Conflito

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Capítulo 16

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"Você não consegue entender meu pensamento vulgar,

Essa é a resposta certa."

(13Stairs[-1] – the GazettE)

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Ela queria poder dizer que Jaoki não era tudo aquilo que aparentava, mas se via incapaz de aceitar essa mentira.

Lembrou-se de como sua companhia foi agradável enquanto assistiam ao filme. De um jeito peculiar, ele a fazia rir com seus comentários divertidos. Sentiu-se à vontade, relaxada, apesar de saber que não devia permitir afeto algum surgir.

Jaoki em nenhum momento forçou-a a explicar por que não quis dormir na casa de Oreki ou o que a levou a caminhar solitária na chuva. Ele não perguntou nada a respeito, mas Kayla estava convicta de que, se dissesse qualquer coisa, seria atenciosamente ouvida. Na verdade, talvez Jaoki estivesse tão entregue àquela interação quanto ela.

Sorriu grata ao pensar na gentileza dele durante aquela noite.

Assim que terminaram o filme e o yakisoba, sentados tranquilamente no sofá, o sono veio sorrateiro e logo era o momento de descansar. O guitarrista não tinha quarto de hóspedes como Oreki, tampouco colchões sobrando para o caso de receber alguém. Por isso, depois de algumas vãs tentativas de fazê-lo mudar de ideia, Kayla via-se agora deitada na cama de casal do seu anfitrião enquanto ele tentava se ajeitar na sala. Ao menos o guitarrista tivera uma escova de dentes extra para lhe dar.

Remexeu-se várias vezes entre os lençóis, mas na penumbra do quarto acabava por encarar alguns pôsteres estilizados das bandas que Jaoki gostava. Sex Pistols parecia estar em todo o lugar em CDs, chaveiros, bottons e canecas de fãs. Acabou por rir sozinha imaginando o rapaz comprando esses itens de colecionador.

Para piorar, a cada vez que afundava o rosto no travesseiro sentia o perfume masculino, um tanto cítrico e intenso, emanando do tecido. Aquele aroma definitivamente combinava com ele.

Gemeu em protesto pelos próprios pensamentos. Ela devia estar muito carente para se interessar assim, tão precocemente. A verdade é que não sabia se relacionar romanticamente, tendo vivido apenas encontros sexuais sem compromisso. Nunca pôde trazer à sua caótica vida um vínculo a mais para se importar. E o sexo desde o início foi uma experiência desprovida de qualquer cuidado, ganhando contornos de necessidade. Para Kayla, a relação sexual casual tornou-se uma linguagem que a dissociava da dor, que a fazia se refugiar de si mesma e do mundo que a oprimia. Uma troca na qual era usada e usava ao mesmo tempo.

Repentinamente, lembrou-se de que na noite seguinte teria um encontro com Satoshi. Remexeu-se mais uma vez, reconhecendo ter agido muito errado com o moreno. Devia cancelar o compromisso e, com honestidade, confessar seu "quase sexo" com Daisuke. Era melhor que Satoshi soubesse logo o que aconteceu, porque não merecia desperdiçar seu tempo com alguém como ela.

Aliás, ninguém devia desperdiçar nada com ela, julgava amarga.

Sentindo-se tola e sozinha, Kayla adormeceu.

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Jaoki estava deitado no sofá, insone e concentrado em lembrar-se das palavras de Kayla enquanto conversavam. Algumas vezes ela relatava seu passado com um saudosismo tão doloroso que o fazia desejar abraçá-la até restarem somente recordações alegres. Ele não se considerava alguém protetor ou cuidadoso, mas diante daquela mulher essas características pareciam despertar com assustadora naturalidade.

A Garota DelesOnde histórias criam vida. Descubra agora