Selvagem

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"Vultos de todos os tamanhos

Se movem pelos meus olhos

As portas em minha cabeça

Estão trancadas por dentro

Cada faísca

Acende uma vela

Em memória daquele

Que vive sob a minha pele"

-Shadow On The Sun, Audioslave    


Eu havia perdido tudo. Perdido tudo e jogado fora o que me restara. A verdade é que eu não tinha mais forças nem uma vida. Perdi muito do meu tempo e partes de mim mesmo nas várias tentativas de fazê-la ver as burradas que fazia e mantê-la viva, nas tentativas de salvá-la de si mesma e demovê-la de suas ideias malucas... E para quê?

Que sentido tudo havia feito se no fim ela simplesmente decidira se deixar abater como um animal, morrendo pouco a pouco pelo monstro que a sugava desde dentro!? A coisa nem havia nascido ainda e já estava destruindo vidas, a começar pela própria mãe... E me peguei imaginando se não devia ter deixado a criatura nascer para então matá-la, Bella provavelmente me mataria depois (se sobrevivesse), mas não seria muito pior do que ela já havia feito comigo.

Agora eu estava ali, perdido no mais penoso sentido da palavra. Estava há quilômetros do meu lar e de minha família e, ainda que fracassado e furioso, eu não deixava de pensar nela. Se ela estava bem, se a coisa saíra dela como a vampira psicopata (eu não consegui impedir que rosnados irrompessem de meu peito ao pensar na loira) dissera que ia acontecer. Será que ela já era um deles ou não tinha conseguido?

Eu parti, correndo, naquele mesmo dia, atordoado e com dor demais para conseguir pensar e me acalmar o bastante para fazer o fogo ceder... Minhas únicas forças e controle eram convertidos em velocidade e eu a mantinha em uma constante, que eu poderia manter por dias sem parar antes de cansar. Leah e Seth não disseram nada quando estiveram em minha mente horas mais tarde, só verificando, eu percebi. Queriam notícias minhas, algo para dizer para meu pai e quem mais perguntasse. Não consegui produzir sequer um pensamento coerente ou um pedido de desculpas por abandonar a matilha que formávamos pela força das circunstâncias... Eles não me pressionaram.

Eu corri, sem direção certa, aproveitando o silêncio e afundando em amargura, até que a dor era só o que a excessiva pressão do vento incisivo causava em meus ouvidos, ou o que queimava em meus músculos por exigir demais deles, ou em minha garganta pela sede... Logo o animal em mim suprimiria a dor do homem de uma vez por todas.

Ou foi o que eu esperei... Mas não foi como quando eu recebi seu convite de casamento, era muito pior agora e essa dor não foi suprimida, como se o lobo dentro de mim também tivesse perdido algo.

Eu já havia visto os dias irem e virem muitas vezes... Um mês talvez, um pouco menos quem sabe, não mais que isso. Enfim havia um equilíbrio, as dores da fome ou do cansaço não sobrepujavam a dor de ter perdido Bella ou de não saber dela, mas minhas emoções não eram maiores que meus instintos embora eles brigassem em páreo duro por espaço dentro de mim.

Tudo era silêncio, apenas eu e minhas dores e ausências, até ali... Eu dormia profundamente há algumas horas quando então, suave e muito claro em minha consciência alguém me chamou, despertando-me aos poucos.

"Vamos lá, Jacob, não tenho todo o tempo do mundo", a voz era impaciente, mas ainda era afetuosa, o que se tratando de Leah tornava a situação ainda mais onírica. "Estou de partida e espero que lembre que vamos precisar nos aturar ainda"

DuskOnde histórias criam vida. Descubra agora