UNTOUCHED

Capítulo 18

Eu estava parada decidindo se devia adentrar ou não o tal abrigo para idosos. Várias pessoas passavam por mim na calçada e me olhavam de maneira estranha. Eu deveria estar parecendo alguma lunática encarando sem parar a porta de entrada. E de qualquer jeito, eu precisava começar o trabalho voluntário o quanto antes, porque Jerry iria fiscalizar para saber se eu estava realmente cumprindo ou não.

No momento me veio Berlinda Rodrigues em minha cabeça. Será que a loura oxigenada dos infernos também estava cumprindo a punição? De uma forma ou de outra, os pais de Berlinda eram ricos o bastante para doar uma nova seção na biblioteca para compensar o que a filha fazia. Como eu não tinha dinheiro nem para sair do país.

A menos que vendesse meu carro, mas ele não estava no meu nome. Ou seja, nem vendê-lo estava sendo cogitado. Mas eu não o venderia não me desfaria de algo que eu quis tanto. Já que eu não podia e apegar as pessoas eu me apaguei a algumas coisas como meu carro, notebook e caderno.

Lembrar do meu carro trouxe a memória de Marie e John. Foram eles que me presentearam. Eu precisava ligar para os meus avós. Eles mais do que ninguém, mereciam que eu fosse me redimir pelo modo frio como os tratei em alguns anos. Eu prometi que eu tentaria mudar, para ser alguém melhor para aqueles que gostavam de mim, assim como eu mudaria por mim mesma. Era estranho pensar que eu poderia ter amor próprio. Mas eu acho que eu tinha, eu só preciso resgatá-lo.

– O que há de tão interessante na porta?_ eu pulei de susto quando Alfonso perguntou do nada atrapalhando a minha conversa mental.

– Nossa Alfonso, você me assustou._ eu acusei vendo-o sorrir

– Desculpe-me moça._ ele pediu docemente levando minha mão até seus lábios e dando um beijo singelo_ Mas me diga, o que faz aqui fora? Porque não está lá dentro?

– Eu estou receosa._ comentei olhando a fachada mais uma vez.

– Receosa de quê? Tem medo que os idosos tentem te jogar na piscina? Que te obriguem a jogar xadrez mesmo se você não souber?_ Alfonso perguntou rindo.

–Bobo!_ eu dei um soco leve no seu ombro rindo também.

Desde que eu me abri com Alfonso, as coisas haviam melhorado consideravelmente. Não digo que a minha vida virou um conto de fadas, mas a questão é que eu passei a enxergar as coisas de uma maneira diferente. Ia demorar até que eu conseguisse ser a mesma Anahi de antes, talvez até mesmo eu nem consiga ser a Anahí de antes, mas o simples fato de tentar torna tudo diferente.

Torna diferente porque antes eu estava impedindo qualquer tipo de transformação. Eu me surpreendi ao chegar em casa naquele dia e correr para o meu quarto atrás de uma foto. A única que eu havia guardado. Nela estava eu e Madson pequenas. Eu evitava ver aquilo, porque geralmente eu tinha a mesma reação que tive quando Madson foi até meu quarto me mostrar o álbum de fotografias.

A diferença é que em vez de agir de maneira horrenda com Madson, eu agia comigo mesma. Acho que era uma forma de me punir. Depois que Alfonso me falou tudo aquilo, pareceu que uma grande parede havia sido derrubada. A parede que já estava quase pendendo. A que eu tentava manter erguida para afastá-lo de mim.

Eu vi ali o quanto Alfonso era frágil, o quanto ele sentia dor. Só que ele não permitiu que a dor comandasse a vida dele do jeito que eu fiz com a minha. Ele se permitiu viver, mesmo achando que poderia ter feito algo pela angel. Ele viveu e ajudou os outros. Foi a partir da morte de  anagel que ele se juntou ao trabalho voluntário.

Ele procurou através de ajudar as pessoas com as suas dores, tentar achar a cura para a sua própria dor. A dor nos acompanhará sempre em nossas vidas, mas ela pode ser em menor intensidade. Eu já estava cansada de viver na dor. E enquanto estava abraçada firmemente a Alfonso em seu quarto eu percebi que havia atravessa uma linha tênue. Eu sabia que estava deixando algo para trás e começando uma nova fase. Eu sabia que eu precisava ser forte, e eu tentaria ser, até porque agora eu tinha a certeza de que eu não estava sozinha.