Capítulo 15

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Elissa acordou algum tempo depois. Sua cabeça ainda estava latejando. Aos poucos o quarto foi entrando no foco. Ela estava de volta ao quarto secreto no porão, sentada em uma cadeira de madeira no canto. A garota loira – Rebecca, ela conseguiu se lembrar – estava amarrada na cama, ainda inconsciente. O primeiro impulso de Elissa foi se levantar, mas, quando tentou se mover, percebeu que seus punhos estavam atados. Ele a tinha amarrado pelos braços e pernas à cadeira, com um cordão plástico.

Ao olhar para cima, viu Ryan andando de um lado para outro no corredor. Ele estava agitado. Não parava de morder as pontas dos dedos, arrancando pequenos pedaços de pele ao redor das unhas.

– Por que você fez isso? – ela perguntou, se esforçando para manter um tom de voz calmo.

Ainda queria fazê-lo acreditar que podia deixá-la ir, que ela não revelaria seu segredo – que esta continuava a ser uma opção para eles. Ryan esfregou os olhos vermelhos e respirou fundo, devagar.

– Carrie Anne morreu naquele dia no balanço. Entendeu? Ela morreu. E a culpa foi minha. Ela era tão pequenininha. Agarrei sua mão e acabei puxando, foi assim que ela caiu. Me lembro, como se fosse hoje, do horrível som de algo sendo esmagado. Eu não sabia direito o que tinha acontecido, mas os olhinhos dela ficaram frios, imediatamente. Era como se ela não tivesse mais ninguém ali. Ela era tão nova...

Ryan se abaixou, apoiado as costas no batente da porta, com as mãos na frente do rosto. Então começou a bater com elas na testa, como se estivesse tentando arrancar uma memória de dentro da sua cabeça. Devagar, Elissa processou o que tinha acabado de ouvir – e o medo cresceu dentro dela. Cada fio de cabelo em sua nuca estava arrepiado.

– Se ela morreu, então quem matou os seus pais?

– Não posso viver sem ela. Ela era minha irmã e a culpa do que aconteceu foi toda minha. Eles disseram que foi. – A essa altura, ele estava chorando e soluçando.

Elissa deixou escapar um leve sussurro.

– Você pode viver sem ela, sim. Agora, você tem a mim. – Ela estava tentando soar doce e receptiva, esperando que sua voz pudesse acalmá-lo.

Ryan olhou de volta para ela, com os olhos cheios de lágrimas. Parecia completamente desorientado.

– Você não é Carrie Anne. Não posso ter vocês duas. Não mereço. Eles estavam tentando me punir. Você precisa entender. Eles queriam me punir pelo que eu fiz.

Elissa tentou conter o pavor que estava sentindo. Ela queria mais era gritar, tentar fazer com que alguém lá fora a escutasse. Quanto tempo será que ainda ia demorar até que sua mãe chegasse em casa e se desse conta de que ela não estava lá? Será que aquela ligação tinha sido completada? Se Sarah tivesse ligado de volta e ninguém tivesse respondido, ela tentaria de novo até Elissa atender. Talvez ela percebesse que havia algo errado.

Elissa ficou observando Ryan se balançar levemente para frente e para trás, ainda batendo as mãos na testa. Se Carrie Anne tinha morrido anos atrás, então devia ter sido o próprio Ryan quem matou os pais – nenhuma outra pessoa poderia ter feito isso. Essa ideia parecia bem convincente agora. Elissa nunca tinha visto uma pessoa tão transtornada na vida. Até poucas horas atrás, ela ainda achava que Ryan estava apenas se recuperando do trauma da infância e que, na verdade, estava indo bem. Como ela se sentia estúpida agora – tão ingênua.

Mas, por outro lado, como poderia ter previsto isto – que ele não ia nada bem? De repente, Ryan se levantou novamente. Elissa sentiu todos os seus músculos ficarem tensos de medo que ele pudesse atacá-la de novo. Mas, ao invés disso, ele se moveu metodicamente, desamarrando Rebecca. Depois colocou o corpo mole da garota no ombro e voltou para o corredor.

