto aproximar-se e do nada alguém me abraça a chorar compulsivamente, era a Filipa.
- O que se passa? - abracei-a com força – assim deixas-me preocupada
- Que mal fiz eu a Deus para merecer isto – disse soluçando
- Fala comigo, o que se passa?
- O-o-o ... - desata a chorar
- Vamos até ao balneário, não podes continuar aqui neste estado – peguei no seu braço, fiz sinal ao meu colega que estava na caixa em frente e saímos dali – Filipa, respira fundo e explica o que se passa com calma. Nesse estado eu não posso ajudar – ela tentava parar de chorar mas não conseguia, a respiração dela era ofegante. Alguns minutos depois conseguiu aliviar tudo e falar
- Sabes o exame que fui fazer?
- A amniocentese? – acenou que sim – acusou alguma coisa?
- Sim, ele tem umas deformações graves – volta a chorar, eu abraço-a com força. Não sei o que dizer, como reagir, como ajudar – vou ter que abortar – isto foi pior do que ser atropelada por um camião, mas não me podia deixar ir abaixo para bem da Pipa
- Não há outra hipótese, não há nada que possa ser feito?
- Não, o obstetra disse que se o bébé nasce vai ter imensos problemas e ficar ligado a uma máquina
- Porra – bufei – o Pedro já sabe disto?
- No, vim direta da consulta para aqui, nem tive coragem para lhe ligar
- Compreendo, mas têm que tomar esta decisão juntos
- Eu sei mas isto vai ser tão difícil. Já estava tão habituada à ideia de ser mãe, já andava a ver roupinhas e coisinhas lindas – esboçou o primeiro sorriso – até pensei em nomes, apesar do Pedro não concordar com eles – gargalhou
- Chegaram a falar sobre isso?
- Sim, na noite que fomos sair
- Que nome escolheste para ele não concordar?
- Se fosse menina era Anita, se fosse rapaz seria Hélio
- Agora compreendo o lisboeta – ri-me
- Carolina és má – riu-se
- Desculpa mas não eram nomes que eu daria aos meus filhos
- Agora já não preciso discutir sobre isso, isto não vai para a frente – o choro voltou e abraçou-me com força
- Tu assim não tens condições para trabalhar, vamos ao gabinete do gerente e vais para casa
- Não é preciso, eu prefiro trabalhar, ter a cabeça ocupada
- Amanhã podes vir mas hoje a quente não ficas aqui, ainda descarregas num cliente e depois tu é que te lixas
- Tens razão – fomos as duas ao gabinete do senhor Jorge que compreendeu a situação e ainda lhe ofereceu uns dias de férias mas a minha colega recusou. Levei-a até à porta do Colombo – Obrigada Carolina
- Ora essa, estamos aqui para ajudar
- Nem todas as pessoas fariam o que tu fizeste, és mesmo boa pessoa
- Olha que assim sobes-me o ego – rimo-nos – agora vai para casa, descansa e liga ao Pedro para falarem.
- Sim, mãezinha – despedimo-nos, ela foi à vida dela e eu voltei para o meu local de trabalho