Capítulo 3

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Heitor

Aquele era o último dia de carnaval e ao invés de estar em casa descansando eu estava trancado no escritório trabalhando como louco. Mas que sentido havia em ir para a casa se não havia ninguém lá à minha espera? Não, era apenas um grande apartamento vazio que fazia com que eu me sentisse ainda mais solitário. Larguei a caneta em cima da minha austera mesa de trabalho, abri a gaveta e peguei a foto de Marianne, ela tinha um lindo sorriso nos lábios, aquele sorriso que pensei que ficaria para sempre em minha vida, aquele sorriso indulgente que iluminava meus dias.

Mas se tem uma coisa certa na vida é que: se você não cuida de quem você ama, você está fadado a perder essa pessoa. Infelizmente esse foi o maior dos meus erros, Marianne estava sofrendo calada, seu ressentimento e sua mágoa sobre algo que era imperceptível para mim. Eu vivia no paraíso, mas fui levado ao inferno em questão de segundos. Como diz Paulo Coelho: A vida é muito veloz, faz-nos ir do céu ao inferno numa questão de segundos.

Sentado em meu escritório, perdido em devaneios, com o coração doendo e lágrimas correndo soltas pelo meu rosto, lembrei-me de nosso último feriado de carnaval juntos

Era um dia extremamente quente, fevereiro estava a todo o vapor e com ele as festividades de carnaval, nas quais eu nunca dei importância e para minha sorte nem ela. Para mim o melhor daquele feriado era poder adiantar o trabalho do escritório em casa e acho que esse foi o maior dos meus erros, meu vício em trabalho, minha ausência em casa, minha sede em subir cada vez mais e um dia chegar onde eu realmente me sentisse pleno e feliz. Acabei por descobrir que já tinha tudo o que precisava para ser feliz, só que já era tarde demais. Lembro-me que nossas brigas começaram naquele último dia de carnaval...

— Como você quer que eu saiba disso se você não me fala que quer? — Gritei muito alterado com Marianne, não era de meu feitio gritar ou descontar nela as minhas frustrações do trabalho, mas vê-la ali tão ressentida comigo, por coisas que eu negligenciei ou sequer adivinhei sem ela me contar era muito frustrante. O motivo de nossa discussão era o fato de eu ter aceitado o trabalho em uma cidade distante, era um contrato muito grande que nos estabeleceria financeiramente e ela havia mencionado só agora o seu desejo em voltar para a faculdade, só após os acertos com o contrato.

— Você nunca presta a atenção em mim! Você nunca está aqui e acho que o fato de você nos arrastar para outra cidade ridículo.

— Porque você não se opôs quando mencionei a proposta de trabalho? Porque você não me disse que não queria ir? — Deus, eu estava tão frustrado, não sabia o que fazer para deixa-la feliz.

— Porque eu pensei que você recusaria o trabalho — gritou ela a plenos pulmões.

— Pois pensou errado! Você acha que eu gosto de trabalhar feito louco? Você acha que eu gosto de passar os fins de semana inteiros trancado no escritório?

— Sim, eu acho que você gosta sim!

— Eu faço isso por vocês Marianne, para dar uma boa vida para você e o Gabriel.

— Mentira! Você gosta de trabalhar, acabou se tornando igualzinho ao seu pai. — Aquela menção ao meu pai fez com que eu me retraísse por completo. — Heitor... me desculpe eu...

— Chega! Estou saindo...

— Eu não queria compara-lo ao seu pai... — Vi que ela havia se arrependido no momento que mencionou meu pai, ela sabia como era nossa relação.

— Eu sei... eu só preciso sair. — Falei. Estava me sentindo um merda por gritar com ela.

— Onde você vai?

Cicatrizes de uma vida - Ed2 - L 1  - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora