Capítulo 19

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Padre Marcos

Gardênia! Nome de uma flor bonita e com um perfume inebriante. Igual à dona desse nome. Eu me encontrava na sacristia, sentado, recostado, olhando para o teto, enquanto me perdia na lembrança daqueles olhos castanhos. Droga! O que estava acontecendo comigo? Por que ela insistia em assaltar meus pensamentos? Vinha tentando me controlar desde que tinha conhecido Gardênia, vê-la como apenas uma amiga, mas meus secretos instintos masculinos não tinham ajudado, e cada vez mais me colocavam à prova. "Meu Deus! O que farei?" perguntei-me, enquanto me levantava da cadeira de escritório da sacristia. Comecei a perambular, igual a um tigre enjaulado que ansiava por liberdade. Às vezes, eu me sentia preso pelo meu controle de emoções e isso era assustador, ainda mais se tratando de desejos tão intensos! Corri as mãos em meu rosto. Talvez não fosse tão complicado se ela fosse a namorada de Fábio. Um dos primeiros mandamentos da bíblia, nas leis de Moisés, era: "não cobiçarás a mulher do teu próximo". Suspirei. Era o que eu estava fazendo desde o primeiro instante em que a tinha visto. "Vou tomar um banho gelado", pensei, enquanto saía da sacristia. Um banho de água fria acalmava as tentações! Subi as escadas para o meu quarto, que era onde ficava o banheiro.

A igreja se preparava naquela manhã de julho para as típicas festas juninas, e os enfeites, as comidas e a música eram organizados pela Dona Vera e por Gardênia. Deus! Eu a via naquele momento pela janela de meu quarto. Ela estava ajudando Dona Vera com as bandeirinhas e os enfeites. Gardênia insistiu em vir, e eu disse que não precisava, mas não tinha adiantado. E Dona Vera ainda tinha reforçado que seria bom ter mais uma ajudante, então, lá estava ela. Linda! Eu a observava lá embaixo, e ela ainda não tinha me visto. Usava um vestido que me colocava mais uma vez à prova. Seu tecido flutuava com o vento do inverno, deixando a mostra suas belas pernas torneadas. Seus cabelos flutuavam enquanto colavam a sua face, tocando sua boca, que vinha me provocando nesses últimos meses. Droga! Meu Deus! Não tinha adiantado eu ter tomado um banho gelado, como Padre Regis tinha me aconselhado, na tentativa de me fazer exorcizar meu desejos. Fechei a janela. Só de descer e olhá-la de perto, tinha sensações que realmente deixavam meus nervos ameaçarem falhar. Mas não deixaria de cumprir meus compromissos paroquiais por causa de uma tentação. Eu tinha que aprender a educar meus desejos! Abri a porta do quarto temeroso, mas, ao mesmo tempo, me sentia com ansiedade latente em vê-la com mais proximidade.

Enquanto descia as escadas, estava tendo uma sensação que sempre sentia ao vê-la. Era como se fosse algo estimulante, que não podia provar, mas, ao fazer isso, ficava eufórico e contente, renovado... Logo tratei de apressar os passos.

— Está lindo, Dona Vera! Essa decoração está ficando maravilhosa. — Ouvi Gardênia dizer à Dona Vera.

Ambas estavam arrumando e enfeitando as mesas com pequenos banners de decoração com uma gravura de uma bonequinha de festa junina. Observei Gardênia enquanto estava de costas. Eu estava na porta da igreja e quis ficar ali contemplando sua dedicação aos preparativos da festa na paróquia.

— Padre Marcos!

— Oi senhorita, tudo bem? — respondi meio sem jeito, quando ela se virou de repente.

Ela sorriu. Aquele sorriso que sempre me perturbava. Céus! Ela se aproximou.

— O senhor está gostando, padre? Está sendo muito divertido ajudar Dona Vera.

— Está muito bonito. Vocês estão fazendo um bom trabalho.

