Capítulo IV - Episódio 17

23 1 2
                                    

Derris estava sentindo as dores do treino. A cada dia que passava desde que começara a treinar com Guido, um soldado amigo de Anita, as dores pareciam aumentar. Quando pensava estar se acostumando, Guido aumentava a intensidade e no outro dia Derris acordava mais uma vez dolorido.

Guido era um llanure da pele vermelha, tom de pele muito semelhante ao de Anita. Entretanto, Guido havia sido criado na vala até conseguir entrar para a guarda. Além de forte e cheio de cicatrizes, causadas por doenças, Guido possuía um sotaque muito característico do povo das Terras-Ruins.

Derris parecia ter conquistado a confiança do rapaz. As amizades entre Auróptis e Terras-Ruins sempre tinham um mau começo, mas o espírito a favor dos Terras-Ruins de Derris era a chave para todas as aproximações, e Guido já parecia ter removido a camada mais grossa de preconceito ao aceitar treiná-lo.

Quase todos os dias os dois terminavam o treino e iam para Porto Seguro tomar cerveja e comer petiscos. Se não fosse militar e amigo de um Bougherberg, um homem como Guido jamais colocaria os pés naquela estalagem.

Nos últimos dias, os outros amigos de Derris estavam muito distantes. Guido surgiu tapando uma lacuna decorrente dos eventos dos últimos dias.

Foi em um dia de intervalo dos treinos que Derris criou coragem para enfrentar seu pai mais uma vez, enquanto visitavam a principal ferraria dos Bougherberg, a maior ferraria do mundo.

— Tudo bem? — Ronald perguntou com cara de preocupação, olhando para o filho se retorcendo ao seu lado. — Parece que levou uma surra.

— Não literalmente — andou na frente do pai com um sorriso no rosto. — Quer café?

O pai assentiu.

As dores tomavam conta da coxa enquanto andava e mal conseguiu levantar a jarra com café.

— Sério, filho, você precisa de um médico?

— Não, pai. Faz parte do treino.

— Treino?

Ronald parou de ler os papéis que estava lendo e começou a acariciar seu grande bigode.

— Sim, Anita arranjou um soldado dela para me treinar. Aliás, é por isso que quero uma armadura, escudo e espada.

— Imaginei que fosse para enfeitar seu quarto, e não para você usar.

Todas as fábricas de Ronald Von Bougherberg foram construídas com uma sala especial para que ele pudesse passar dias trabalhando com conforto. O trabalho fazia Ronald ficar dias ou até vários ciclos solares acompanhando os negócios em um lugar específico. Um homem como ele não ficaria sofrendo o desconforto de uma fábrica.

No escritório, Derris e seu pai terminaram o café e se dirigiram para o salão das bigornas, onde dezenas de homens batiam o martelo contra pedaços de ferro, quase em uma sinfonia de tilintares ecoando pelo salão.

O ferreiro mestre tirou as medidas corporais de Derris e ficou com a missão de construir uma armadura que além de útil, fosse bonita.

Depois de tirar as medidas, Ronald e Derris seguiram pelas ruas do Distrito Operário escoltados por um pelotão de soldados.

— Pai — interrompeu Derris logo que atravessaram o portão que dava acesso à Cidade Alta. — Obrigado por vir comigo hoje. Queria aproveitar para falar contigo sobre minhas atividades nas tarefas da família.

O pai ficou em silêncio, mas parecia intrigado.

— Pensei em começar com algo mais simples — continuou Derris. — Já que minha ideia das armas não lhe agradou.

A saga dos filhos de Ethlon I - Porto das PedrasOnde histórias criam vida. Descubra agora