Observei a silhueta de o animal desaparecer sobre a densa floresta.
Eu deveria ter dito outra coisa, talvez agradecer. Com certeza agradecer. Mas eu não sabia como começar esse tipo de conversa.
-A proposito Kian, obrigada por salvar minha vida eu realmente me acho muito nova para morrer. Definitivamente eu deveria aprender logo a lidar com ele, além de me poupar o trabalho de ter que lidar com todos aqueles idiotas, ainda conseguiu água e comida.Sei que ele não me contou a verdade quando perguntei como ele sabia onde eu estava talvez tenha sido pelo olfato do animal, mas mesmo assim como ele sabia que eu estava em perigo. Sei que minha mãe não iria interferir em minhas escolhas, e meu pai conhecia a importância de nossa cultura. Acima de qualquer outra coisa eles sempre respeitariam minhas escolhas. Minha mãe até tentou me convencer a não participar, e eu entendia o seu lado. Mas meu pai entendia o meu, eu cresci esperando pelo Rito de Sangue. Todo Illyriano esperava.
E todos eles terão que me engolir, não vou somente me tornar a primeira mestiça fêmea a participar do Rito e me tornar guerreira como também pretendo comandar as linhas de frente da Corte Noturna quando chegar a hora.
Mas por enquanto meus planos continuam focados em chegar ao topo da montanha. Não vou entrar em brigas desnecessárias para poupar minha energia, se fosse em outra ocasião estaria caçando cada um dos malditos que me encurralarem.
Connor ainda esta vivo, mas não por muito tempo. Ninguém me trai daquela forma e continua respirando.
Mesmo sem querer me lembrei de quando nos conhecemos no acampamento, ele era apenas algumas semanas mais velho do que eu, lembro como rimos quando ele chegou perto e descobrimos que eu era mais alta que ele. Seus cabelos possuíam cachos em um tom de castanho claro único, seus olhos escuros eram quase pretos ele se tornou muito bonito. Quando atingimos certa idade, parecia certo, e eu me deixei levar, que mal poderia me fazer? Ele jurava que éramos parceiros, e nos esperamos pelo laço de parceria.
Foi então que tudo desmoronou o laço de parceria não apareceu. E não me pareceu justo tirar de alguém o que não me pertencia. Mas mesmo assim continuamos.
Connor não conseguia lidar com uma fêmea que conseguia se virar sozinha, alguém que não seguiria as regras, alguém disposta a lutar. Eu compreendia os machos que corriam para o lado oposto para não estar perto de mim.
É difícil acreditar que fêmeas nasceram para servir e obedecer, e de repente elas não se importarem com as tradições.
Os Illyrianos surtaram em meu primeiro dia no acampamento, surtaram ainda mais quando detonei muitos deles em seus ringues. Alguns acreditavam que eu estava ali somente pelo meu pai, e que logo me cansaria e voltaria a viver em Velaris. Mas sempre foi muito mais que isso.
Cassian me ensinara a amar os ringues, a amar o sangue escorrendo, os machucados e ossos partidos não eram nada, comparado à adrenalina que se apoderava do meu corpo, que corria pelas minhas veias.
Após terminar de comer o largato que Kian trouxera horas atrás, me preparei para começar a caminhada ate o topo da montanha. Levariam dias, talvez três ou quatro.
Caminhei lentamente pelos cascalhos íngremes, sempre alerta. Algumas pedras solta faziam meus pés escorregarem, mas me mantive firme.
Pensei em meu Pai, Cassian e Azriel. Lutando para sobreviver, juntos. Um grupo inusitado. Meu Pai sofrera entre os Illyrianos por ser mestiço, e eu sofria por ser mestiça e fêmea. As coisas não eram fáceis para nós, muitas vezes quis gritar para que elas acordassem e me ouvissem.
Se uma Illyriana tivesse o desejo de se tornar uma guerreira assim como eu, seria descartada para o casamento. Se ela quisesse treinar só para se defender, as regra só as permitiam terminar quando acabasse as tarefas domesticas.
É claro que eles não aceitariam que nós também tivéssemos vontade de aprender, é bem mais fácil manter sua presa quieta quando ela esta indefesa. Eles não queriam que ocupássemos a mesma posição, sempre pensaram em nos como se fossemos inferiores. Não queriam que tivéssemos voz.
Ironia do caldeirão talvez, mas quando atingi certa idade, eu sabia o que queria. Eu queria gritar por aqueles que não tinham voz. Eu queria defender aqueles que estavam vulneráveis. Eu queria um lugar melhor para todas as Illyrianas, para que quando as mães grávidas após descobrirem que sua cria fosse fêmea, não chorasse sobre seus corpos por não poder protegê-las.
É por isso que estou aqui, não é pela gloria nem pelo reconhecimento. Mas pelo direito de escolher que elas não tinham.
E mesmo que meu corpo ficasse cansado, mesmo correndo risco de vida. A minha luta era por algo muito maior.
Um dia se passou e eu não encontrei ninguém, talvez Kian os tenha matado no meio do caminho.
Não me importava, e assim prossegui, calculei que em mais um dia chegaria ao topo.
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Corte de Liberdade e Redenção
Fanfiction[ Concluído ] Kian é filho do Grão Senhor da Corte Primaveril. Vitani é filha do Grão senhor da Corte Noturna. Quando Kian finalmente consegue escapar da Corte Primaveril e do casamento arranjado que seu pai forjou se vê buscando abrigo nas mãos do...