— É, estou me empenhando ao máximo para tudo ficar nos trinques!

— É, vocês estão conseguindo.

— Padre, essa menina é danada e tem boas ideias, olha só como ficou isso aqui! — disse Dona Vera, ao mostrar a barraca do amor, decorada com maçãs do amor e um véu de noiva na entrada em forma de arco.

— Parabéns, Gardênia! Realmente está um primor — elogiei-a.

— Se os fiéis gostarem, ótimo!

Seu sorriso. Passaria a vida admirando.

— Claro que vão, minha querida. Tudo o que se faz com dedicação é recompensado.

Naquele instante, os fiéis começaram a chegar, e comecei a distribuir meus cumprimentos e saudações a eles. Queria achar uma maneira de distrair minha mente e desviar um pouco minha atenção dela.

Em pouco tempo, a igreja já estava com um número acentuado de pessoas, e logo Dona Vera pediu a um dos rapazes coroinhas que colocasse logo as músicas juninas. Ele estava perto da caixa de som e ouvia Dona Vera o instruir. Gardênia foi correndo e disse alguma coisa a ele e Dona Vera, que fez ambos mudarem de ideia. Estavam no grande pátio da igreja, e me aproximei, curioso.

— Henrique, coloca as músicas pra animar, rapaz — disse, animado.

— Padre, eu pedi a ele que colocasse um pouco de forró. Mas, agora não — disse Gardênia, fazendo um gesto de espera com a mão.

— O que o senhor acha, padre? Daqueles forrós mais antigos — Dona Vera perguntou.

— Qualquer música com boa qualidade, Dona Vera.

Naquele momento, o rapaz colocou uma canção de Waldick Soriano: Perfume de Gardênia.

— Mas, isso não é forró — falei, achando graça.

— Eu trouxe esse CD de casa, padre. Acho essa música linda pra dançar. Dança comigo?

— Eu não sei dançar, Gardênia. Vou apenas pisar no seu pé — argumentei sem jeito, com seu convite juvenil.

— Vai nada! Vem comigo, eu ensino o senhor!

Antes que pudesse dar uma resposta, Gardênia me puxou pela mão para o meio do pátio, e eu fiquei totalmente sem ação por sua atitude repentina.

— É tão fácil, padre — ela disse, enquanto me conduzia.

— A senhorita é muito corajosa em querer dançar com um desengonçado feito eu!

— Tudo se aprende, padre! Ninguém nasce sabendo. Me dê sua mão direita. A esquerda, o senhor conserva na minha cintura. — Ela me instruía com uma graça que era impossível resistir.

Eu fazia o que ela me pedia e, enquanto a música tocava, Gardênia me conduzia. Ao sentir seu corpo tão próximo ao meu, fiquei um tanto embaraçado. Havia um clima sensual que me fazia desejá-la loucamente a cada vez que permanecíamos tão próximos. Seu perfume me inebriava, permitindo-me ter reações nada ortodoxas. Mas tinha decidido não me importar com as sensações que Gardênia me causava. A música traduzia o que eu sentia por aquela moça, seu corpo era uma cópia de Vênus, seu olhar me embriagava, seu riso era uma rima de amor e poesia. Até mesmo entre as flores, era a mais bela. Essa letra que escutava, cantada com tanto sentimento e inspiração, era exatamente o que aquela moça me fazia sentir.

No embalo daquela canção, dançávamos como se não tivesse ninguém nos olhando. Não queria me importar com o que poderiam estar pensando e comentando por presenciarem tamanha intimidade. As pessoas que cuidassem de suas vidas. Seu calor era um abrigo interessante para mim. Mesmo sendo cada vez mais perigoso, eu não queria me deixar ser tão rígido como estava sendo e precisava ser. Mas, não naquele instante. Sentir sua energia que me avassalava, era tudo o que precisava naquele momento. Um combustível interessante, do qual nunca pensei em precisar sentir.

o: XQ]

A Flor do PecadoWhere stories live. Discover now