Capítulo 7

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Elissa subiu a escada lateral, tomando o cuidado de pular os degraus quebrados. Bateu na porta duas vezes, notando pelo vidro embaçado que Ryan estava lá dentro, debruçado sobre seu laptop. Algumas sacolas de compras estavam amontoadas em cima do balcão da cozinha.

– Ei... sou eu... – ela disse, abrindo a porta, que rangeu ao menor movimento. – Eu fiz um CD para você.

Ryan ainda gastou mais alguns segundos no computador, antes de se virar para ela. Ele parecia nervoso, como se tivesse sido pego fazendo alguma coisa errada. Elissa se aproximou mais alguns passos e pôde ver o que havia na tela. Ryan estava olhando o antigo site dela. A primeira música que tinha escrito na vida – Luz do dia – estava pausada, já na metade.

– Essa é a minha página – ela disse, não conseguindo acreditar em seus olhos.

– Eu queria ouvir mais das suas músicas – Ryan murmurou, sem graça. – Isso não é esquisito demais, é?

– Não, a não ser que você não goste delas – ela respondeu, se aproximando mais.

Ryan olhou para o chão, parecendo ainda mais envergonhado que antes.

– Na verdade, eu gostei muito. Suas músicas são lindas.

Elissa sorriu e deu um soco de brincadeira bem no meio do peito de Ryan.

– Certa resposta – exclamou, dando risada. Então deu uma olhada ao redor, finalmente se dando conta de que estava dentro da casa – a casa dos Jacobsen, a casa sobre a qual tanto tinha ouvido falar, antes mesmo de poder vê-la. O cheiro era de humidade e mofo – e, às vezes, de desinfetante. O sofá de poliéster tinha uma estampa bizarra, que mais parecia saída de um episódio de That 70’s Show. Uma porção de desenhos amarelados estavam grudados na geladeira. No balcão, ao lado da pia, entre outras coisas, havia três pacotes de pão, uma pilha de comida congelada e umas vinte latas de alimentos variados.

– Você está estocando comida? Tem algum tipo de abrigo secreto aqui? – Elissa perguntou, descontraída.

Ryan ficou vermelho.

– Eu não gosto de ir até a cidade mais do que o necessário. – Elissa notou as finas grades de metal nas janelas. Ela tinha escutado rumores na escola: mais de uma vez, baderneiros insanos apareceram na casa de Ryan, atirando pedras nas janelas. As coisas chegaram ao ponto de alguém tentar incendiar o sobrado de uma vez por todas. Em parte, Elissa entendia como era. Seu antigo apartamento em Chicago podia não ter sido alvo de vândalos, mas os roubos e o som de tiros não eram nada raros em sua vizinhança. As janelas também tinham grades e a saída de incêndio era protegida com arame farpado.

Elissa mostrou o CD.

– Eu queria que você escutasse uma coisa. – Sem cerimônia, ela foi entrando na sala de estar, onde havia um antigo aparelho de som em cima de uma prateleira, cercado de romances de capa dura. Ao redor, mais uma porção de pilhas de livros por todo lado. Elissa pegou um aleatoriamente, no topo de uma delas – “Arcadia”, de Tom Stoppard.

– Dá para ver que você gosta de ler – disse, enquanto Ryan entrava na sala. Ela o observou por alguns segundos. Naquele lugar, começou a entender o que ele fazia com o seu tempo livre. Ryan devia ser um desses caras que passam dias inteiros lendo, estudando, contentes com a solidão. E com quem, nesta cidade, ele poderia ter qualquer conexão, afinal de contas? Quase todo mundo que conhecia a história dos assassinatos, devia estar convencido de que sabia exatamente quem ele era, antes mesmo de conhecê-lo. A verdade é que eles nunca lhe deram a chance de provar o contrário.

Um pouco nervoso, Ryan passou as mãos na cabeça, tirando alguns fios de cabelo da testa. Suas bochechas ficaram vermelhas, como se ele não estivesse acostumado a receber tanta atenção de alguém.

A última casa da ruaOnde histórias criam vida. Descubra agora