8 - Mentes Que Mentem

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— Se preparem para entrar na nave!

— Peguem suas coisas!

— Eles estão chegando!

Dizia Elohin, que estava com a mente super acelerada, causando um tumulto no refeitório, logo no café da manhã do terceiro dia em que eu estava lá.

Ele falava como um profeta, como um Noé chamando as pessoas para a arca antes do dilúvio.

— Não se assuste! Quando ele está medicado ele é até bem interessante de conversar, mas vive fingindo que está tomando os remédios, daí se perde em suas ideias e sempre faz umas cenas dessas. — Jasmim me explicou e prosseguiu narrando a cena que víamos: — Agora a equipe médica corre atrás dele e ele dá um olé... até que eles o prendem e o levam para o isolamento esperando que ele se acalme e volte à sanidade.

— Você fala com tanta tranquilidade, mas isso é cruel demais, nem um animal deveria perder a liberdade deste jeito! — falei abalada.

— Todos nós sabemos que esse é o último recurso! Elohin passa por isso toda semana... mas não aprende!

Eu realmente detestava ver os pacientes perdendo seus direitos de liberdade, mas tive que conviver com isso, porém isso nunca deixou de me abalar, eu passava o resto do dia como se estivesse de luto quando via estas cenas.

— Ele é cheio de esquisitices, até mudou o nome, acredita? — Elohin diz que não gosta do seu nome de batismo, pois o achava sem significado, além de ter um número ímpar de letras, daí se deu este pseudônimo e não atende se o chamarem pelo outro. Ele é muito fissurado por nomes, números e simetria. — contou Jasmim.

Ela disse também que Elohin acreditava que tudo em nosso sistema era uma conspiração, que estávamos todos sendo observados e queria acabar com toda a manipulação da mídia e dos políticos.

Continuou Jasmim:

— Confesso que muitas das coisas que ele pensava tem muito sentido e até provas, mas ele ultrapassa a barreira da clareza a respeito dos fatos e fica obcecado... Até nas músicas e filmes, ele encontra mensagens subliminares que hipnotizam as pessoas a serem fracas mentalmente e as fazem seguir padrões que facilitam a manipulação da massa, que então pode ser conduzida como uma manada.

— Então, sou louca mesmo, pois também percebo essas coisas. — eu comentei.

— Até eu! — disse Jasmim continuando. — Mas ele se perde muito nessas histórias. Quando Elohin foi internado nesta última vez, ele estava andando pela cidade de madrugada, quase que sem roupas, destruindo patrimônios públicos como forma de protesto. Isso que na mente dele, iria ajudar a libertar a humanidade.

— Sei, ele é um justiceiro que vive em uma realidade apocalíptica e tem de enfrentar isso em nome do equilíbrio maior, enquanto espera pelos seres que virão do alto. — comentei já tendo conhecimento deste tipo de caso.

— Mas quando ele está mais controlado, ele percebe que ultrapassa um pouquinho os limites. — Jasmim falou rindo.

— Só um pouquinho! — concluí.

— Se fica claro que suas atitudes estão desequilibradas, ele até aceita tomar os remédios, mas depois vem os pensamentos de que estão tentando o enquadrar na manada e começa tudo outra vez.

Eu entendia bem esse tipo de pensamento e comentei:

— É uma pena! Além do que, quantas pessoas também acreditam em um figura salvadora, no fim do mundo e no mal? Cada um acredita de um jeito! Infelizmente, a mente exagera, né?

Jasmim fez um gesto concordando e eu prossegui:

— De mente confusa eu entendo bem! A mente prega peças muito dolorosas. — Falei lembrando que eu também estava ali por causa das minhas próprias confusões, mas vendo aquilo achei meus problemas menores.

Jasmim estava falante neste dia e continuou contando:

— Fora isso os TOCs dele me deixam aflita. Ele, às vezes, anda desviando das linhas do chão ou desviando dos pisos de cores diferentes, tentando encaixar o pé certinho para não pisar a divisão entre eles.

Muitos ali tinham comportamentos excêntricos, mas Elohim se destacava.

— O pior é a questão da simetria, até a comida no prato tem que estar organizada, ele inclusive deixa de comer por isso, ou porque o refeitório está bagunçado. Vive criando caso! — falou Jasmim em tom de irritação.

— Tenho que confessar que me identifico com algumas dessas coisas em menor grau, mas não incomodo ninguém, pois estou quase sempre sozinha. — falei reflexiva.

— Todos aqui tem suas esquisitices, eu tenho várias! O problema é que ele tem tooodas... — Jasmim deu uma risada gostosa que não era normal de se ouvir naquele local tão deprimente.

O Livro de ÍsisOnde histórias criam vida. Descubra agora