Capítulo 6

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POV JC

- Joana, minha neta, me diga se aquilo lá são horas de chegá em casa?

- Fui a uma festa vovó, saí bem antes de terminar.

- Não acho isso certo não. E outra coisa: essas suas roupas estão muito curtas, parecem de moça assanhada.

- Vovó, são assim as roupas bonitas daqui – responde minha irmã enquanto rola os olhos sem que minha avó veja.

- A Inês não se veste desse jeito indecente e não é malamanhada – insiste minha avó, que não é boba.

D. Severina chegou ontem, mas já percebeu que algo não está bem com minha irmã. O problema não são apenas as roupas, mas a atitude desafiadora e seu ar misterioso.

- Não quis acordar a senhora quando cheguei, me desculpa – Joana tenta acalmá-la, mas pela careta que faz por suas costas, sei que é apenas fingimento.

- Vovó, conta uma história – pede Toninho, sem saber salvando Joana de mais recriminações.

- Lá na minha terra, havia um trecho da estrada em que ninguém passava depois das 10h da noite. Todo mundo arrodeava, mas não ia por lá. Contavam-se histórias que o Tinhoso ficava de tocaia, esperando os desavisados. Um cabra novo na cidade, que era um cavalo-do-cão bancando o corajoso, resolveu infrentá o perigo, depois de estar mamado de tanto bebê. Mas o que o abiscoitado não sabia, é que estavam engabelando ele, o levando para outra parte da estrada, para lhe pregar uma peça. Os meninos traquinos se vestiram de preto e quando o metido a raçudo apareceu, lhe deram um susto tão grande, que ele torô um aço. Saiu correndo meio abilobado e nunca mais contô vantagem pra ninguém.

Rimos muito e a discussão ficou esquecida. Após o almoço, estudei por umas horas. Resolvo passar um tempo com minha irmã, tentar uma nova aproximação e falar do Pedro. Seria ótimo se eles se acertassem, ele gosta tanto dela. Joana me recebe já vestida para sair.

- Já está de saída? Queria conversar um pouco.

- Combinei um sorvete com umas amigas.

-Vejo que está com uma roupa mais comportada.

- Se não bastasse mamãe e você, agora tenho que ficar ouvindo falatório da vovó. Preciso ir senão me atraso, conversamos outra hora.

- Tudo bem, divirta-se.

Joana volta tarde, perto da meia-noite, e escuto quando entra, apesar de já estar deitado. Algo me diz que não era com amigas que estava até agora e me preocupo ainda mais com minha irmã, pois já não a reconheço. Demoro a dormir, lembrando-me do tempo em que ela era doce como Inês e dos sofrimentos que a transformaram.

- E aí, cara, tomou coragem para falar com a Larissa? - encontro Pedro à minha espera perto da minha sala.

- Não sei, vou esperar mais uns dias.

- Estou te achando estranho, tudo bem?

- É a Joana. Acho que tem mentido sobre onde anda e com quem.

- Algum namorado novo?

- Pode ser, mas não entendo porque esconder. Desculpa falar disso com você, sei que gosta dela.

- Somos amigos, pode desabafar sobre o que for. E também me preocupo com ela.

- Desde que foi humilhada por aquele idiota riquinho e sua namorada fútil, ela não é mais a mesma.

- Eu sei, o preconceito por ser pobre e simples a abalou muito. Desde então, só pensa em roupas caras, maquiagem, em parecer quem não é.

- Ela estava apaixonada pelo idiota. Descobrir que ele dava atenção a ela apenas para brincar com seus sentimentos foi demais – sinto meu sangue ferver ao lembrar-me de sua agonia ao descobrir que era a piada da escola.

Sonhos e preconceitos - Livro 1 da Série SonhosOnde histórias criam vida. Descubra agora