Rafael
Reconquistar alguém é mais difícil do que conquistar. Quando você está se envolvendo pela primeira vez com uma pessoa, vocês estão atirando no escudo, mergulhando de cabeça, pulando do penhasco. Tudo é novidade. A depender de sua intensidade você dita as regras: ir com calma, ir rápido, não ir.
No primeiro encontro, os erros são relevados, perdoados e justificados. O sexo fala de vontade esbaforida de exploração do outro. O olhar dos parceiros é algo a se descobrir, e essa viagem é feita de VLT (um metrô ainda mais rápido). A novidade ainda não assusta, o desafio é excitante.
Entretanto, quando a gente vacila muito ou vacila feio e quebra a confiança ou toda a base concreta que se havia construído com a convivência, o amor e o tempo, perdemos o chão e tudo se desmorona. Daí para frente, reconstruir tudo é uma grande missão que requer paciência, atitude, força e amor. Tudo por que leva tempo.
Primeiro a se fazer é admitir o erro. Depois identificar o erro, do mesmo jeito que se procura um erro os projetos de construção ou no meu exemplo... Falhas no caminho. Quem traiu, onde a polícia foi mais esperta que a gente, a esperteza da pessoa que tinha uma missão para cumprir... Coisas do tipo.
E mesmo assim, contigo correndo atrás de tudo, restaurar a confiança pode ser um trabalho em vão. Contudo, é o que minha coroa me ensinou, uma das poucas coisas que dei ouvidos a ela: "se tu fez a merda, é seu dever consertar a merda".
Eu sou completamente apaixonado pelo Guilherme e sei que vai levar tempo para ele me perdoar. Sei também que eu não posso perder a última coisa que me restou. Sei ainda que tem poucas coisas que posso fazer para impressionar ele. Por que na arte da reconquista é assim: vocês já se conhecem. Não existe o primeiro olhar de admiração. Existe o olhar da comparação.
Uma coisa é eu ter defendido ele de uma briga com outro traficante. Outra coisa é eu ter terminado com ele para defender ele de outro traficante, humilhado-o e depois me arrepender e querê-lo de volta como se nada tivesse acontecido. E como o próprio Guilherme diz, ele não precisa que alguém cuide de si. Eu precisava entender que para estar ao seu lado, deveríamos estar de mãos dadas e não equilibrando em mim.
Com tudo isso que disse, uma coisa ainda me dava esperança de ter um futuro ou algo do tipo com o Gui. Algo nele me mostrava que ainda existia a pureza daquele primeiro sorriso, abraço e carinho. Depois de tudo que passamos, Gui ainda conseguia dormir em meus braços e se sentir leve e me permitir estar perto dele nos bons e nos maus momentos.
O relógio marcava quase três da madrugada e eu despertei com o vibrar do celular. Tinha uma rotina a seguir, uma meta a atingir. Deixei Gui descansando na cama e saí sorrateiramente, não sem antes deixar um beijo em sua testa e sorri com seu suspiro leve e sem preocupações.
O domingo amanheceu e depois de ter resolvido as pendências, fui tratar de um assunto antigo que me atormentava as noites. Caminhei até a casa que a pouco tinha saído e esperei a anfitriã terminar de regar suas plantas.
-Posso conversar com a senhora?
-Vai me matar do mesmo jeito que fez com meu sobrinho?
-Não senhora. Eu quero conversar com a senhora, se você me permitir.
-Quer tratar o que comigo? Não tenho nada com você! Graças a Deus desse mundo eu e meu filho passamos longe. Ou meu filho tá te devendo algo?
-Dona Neide...
-Nós somos pessoas de respeito. Meu filho faz faculdade o dia todo. Depois ainda trabalha no Campinho. A gente não deve nada a ninguém. Não fica nessa vida de vagabundo que acaba com os outros.
-Dona Neide... Não é isso. Me deixa explicar.
-Explicar o quê? Veio fazer cobrança de dívida passada? Veio avisar que agora tem que comprar as coisas de você? Eu moro nesse lugar desde que me entendo por gente e não vai ser você quem vai...
-Eu vim pedir desculpas.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Rascunho (Romance Gay)
Romance-Eu notei que você é bastante religioso e como eu não sou tanto... -riu- Minha avó era católica e eu fui o único neto que ela conheceu, meus outros primos nem são daqui do estado. Aí, ela me presenteou com isso aqui. Ele abriu e era um cordão com u...