Capítulo 5

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Padre Marcos

O calor das três da tarde era insuportável. Eu usava uma camisa de manga comprida com o típico colarinho de padre, me sentia sufocado com a estação mais quente do ano. Eu caminhava pela Avenida Paulista em meio a seus infinitos carros, trânsito enlouquecedor e agitação, cada vez mais me fazia ter saudades do Rio. Descobria que no meu íntimo, desejava cada vez mais fugir daquela loucura toda, e ansiava pelo dia de ministrar novamente em meu estado natal.

Eu estava vindo da casa de mamãe, que morava próxima à Avenida Paulista, e a dois quarteirões de onde ficava a paróquia onde celebrava missas. Minha próxima missa seria às seis da tarde, e como ainda dava tempo de eu resolver o que precisava, apressei os passos. Dona Margarete, uma das fiéis da paróquia, me pedia inúmeras vezes que fosse tentar convencer a filha a esquecer um amor platônico que a fazia não se alimentar mais, devido a essa forte e, ao que indicava, paixão não correspondida. Me perguntava qual conselho daria a essa jovem. A preocupação de Dona Margareth era de dar pena. Suspirei.

Ela morava em um apartamento na Avenida Paulista. Cheguei à portaria e, ao cumprimentar o porteiro, ele me olhou através da cabine com ar de surpresa. Já podia imaginar. O que um padre queria ali àquela hora?

— Boa tarde. Por favor, a Dona Margareth se encontra?

— Ela não mora mais aqui, só a filha. Parece que se mudou para o Bairro de Fátima.

— Estranho. Ela me deu esse endereço — revelei, ao mostrar o papel com o nome do prédio.

— Sim, é aqui. Mas, faz uns dois meses que ela se mudou.

— Na verdade, eu vim falar com as duas. Porém, já que ela não se encontra, eu não sei.

Passei a mão na testa para limpar o suor do calor, enquanto tentava decidir. Se fosse embora, iria me sentir mal, pois Dona Margareth havia me pedido que eu desse conselhos à filha. Afinal, meu papel não era o de direcionar meus fiéis?

— Será que ela se encontra?

— Eu ainda não a vi sair. Se o senhor quiser, eu a chamo.

— Pode chamar sim, por favor. — Acenei em gesto afirmativo.

— Eu achei que o senhor não viesse mais!

— Mas eu vim. Muitos compromissos, senhorita. Porém, aqui estou.

— O senhor tem palavra mesmo. E, é por isso que o admiro — disse Carmem, filha de Dona Margareth, ao me receber na sala do amplo apartamento.

— Por favor, sente-se.

Acomodei-me no espaçoso sofá.

— A palavra é um dom, senhorita. A propósito, e a sua mãe?

— Minha mãe está morando em outro lugar. Parece que encontrou uma pessoa, sabe, padre?! — ela disse, animada.

— Que bom. Espero que ela seja muito feliz.

Pensei comigo que talvez fosse por isso que ela havia sumido há umas duas semanas.

— Eu também, padre. Desde que meu pai faleceu, minha mãe não tinha se envolvido com mais ninguém. Até agora.

Dona Margareth ainda não era exatamente uma senhora. Beirava os cinquenta anos, e ainda conservava uma beleza madura.

— Então, a senhorita está morando sozinha.

— Sim. Eu vou tentar me acostumar. Às vezes sinto falta dela — ela declarou, enquanto ia até o armário de cozinha. Serviu-se de licor e colocou um cálice para mim

— Senhorita Carmem, é só uma dose — disse, ao pegar o pequeno copo.

Ela sorriu.

— Eu sei que os padres da Idade Média adoravam uma bebidinha. — Ela se sentou ao meu lado, e acrescentou: — Ao amor.

— Saúde — falei desconcertado.

A Flor do PecadoWhere stories live. Discover now