Capítulo 8

227 10 0
                                    

Quando Elissa finalmente saiu, Ryan foi até a porta e ficou ali parado, esperando na varanda, observando enquanto ela atravessava o gramado.

– A gente se vê amanhã – ele gritou para ela. Elissa se virou para trás e ele acenou, sentindo os músculos do rosto duros e esquisitos. Ele nunca foi bom em fingir.

Ainda do lado de fora, ele olhou para o relógio na parede da cozinha. Assim que Elissa entrou em sua casa, ele também entrou rapidamente, pegou uma lata de sopa na pilha do balcão e a abriu. Depois virou o conteúdo dentro de uma tigela e colocou no micro-ondas. Um minuto e meio mais tarde, ele experimentou a temperatura com os dedos, se assegurando de que não estava quente demais. Então arrumou a tigela em uma bandeja, ao lado de alguns biscoitos. Ela ia gostar daquilo, ele sabia que sim. Biscoitos de chocolate sempre foram os seus prediletos.

Carregando a bandeja, Ryan foi até um canto da cozinha e abriu a porta do porão. Desceu as escadas, equilibrando a bandeja com todo cuidado, preocupado em não derrubar uma gota sequer da sopa. Lá em baixo, chutou para o lado um grande tapete e embaixo dele surgiu um alçapão. Deixando a bandeja no chão, ele o abriu, depois desceu a escada de metal que levava ao quarto secreto.

Ele mesmo tinha construído aquele lugar, apenas com a ajuda de alguns manuais de carpintaria. Foi ele quem comprou os materiais e cavou a terra, assegurando-se de que era fundo o suficiente para que ninguém mais a escutasse gritar. Lá embaixo, caminhou até a porta de metal de cinco centímetros de espessura, que tinha comprado anos atrás. Uma sombra se moveu no buraco do olho-mágico. Ryan ergueu o braço, alcançando a chave sobre o batente.

Então respirou fundo, como sempre fazia antes de entrar. Conferiu se a bandeja estava bem equilibrada em sua mão esquerda e a afastou da porta, para que ela não a alcançasse quando ele abrisse. Enquanto girava a maçaneta verificou o olho-mágico de novo. A sombra tinha desaparecido.

Ryan abriu a porta e, imediatamente, o choro estridente tomou conta do ar. Ela estava parada no canto do quarto secreto, perto da pequena mesa parafusada no chão. Sobre a mesa, estava a babá eletrônica pela qual ele monitorava o que acontecia lá embaixo e um quebra-cabeça com o qual a garota podia brincar quando estava entediada. De uma hora para outra, ela se virou e correu na direção dele, seus cabelos loiros jogados na frente do rosto. Ao alcançá-lo tentou arranhar seu rosto e seus olhos, mas ele concentrou todas as suas energias em colocar a bandeja sobre a mesa sem derrubar nada, enquanto, com o outro braço, tentava mantê-la afastada.

Em seguida Ryan tentou contê-la, envolvendo-a com os braços, em um abraço bem apertado, enquanto sussurrava: – Calma, Carrie Anne. Calma. – Foi então que, de alguma maneira ela conseguiu mover o pescoço e mordeu o braço dele com força, tirando sangue. Se contorcendo de dor, ele não a soltou. Carrie Anne não podia fazer aquilo. Ele não ia deixar mais que ela os machucasse. Ryan deu alguns passos para trás, se apoiando na parede de barro para manter o equilíbrio. Então, foi dobrando os joelhos devagar e afrouxando os braços, conforme os dois se sentavam no chão.

Quando finalmente falou alguma coisa, sua voz saiu trêmula. Ele a odiava por isso – pelo que ela tinha feito à sua vida. Ela sempre seria um peso sobre suas costas, até o dia em que ele morresse.

– Por que faz isso, Carrie Anne? Por quê? – ele perguntou. – Não tomo conta de você? Não sou a única pessoa que você tem no mundo?

Quando os dois já estavam sentados, Ryan pegou a pequena seringa que trazia no bolso. Há anos comprava os sedativos por um site que os mandava de algum lugar no México. Ele espetou a agulha no braço dela e apertou o êmbolo da seringa até todo medicamento ser injetado. Demorou apenas alguns segundos para Carrie Anne relaxar. Seus ombros caíram para frente e sua cabeça pendeu para um lado. Ryan tirou o cabelo da frente de seu rosto, olhando diretamente para seus brilhantes olhos azuis – os mesmo que conhecia desde quando era criança.

– Nós temos uma nova vizinha. E eu gostei dela, Carrie Anne. Elissa e a mãe dela se mudaram para a casa dos Reed e você vai deixá-las em paz, entendeu bem? – Ele a chacoalhava com força enquanto falava, incapaz de conter a raiva em sua voz. Era ela quem tinha feito isso a ele – era culpa dela. Por causa dela, tudo tinha mudado.

A cabeça de Carrie Anne caiu para frente e ela sussurrou algo entre sua respiração que se perecia com um sim. Ryan a levou para a cama e deixou o jantar na mesinha, bem ao lado da babá eletrônica. Antes de sair, conferiu tudo ao redor, se assegurando de que não havia nada fora de seu devido lugar. Do outro lado da sala, viu a cadeira de balanço de madeira e, ao lado dela, o abajur com a lâmpada exposta. Então verificou o tornozelo de Carrie Anne. Ele continuava amarrado ao pé da cama, por uma algema de couro, ligada a um cabo de aço. Quando estava certo de que tudo estava em seu lugar, Ryan fechou a porta e alcançou a fechadura para trancá-la.

Seu coração ainda estava batendo rápido por causa da luta com a irmã. Um pouco de sopa derramada no chão chamou a sua atenção. Provavelmente, tinha caído quando Carrie Anne o havia atacado. Ryan imediatamente se abaixou e limpou os pedaços de vegetais caídos, com o pano que trazia no bolso de trás, conferindo se a seringa vazia estava ali também. Então tirou a chave da fechadura e a colocou em cima do batente da porta, escondendo-a com cuidado, antes de subir as escadas. Mal sabia ele o erro que acabava de cometer. A sujeira no chão o tinha distraído a ponto de não perceber que não tinha chegado a trancar a porta. Ela continuava aberta, o trinco virado para a direita, a maçaneta frouxa, só esperando o momento em que Carrie Anne experimentaria virá-la.

A última casa da ruaOnde histórias criam vida. Descubra agora