Você Não Pode Fechar O Coração

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A madrugada é um lugar de segredos revelados, sonhos perdidos, saudades. Madrugada é lugar de choro escondido, amores complicados. E a madruga para Carol era eterna. Seu pijama listrado não esquentava seu coração e estava a um palmo daquilo que poderia lhe aquecer a alma, mas que também poderia ser seu caos. Day, virada pra parede, respirava devagar, sinal de que ela havia caído no sono. Carol que estava de costas pra Day, virou-se e observou o roupão gigante ao seu lado, os cabelos castanhos que pareciam pedir para tocá-los. Ela ficou admirando a mulher que estava em sua cama, a mulher que muitas vezes tirou seu ar e ela estava ali, a um ato de coragem de distância.
Quando Carol conheceu Day, ela tinha alguém em sua vida e isso fez com que Carol nunca tivesse pensado na hipótese de tê-la tão perto assim. Por muitas vezes havia tocado em Day, a beijado no rosto, a abraçado, afinal foram muitos dias de intimidade por conta de estarem juntas quase que todo tempo, enquanto durou o programa. Ensaios, ensaios e mais ensaios. Festas de promoção do programa, às vezes, para não ficar em quartos de hotel, Carol se hospedava na casa de Day e ali viveram momentos que Carol jamais esqueceria. Era quase mágico o tempo. Um dia, Day a levou para conhecer São Paulo e passaram o dia andando pelas ruas da cidade, conhecendo os pontos turísticos, tomando cafés e se amando entre olhares, mesmo que sem nenhum toque. Carol não entendia aquele sentimento e era muito confuso pra ela. Eram muitos os casais de meninas que ela conhecia e de meninos também, ela nunca foi preconceituosa ou qualquer coisa do tipo, conviveu inclusive com Day e sua esposa e achava incrível a maneira que se relacionavam. Para Carol, Day era alguém tão especial que não compreendia. Nunca havia sentido aquilo antes, nem por outras garotas, muito menos por garotos. E aquilo era muito estranho para Carol. A certeza que ela tinha de que se casaria e teria uma família socialmente correta, que antes era certo na cabeça de Carol, já não fazia sentido algum agora. O coração é terra sem dono, é vento que não sabe onde irá parar. Ele escolhe o amor e tudo que fazemos é aceitar ou não. Se entregar ou negar-se. Mas Carol estava com medo, muito medo.
Ela virou-se para tentar afastar seus pensamentos, fechou os olhos na tentativa angustiada de dormir, mas não conseguia, não poderia dormir tão perto e tão longe de Day.

Ainda de olhos fechados, Carol sentiu o braço de Day se aproximando num abraço. Day estava dormindo e num impulso abraçou Carol, a trouxe para perto do seu peito. Carol suspirou quando sentiu suas costas tocarem no peito de Day. Era uma sensação de conforto estar nos braços dela, então não se esquivou, pelo contrário, se ajeitou em seu corpo e se aqueceu, afinal amigas dormem na mesma cama, qual o problema? Mas foi quando a boca de Day tocou sua nuca e seu corpo estremeceu, que fez Carol pensar em dormir no chão. Queria correr dali e ao mesmo tempo queria estar ali para sempre. Sua luta interna e sua respiração ofegante acordaram Day num susto. Day abriu os olhos e os fechou de volta em menos de dois segundos, puxando Carol mais para perto com seu braço, numa conchinha perfeita. Carol percebeu que Day estava realmente dormindo e aliviou a tensão, permitindo aquele contato físico, porque era a única maneira dela conseguir dormir também, ali em seu abraço. Os olhos foram fechando, sua consciência foi sumindo, sua respiração mais calma, Carol já estava quase dormindo e não conseguiu discernir se era um sonho, quando ouviu a voz de Day, distante, dizendo num sussurro:
"Biazin, se tem algo mais cheiroso que seu cabelo, eu nunca senti" .

