A última noite

170 28 0
                                    

O sol já havia se escondido atrás das colinas das terras de Belmonth quando Mérlin e o exército da deusa chegaram perto da fronteira. Ali eles acamparam e fizeram uma fogueira grande o bastante para assarem um javali e se esquentarem do frio. Com flautas e alaúdes os celtas criavam uma melodia extasiante. Um som que entrava pelos ouvidos e aquecia o espírito de guerreiros. Em um raio de cinco quilômetros era meio improvável que os romanos pudessem ouvir a melodia, porém, mesmo assim todo cuidado era pouco e necessário.

Comeram, beberam, dançaram, contaram histórias divertidas sobre guerras passadas e outras nem tanto assim. Por fim, grande parte dormiu e descansou para o grande dia. Mérlin, porém, não dormiria tão cedo. Seu coração estava inquieto. Sentia uma força muito grande se arrastado do Norte. A noite estava calma, uma brisa suave soprava por entre as árvores. Mas o coração do jovem mago estava como o fim da fogueira que crepitava solenemente.

"Crack" - um estalo!

── Quem está aí? –perguntou Mérlin se levantando.

O silêncio foi a resposta. Logo o ruído de algo se escondendo entre os arbustos deixou o jovem mais uma vez desconfiado.

── Vamos, responda! Quem está aí?

E mais uma vez não houve resposta.

── NOCHD DUINE! (nóc dâine)

As mãos de Mérlin iluminaram e um corpo foi erguido. Um menino de aparentemente doze anos apareceu na penumbra da floresta e foi trazido para perto do mago.

── Por acaso é um espião? – questionou Mérlin mantendo o menino levitando no ar.

── Não senhor Mérlin – respondeu o menino – Eu vim dentro de um dos barris de vinho. Escondido da minha mãe. Meu pai está junto dos outros guerreiros. Eu vim pra ajudar também.

Mérlin cancelou sua magia e pôs o menino no chão. Acenou com a mão para que ele se aproximasse. O menino se sentou do lado do jovem mago que o cobriu com uma parte de sua capa.

── Quando eu tinha um pouco menos da sua idade eu fui levado pelos romanos. Eles tinham acabado de assassinar a minha mãe. Eu fui escravizado por longos anos. Não precisa ser um guerreiro para lutar por aquilo que você acredita. Nós vamos derrotá-los. E você estará ao meu lado para ver esta vitória.

── Sim senhor Mérlin!

O mago afagou o cabelo do menino e o entregou uma adaga.

── Proteja-se!

── Sim senh... Senhor? Senhor Mérlin?

── Sim, pode falar.

── Aquilo são estrelas? – perguntou apontando para o céu.

Os olhos de Mérlin reluziram o brilho das pequenas bolas de fogo.

── Não, não são estrelas... Venha! Acordem! Acordem! Estamos sob ataque! Vá se esconda!

Flechas de fogo rasgaram o céu e alcançaram o acampamento. Homens e mulheres foram acertados enquanto dormiam. Às pressas, os guerreiros procuravam suas armas e armaduras para se defenderem. Mais uma rajada de flechas cruzou o céu. E logo veio a terceira. Gritos e chamas tomaram conta do acampamento. Na quarta rajada Mérlin tomou a frente e ergueu as mãos. Uma energia grandiosa tomou conta do lugar e um escudo de proteção azulado protegeu os guerreiros celtas. Não houve mais rajadas. Nem sinal de guerreiros. O mago já ia desfazer o escudo quando uma silhueta surgiu. Uma mulher. Ela caminhou solenemente até chegar perto do escudo de proteção.

── Athena? – perguntou Mérlin com admiração.

── Vejam se não é o traidor – respondeu ela com desdém – Como que o chamam agora? Mérlin não é?

── Eu nunca fui um de vocês, Eu...

── Poupe-nos! Isto foi apenas um aviso! Ainda há tempo para recuarem.

── Isto não vai acontecer!

── Muito bem... Então guarde suas energias para amanhã. Irá precisar.

Athena deu um soco no escudo que na mesma hora trincou. Ela sorriu e deu as costas para Mérlin. Logo a deusa sumiu na penumbra. O trincado se espalhou e em segundos o escudo se estilhaçou em centenas de pedaços. E o seu coração que antes estava quente e crepitante agora estava estilhaçado, como seu escudo.

Os Contos Celtas: Morrigan (REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora