A Flor do Pecado

Capítulo 1

Gardenia

Moro há cinco anos em um casarão de estilo antigo em Santa Tereza com mais sete hóspedes. A Dona Zilda é um amor de pessoa e a única que sabe do meu segredo. Senti que podia confiar nela. Do contrário, não teria contado. Acho que ela é uma espécie de conselheira de seus hóspedes, sempre pronta para dar conselhos, sugestões, e uma opinião muito sincera, caso perguntássemos sobre o que fazer em determinadas situações de nosso cotidiano. Mas, existem coisas que não se devem comentar, como contas bancárias e fundos de investimentos, por exemplo. Todo ano vou ao meu banco verificar como estão meus juros, se a meu favor ou não. Peço orientações ao meu gerente de ideias de investimentos, pois tenho a pretensão de um dia ser proprietária de algo lucrativo, mas ainda não tenho ideias formadas sobre o que vale a pena.

Meu namorado nem imagina o que faço da vida. Nesses dois anos que estou com ele, digo que sou babá. Falo a mesma coisa a meus pais há exatos cincos anos.

Conheci Fábio em uma lanchonete que costumava frequentar em São Cristóvão, onde ele mora atualmente. Uma amiga da noite, chamada Mila, morava em um quarto alugado nos arredores, e eu sempre ia lá a fim de colocar os assuntos em dia. Adorava o café da lanchonete, e foi lá que nos vimos pela primeira vez. Fábio sempre muito despachado e nada tímido, foi quem tomou a iniciativa. Não que eu fosse tão tímida, mas a verdade é que estava cansada de tomar iniciativa com homens. Homens que frequentavam a boate, e não era eu que falava com eles, era uma personagem que havia inventado. Queria ser conquistada. E, ele conseguiu. Ele era um cavalheiro no começo do namoro. Sempre fazendo questão de me agradar, me presenteando com perfumes e joias. Claro que fiquei encantada.

Isso durou mais ou menos um ano. Digo um ano, porque, depois que comecei a conhecê-lo melhor, percebi que Fábio podia ser muito possessivo e dominador quando eventualmente se sentia ameaçado por outro homem. O que, de fato, não acontecia. Durante esse tempo em que estamos juntos, nunca o traí ou me interessei por outro homem e não me sinto com vontade. Ele é um homem ótimo, e vejo tantos homens todos os dias, que já não me sinto estimulada a ter algum romance que não seja com meu namorado. Se é que existe ainda algum romance entre nós. Acredito que ainda exista, mas está morno. Por que relacionamentos começam quentes e, com o tempo, somos engolidos pela esmagadora rotina? Essa realidade tem que ser encarada, infelizmente.

Os homens, às vezes, me assustavam, mas ao mesmo tempo os admirava. Como era possível se envolver com mulheres apenas por sexo e ir embora?! Acho que, por mais que as mulheres se esforcem para ser assim, no fundo não conseguem mudar sua essência feminina. Mas, apesar disso, eu resolvi adquirir um modo de sobrevivência até estranho, o qual não posso me entregar totalmente a ninguém. Por isso que digo que Fábio imagina coisas que não existem, são imaginações de sua mente bipolar. É, bipolar, não sabia que ele tinha esse problema psiquiátrico.

Em alguns momentos, Fábio parecia ser duas pessoas em uma. Havia situações em que ele podia ser a criatura mais insuportável, agressiva, dependente e ciumenta. Mas, em outras, um homem com uma gentileza fora do comum. Descobri que Fábio é assim em um dia em que seu celular tocou enquanto estava no banho e ele me autorizou a pegar em sua bolsa, foi aí que vi uma caixa de remédios tarja preta. Arqueei a sobrancelha e achei estranho. Por que Fábio estaria tomando aqueles remédios? Ao pegar e ler, cujo nome muito complicado não me lembro, ele me observava atrás de mim, e ao perceber, me virei. Sua expressão era de quem não queria que soubessem de seu problema. E logo me dei conta de que não era só eu que tinha segredos. Perguntei a ele por que me escondeu, e ele me disse que havia ficado com medo de eu não compreender seu problema. Eu o abracei e disse que jamais o abandonaria por causa disso. Enquanto o abraçava, refletia de que eu também, um dia, precisaria contar a verdade. Mas, ainda me faltava coragem.