Quando Day acordou, ela sente o corpo de Carol encaixado no dela e o cheiro dos seus cabelos envolvia todos os seus sentidos. Ela não fez nenhum movimento com medo de acordar Carol e ela não queria perder a sensação de tê-la tão perto. Seu cheiro, seu calor, sua respiração agora mais calma, ela dormindo em seus braços, ela não queria perder aquele momento. Continuou com seus olhos fechados apenas sentindo aquele turbilhão de coisas dentro do peito. Depois de tantas coisas que Day havia vivido, nada se comparava com aquele momento. Nenhum beijo, nenhuma transa, nada. Era a inocência de um amor que Day sabia que Carol jamais deixaria fluir, Day sabia que Carol não tinha coragem. E lamentou as coisas que poderia viver com ela e sentiu saudades das coisas que jamais viveriam juntas. A impossibilidade daquele amor fez o coração de Day doer e ela, num movimento suave encostou sua cabeça na nuca de Carol, o movimento fez Carol acordar.
Day percebeu, quando Carol se afastou dela, acabando com aquele momento e sentiu o frio do espaço entre elas. Carol sentou-se na cama, olhou em direção de Day ainda deitada e lhe disse:
"Bom Dia!"
Day escondeu sua frustração e sorrindo lhe respondeu:
"Bom Dia!"
"Estou com fome" - Carol
"Vamos pedir algo pra comer, vai tomar banho antes, ou posso pedir?" - Day
"Pode pedir, vou apenas trocar de roupa. E você vai continuar com esse roupão?" disse Carol, sorrindo.
Day retribuiu o sorriso e respondeu:
"Vou me trocar também, melhor, né?!?"
Elas riram e Day levantou-se num pulo e correu para o banheiro: "Eu primeiro" - gritou já dentro dele.
Carol sorriu e foi até a mala achar algo pra vestir.

Depois do café, Carol começou arrumar suas coisas para retornar à Curitiba. Day sentada num canto tirava algumas notas no violão, esperando Carol terminar para acompanhá-la ao aeroporto. Carol só pensava em sua família, voltar à sua casa e tentar colocar seus pensamentos em ordem longe, muito longe. Ela ouviu Day tocar e sabia que a música que ela tocava era algo diferente de todas as coisas que elas tocavam juntas... Uma música nova!
Carol se apressou e fechou o zíper da última mala. Sentou-se no chão em frente a Day e a ouviu cantar e era mais ou menos assim:

Se quiser pode ficarNão tenha pressa de ir emboraO teu olhar, eu vi é só meuTô só esperando a hora

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Se quiser pode ficar
Não tenha pressa de ir embora
O teu olhar, eu vi é só meu
Tô só esperando a hora

Se você se aproximar
Nem que seja devagar
Deixa rolar
Pode ser a noite inteira

Cola o teu corpo no meu
Finge que já percebeu que eu tô na tua

Eu me perdi no teu olhar
Se não for pedir demais deixa de se preocupar
Eu já não sei o que fazer
Pra te convencer que no final vai ser eu e você

Se quiser pode ficar
Não tenha pressa de ir embora
O teu olhar, eu vi é só meu
Tô só esperando a hora

Se você se aproximar
Nem que seja devagar
Deixa rolar
Pode ser a noite inteira
Cola o teu corpo no meu
Finge que já percebeu que eu tô na tua

Eu me perdi no teu olhar
Se não for pedir demais deixa de se preocupar
Eu já não sei o que fazer
Pra te convencer que no final vai ser eu e você

E se o tempo não voltar não
Então me diz o que tu quer pra não se arrepender depois
Nesse jogo eu tô na tua mão
Por isso tá fácil de ter meu abraço

Carol adorava as composições de Day, mas aquela música falava sobre elas. Day havia escrito uma música pra elas e ela só queria chorar. Day percebeu e levantou-se, guardando o violão na bag e estendeu a mão pra que Carol pudesse se levantar e disse:
"Vamos, Carol. Seu voo sai em uma hora, precisamos ir".
Carol estendeu a mão de volta e levantou-se, ainda perturbada com a canção. Era uma mistura de querer fugir e querer beijar Day, querer correr e querer ficar pra sempre.

Mas Carol pegou seu voo para Curitiba e fugiu pra longe...

P L A Y - Parte 1Onde histórias criam vida. Descubra agora