A Rua de Trás (Parte I) - Luzes Estranhas

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Era mais uma tarde comum de primavera. Alguns poucos raios de Sol escapavam pelo horizonte atrás de um condomínio de nome inspirado naquele fenômeno: Golden Hour (hora dourada). A luz alaranjada incidia na grama da praça dando brilho àquele cenário simples.

Otávio já estava ali quando Letícia e Jorge chegaram. Era para ser só mais uma roda de conversa igual todas as outras, mas aquele era um dia especial: estavam há uma semana do Halloween, feriado favorito do garoto.

O gordinho sardento preparou algo inusitado para aquele final de tarde. Letícia ficou encarregada de levar os marshmallows e Jorge, algumas garrafas de suco de uva. Oto já havia recolhido galhos e acendido a fogueira quando ela quebrou o silêncio:

— Por que estamos comemorando mesmo?

— É Halloween daqui há uma semana... e esses marshmallows estão velhos — disse ele degustando o doce que já não estava tão macio quanto deveria.

— E qual é a ideia? — Jorge finalmente se pronunciou.

— Achei que iríamos contar histórias assustadoras ao redor de uma fogueira antes de morrermos como nos filmes de terror — a moça sugeriu.

— Ideia óbvia, porém válida — Oto balançava as pernas como se tentasse espantar o tédio.

— Acho que tenho uma que vão gostar de ouvir — Jorge introduziu seu relato com um sorriso estranhamente maligno:

Foi em um final de tarde que nem esse. Eu brincava com alguns amigos quando avistamos luzes estranhas em uma casa na rua de trás. Sabia que não deveríamos estar lá, mas fomos mesmo assim. Todos os jovens do bairro tinham curiosidade sobre aquela casa que já estava a venda há anos. Até aí, nada demais. A coisa mudou de rumo após o desaparecimento de algumas pessoas. Alguns vizinhos começaram a agir feito zumbis, como se estivessem sendo controlados ou algo do tipo. Uma semana depois, meus pais me acordaram no meio da noite e nós fugimos às pressas para a casa de um parente. Tudo que disseram foi "eles estão entre nós".

— Eles quem? — Oto perguntou enquanto apertava as pernas na tentativa de disfarçar a mancha úmida em suas calças.

— Os répteis...

— Répteis? Tipo os lagartos? O que eles fariam de ruim? — Letícia se encolhia na direção do contador de histórias.

— Não eram répteis comuns... eu...eu não quero mais falar sobre isso... — Jorge levantou-se. — Bom, pessoal! Por hoje é só!

Os outros dois tentaram impedi-lo de ir, mas algo já havia feito o serviço por eles. Jorge estava paralisado e sua pele, que já era branca, tornou-se ainda mais pálida. Seus companheiros decidiram virar-se para compreender o que causou aquilo. Alguns segundos se passaram até que os olhos curiosos de Otávio se encontrassem com as belas casas do Golden Hour: lá estavam as luzes estranhas.

Como uma tentativa súbita de deter seu medo, o garoto das sardas disparou em direção ao local. Letícia o seguiu deixando o outro amigo sozinho na praça agora mal iluminada pela noite que se instalou. Os jovens foram barrados por um imenso portão de ferro e muros que cercavam infinitamente o lugar. Olhavam de um lado para o outro na tentativa de achar uma brecha para adentrar a fortaleza de classe média. Andaram alguns minutos beirando o muro até chegarem em uma rua sem saída onde havia outro portão. Letícia deu um grito ao ouvir aquela voz intensa e sedutora:

— O que fazem aqui uma hora dessas? — disse uma mulher loira e elegante que vestia um sobretudo vermelho.

— É... nós... apenas queríamos entrar — Otávio disse.

— Sem uma chave? — A loira olhou incrédula. — Talvez eu possa ajudar... vou pegar as minhas. Esperem aqui.

— Por favor, não se incomode com isso! Meu amigo só tem uma curiosidade um pouco inconveniente — Letícia acertou a barriga dele com seu cotovelo.

— Quando voltarem para casa, tomem cuidado. Foi em uma dessas ruas que um carro preto me atropelou... — a mulher disse isso atravessando o portão sem se quer abri-lo.

Os dois começaram a correr antes que pudessem se dar conta do que ela realmente era. Otávio nunca imaginou que tivesse tal disposição. Enquanto ultrapassavam as várias quadras que haviam percorrido para chegar até ali, Letícia escutou o motor de um carro. Ao perceber a situação, Otávio entrou em desespero e voltou a correr, fazendo o motorista persegui-lo rapidamente.


[MENSAGEM DA FAMÍLIA GOLDEN HOUR]

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São Tadeu (Vol. I) Onde histórias criam vida. Descubra agora