Padre Marcos
Acordei às seis da manhã. Ao me levantar da cama, pude perceber, ao abrir a janela, que os dias de verão estavam apenas começando, e prometia ser um daqueles dias muito quentes. Eu costumava celebrar missas pela manhã, e meu horário seria daqui a uma hora. Fui até o banheiro a fim de tomar um banho e me preparar para mais um dia de ensinamentos espirituais.
Dali a alguns dias, minha missão sacerdotal seria em outro lugar, devido a problemas de saúde de Padre Antônio, meu amigo experiente que conheci quando ministrava no Rio e que confiou em mim para assumir seu lugar por tempo indeterminado, devido a uma cirurgia que precisaria fazer por causa de uma hérnia de disco. Essa paróquia fica na Praça Mauá, mas não permaneci lá por muito tempo, pois Padre Pedro me chamou novamente para a capital da loucura, que é São Paulo.
Tinha fascínio pelo ofício de sacerdote, devido à possibilidade de viajar, conhecer muitas pessoas e, principalmente, ajudar o próximo. Eu me sentia preenchido, principalmente quando meu irmão faleceu. Aos poucos, fui me dando conta de que era realmente o que queria fazer. O sacerdócio me fazia perceber como eu poderia ser útil às pessoas, que vinham me agradecer pelos meus conselhos e me veneram até hoje. Eu fico lisonjeado. Talvez a vaidade seja um dos meus pecados capitais. Fazer o quê?! Embora tenha que viver na santidade, sou humano.
Percebo que desperto a curiosidade de algumas pessoas, especialmente do sexo feminino. Admiram-se por eu ainda não ser um senhor, e já passei por muitas situações embaraçosas. Uma delas foi, quando, na confissão, uma jovem de apenas dezoito para dezenove anos, que ao invés de se confessar, fez ardentes declarações de amor. Fazia pouco tempo que havia sido ordenado, e, esperando os fiéis me verem como apenas um conselheiro, fiquei sem ação com a atitude inesperada daquela moça. Eu apenas disse:
— Minha jovem, eu sou um padre. Não confunda seus sentimentos. A senhorita está apenas confusa, é normal na sua idade.
— Eu estou apaixonada pelo senhor! Penso no senhor dia e noite. Penso em te beijar, abraçar... e até casar. Larga a batina, padre. Eu sei que o senhor me quer. Pensa que eu não percebo seus olhares e a maneira como me trata?!
— Eu trato bem todos os meus irmãos. Ore a Deus por isso. A senhorita está me acusando de desejá-la, o que não é verdade. Mas, eu a perdoo.
— Não quero seu perdão. Eu quero o senhor! Por que é tão difícil entender?! Ontem eu tive um sonho. Eu sonhei que o senhor me pegava, tirava minha roupa, entrava em mim...
— Basta, senhorita! Eu quero respeito, por favor. Eu não tenho tempo de ouvir confissões de menina com fantasias com padres! Tenha um bom dia — disse, um tanto chocado e irritado com tanto descaramento.
— Por favor, não vai embora, padre. O que é que tem de mal nisso? Podemos ter um caso às escondidas sem problemas.
Eu me levantei da cadeira sem dizer uma palavra, e lembro que fiquei muito atordoado com aquela moça. Será que iria ser assim? Os fiéis não iriam me levar a sério por eu ser jovem demais? Fui até a sacristia, conversei sobre o ocorrido com Padre Pedro e perguntei o que fazer. Ele achou graça, e eu disse:
— Padre, o senhor ainda ri? Essa moça perdeu completamente o controle.
— Isso é normal. Eu já passei por isso quando era mais jovem. Apenas finja que não é com você, e se ela insistir, tenha uma conversa séria com ela.
— Meu medo é ela falar alguma coisa a meu respeito, inventar, criar expectativas.
Sentei na cadeira giratória da sacristia, e Padre Pedro me deu um copo de vinho. Ele bebia de vez em quando, devido sua forte descendência italiana, e para manter o coração fragilizado mais forte. Bebi um gole.
Ele se sentou de frente para mim e disse: — Marcos, ao longo do seu ministério, você vai passar por muitas coisas. E o que aconteceu, é só uma amostra. Muitas provações vão te pegar de surpresa, e você terá que ser forte o suficiente para se manter firme na sua fé.
Olhei aquele homem de mais de cinquenta anos, de cabelos grisalhos rareando a cabeça. Sua face possuía fortes sinais da idade, causados pela sua experiência.
— Eu tenho trinta anos de ministério, e nesses anos, meu filho, já tive que passar por muitas provações. Mas, estou aqui firme e forte. Quer um conselho? Fique longe de criaturas chamadas mulheres. São seres astutos e que enganaram ate o demônio. Tintim! — ele disse com certo humor, que me pareceu sarcástico, ao bater seu copo no meu.
— Tintim! — eu apenas disse, ao beber o vinho com gosto suave.
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A Flor do Pecado
RomanceGardenia é uma garota de programa que optou trabalhar na noite, por consequências extremas. Ela vive uma vida dupla e esconde a sua real profissão. Padre Marcos é um sacerdote dedicado a sua vocação e aos fiéis, mas ao desembarcar no Rio de Janeiro...