Não posso ter as duas – Ryan murmurou. – Não tenho permissão para isso.

– Ryan! – Elissa gritou.

Ela bem que tentou fazer força com os braços para romper o fio que a amarrava, mas ele começou a cortar sua pele.– Ryan, aonde você vai com ela?

Não houve nenhuma resposta. Ele ficou fora por uns vinte minutos, talvez mais. Era difícil saber o que estava acontecendo lá em cima. Elissa pensou ter escutado a porta da garagem se abrindo ou o som do porta-malas de um carro sendo fechado. Então viu a babá eletrônica sobre a mesa. Havia uma tela pequena que mostrava um ângulo da sala de estar. Ela ficou olhando para o aparelho, imaginando que sua mãe apareceria na porta a qualquer momento, ou então que Ryan passaria por ali apressado – mas nenhum dos dois apareceu na tela.

Na parede do quarto, havia mais uma foto de Carrie Anne. Ela parecia ter mais que cinco anos. Naquela foto, ela devia ter pelo menos doze. Quem era aquela garota, então? Será que Ryan tinha mentido sobre quando e como ela tinha morrido? A fotografia era de perfil. Os longos cabelos de Carrie Anne estavam caídos em seus olhos, escondendo parte do seu rosto. Em um espelho, pendurado em uma parede distante, Elissa pôde ver uma pequena silhueta dos pais dela. A Sra. Jacobsen era quem estava segurando a câmera, tirando a foto. A expressão em seu rosto era estranhamente distante.

Elissa continuou examinando o perfil da garota. De um jeito bizarro, ele parecia um tanto familiar. Atualmente, ela teria pelo menos vinte anos, mas a matemática pouco importava. Há pouco, Ryan disse que ela tinha morrido aos cinco, quando ele tinha sete. Elissa tinha certeza de ter escutado isso. Intrigada, ela observou o ângulo do nariz, depois o aspecto esquisito de seus cabelos, mais grossos e desgrenhados do que se esperaria para uma garota daquela idade. Foi então que a ideia mais bizarra lhe ocorreu. Seria possível...?

Mas agora, Ryan estava de volta. Parecendo mais calmo, com o corpo relaxado. Foi até a mesa e começou a abrir as gavetas, procurando alguma coisa.

– O que aconteceu, Ryan? Onde ela está? – Elissa experimentou conversar.

Ele a ignorou, como se ela não tivesse dito nenhuma palavra. Ele estava remexendo as gavetas, quando, os dois puderam ver, pela babá eletrônica, uma luz vermelha invadindo a sala pelo vidro da porta. A luz piscou duas vezes e Ryan se virou, pronto para abandonar o quarto secreto.

– Não foi sua culpa ela ter morrido, Ryan – Elissa disse, tentando fazê-lo conversar. – Foi um acidente. Vocês eram tão novos. – Ela estava imaginando que, se conseguisse mantê-lo ali, talvez pudesse convencê-lo a libertá-la.

– Não. Você está enganada – Ryan disparou. – Foi minha culpa, sim. Por isso eles tiveram que me punir.

– Como assim, eles o puniram? – Elissa insistiu. – Por que você não me conta o que aconteceu com seus pais? Pode cofiar em mim, Ryan. Eu sou sua amiga. Vou guardar seus segredos.

De repente, eles escutaram uma voz pela babá eletrônica. Elissa viu alguém parado na porta da frente. Era um policial – um homem de uns quarenta anos.

– Ryan! Você está aí? – ele gritou. Então bateu várias vezes na porta. Elissa tomou fôlego e gritou o mais alto que conseguia.

– Socorro! Eu estou presa no porão! Socorro!

– Ryan Jacobsen – o policial continuou batendo.

Ryan pegou um lenço dentro de uma das gavetas e o passou ao redor da cabeça de Elissa, amarrando-o em sua boca. Ela tentou continuar gritando, mas engasgou. Então Ryan foi embora, sem olhar para trás. Subiu a escada de metal e fechou o alçapão no porão.

A última casa da ruaOnde histórias criam vida. Descubra agora