Capítulo 02 - STEPHEN

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Leio pela terceira vez a mesma frase até aceitar que não vou mesmo conseguir ler este livro. O jogo sobre a mesa irritado e não me dirijo à minha próxima aula. Talvez não queira mais fazer direito. Não estou ansioso para defender culpados. Não estou nada satisfeito por um futuro onde tratarei de divórcios. Não quero ter que brigar por direitos de trabalhadores mal pagos e vê-los perder, mesmo estando certos, porque estas empresas são as que movimentam a capital do país. Não, não quero. Nada em direito me atrai. Sei que não é apenas isso que um advogado faz, estou focando nas coisas ruins, coisas que tanto vejo acontecer nas firmas do meu pai, que é o lugar onde vou passar o resto da minha vida quando concluir isso. Devia ter concluído meu curso de fotografia, ao invés de ter decidido ser um bom filho e trancado meu sonho para realizar o do meu pai. Assim como devia ter ficado na minha, esperando a pessoa certa cair de paraquedas na minha vida, ao invés de procurar me apaixonar pela melhor amiga do meu maior inimigo.

Caitlin partiu meu coração. E isso tem um significado muito maior do que aparenta.

Decidido a salvar pelo menos o dia de hoje, saio da faculdade e sigo para o Central Park. Este é o lugar preferido da Caitlin, mas não é por ela que estou aqui hoje. É por mim. Observo as pessoas à minha volta, mães brincando cansadas com seus filhos, crianças correndo e fazendo novas amizades, casais apaixonados se pegando. Tiro a câmera da mochila e começo a fotografar. Passo a manhã toda fotografando até que me dou por satisfeito e volto para casa.

Gosto de avaliar as pessoas nas fotos que tiro. Fico horas imaginando a vida de cada uma delas, o que faz para viver, o que gosta, o que pensava no momento da foto. São pessoas aleatórias que sequer sabiam que estavam sendo fotografadas, e isso é o que mais gosto. Passeando pelos rostos de cada pessoa capturada, um em especial me chama atenção. É a garota que caiu de moto. Ela também estava no Luck na outra noite. Aproximo seu rosto na tela e noto que olha diretamente para a câmera, diretamente para mim. Por algum motivo, nesses últimos dias, este foi o terceiro lugar em que eu estava e ela também estava. A terceira vez que a pego olhando para mim. Não pode ser apenas coincidência. Ela não me é estranha, mas não consigo me lembrar de onde a conheço.

Após analisar os rostos e pessoas, as poses e flagras, e todo o cenário que as compõe, certifico que ainda não encontrei a foto, aquela que vai me fazer correr atrás do que realmente quero e sair de vez de debaixo das asas do meu pai. Essas fotos estão boas, mas não são nada além de fotos. Não há nada especial nelas.


Como o bom filho que tento ser, volto para a faculdade. A verdade é que minhas noites sem o Luck têm sido uma enorme merda. Ainda vou lá, claro, é como minha segunda casa. Mas não é a mesma coisa ver os caras lutarem, e saber que você é o próximo. Não há nada como saber que aquele lutador que acabou de esmagar um oponente será seu próximo oponente. Não há nada como avaliar um lutador em ação, conhecer seus golpes, identificar suas fraquezas e criar todo um plano de ataque para vencê-lo. Meu tédio assistindo o campeonato agora que não faço mais parte dele, me mostrou o quanto sou um péssimo expectador.

A sensação de que não estou sozinho está comigo desde que botei os pés na faculdade esta manhã, e apenas foi se intensificando com o passar das horas. No momento, eu quase poderia jurar que alguém caminha ao meu lado. Paro no corredor vazio e olho para todos os lados, e apesar do perfume forte e a respiração que posso jurar ter ouvido, estou sozinho.

— Jesus? — tento, mas não obtenho resposta.

Se não é espiritual, tenho um perseguidor. Nos meus dias de rei do Luck, isso não seria tão anormal, principalmente com um campeonato mundial em curso, pessoas são capazes das mais variadas loucuras para alcançarem um objetivo, e vigiar um lutador é uma das coisas mais comuns nesse meio.

O horário das aulas termina, as pessoas começam a aparecer aos montes no corredor, e por hora não poderei descobrir quem está acompanhando meus passos escondido nas sombras. Finalmente um novo passatempo: descobrir quem anda me seguindo e porquê. Dou-me conta que Caitlin está passando por mim quando o perfume dela me atinge e sou puxado bruscamente de volta às lembranças de momentos tão bons que passei ao lado dela. Olho em seus olhos grandes e ela os desvia, abaixa a cabeça e não me dirige a palavra. Ela fez sua escolha: Colin Hanson, e ele aparentemente não respeita as escolhas dela, já que não podemos ser amigos.

De que adianta ser o cara bonzinho se foi com o malvado que ela ficou no final das contas?

Ao fechar a porta do meu armário flagro ao longe um par de olhos castanhos fixos em mim. Os encaro de volta e a garota que tem aparecido em toda parte onde estou, os desvia imediatamente. Como fez no clube, quando tentou entrar nas paredes para que eu não a visse, ela quase entra em seu armário. Caminho até ela decidido a saber porque ela está em tantos lugares em que estou e qual seu problema comigo, mas quando chego ao local onde estava, ela sumiu. Dou dois soquinhos na porta de seu armário e digo alto o bastante para que ela ouça caso esteja realmente ali dentro:

— Espero que não tenha conseguido entrar aí, vai ser bem complicado sair depois, principalmente quando sua chave está com um desconhecido.

Tiro a chave do armário e a levo comigo. Ela vai parar de ficar me observando ao longe e vai finalmente aproximar-se de mim. Porém, quando coloco os pés para fora da faculdade o barulho de uma Kawasaki ronronando atrai diversos olhares e a garota de olhos castanhos passa sobre ela, os cabelos ao vento, a calça colada ao corpo e suas botas altas. Não era ela me observando no corredor.

— Quem será que eu tranquei no armário?

Acho que estou mesmo ficando louco.

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