quema

847 94 62
                                    

Lá no 10° andar o meu calafrio aumentou e eu pude notar a luz automática se apagando, alguém estava ali e se fosse a Dinah eu juro que nunca a perdoaria por tentar me assustar tanto. Agora era o 5° andar e eu só estava torcendo para ninguém entrar no elevador comigo. Eu não saberia como ia reagir e talvez eu acabasse com o ritual ali na hora. Ia ser muito perturbador. Apertei o botão do 5° andar e eu posso garantir que vi de relance um dos vasos do hall balançarem antes da porta se fechar com um baque muito alto, eu não estava imaginando coisas, aquele elevador estava mais barulhento do que o normal. Eu me senti apavorada mas ainda estava um pouco cética, quando estamos com medo nosso cérebro nos prega peças. Era impossível que alguém tivesse balançado aquele vaso porque não existia ninguém no hall naquela hora.

— Calma, Lauren... — disse baixinho para mim mesma e olhei para o chão. Não queria encarar a porta quando ela abrisse, por mais que eu saberia que encontraria um outro hall escuro e vazio.

Juro que a descida daqueles 5 andares pareceu uma eternidade e o tempo não parecia funcionar direito com a realidade, eu já tinha perdido um pouco da noção de tempo e começava a acreditar mais ainda que algo estava errado. "É SUA CULPA!" era o que passava na minha cabeça, ah mas quando eu terminasse essa merda a Dinah ia me pagar por ter me colocado nessa situação. Sentia meu pescoço suado por mais que estivesse inteiramente com frio e não sabia mais o que fazer, então apertei o papel na minha mão com força, amassando-o. O elevador parou e a porta demorou a abrir como se fosse um filme em câmera lenta, meus olhos ainda encaravam o chão mas eu conseguia ver que aquele andar estava claro, as luzes automáticas estavam ligadas. Fechei os olhos. Um barulho de salto alto andando no chão e um sopro no meu pescoço surgiram ao mesmo tempo. Merda, eu não acredito que a Dinah combinou com alguém para entrar nesse andar! Eu juro que ela ia ouvir umas poucas e boas, meu coração quase saiu pela boca para ser apenas uma piada da Dinah, pelo menos era o que eu achava.

— Boa noite... — disse a mulher, eu ainda encarava seus sapatos. Saltos finos na cor preta. Se aquilo era Dinah brincando, eu entraria na brincadeira. Abri o papel na minha mão e vi escrito "5° (mulher! não falar e nem olhar pra ela)" então ignorei a moça. — É uma bela noite, não?

Ela tentou puxar assunto mais uma vez e eu só a ignorei. Iria seguir com o ritual e queria ver a cara da Dinah quanto eu lhe contasse que tinha perdido a graça quando ela colocou alguém no elevador comigo. Muito obvio. Só apertei o botão do 1° andar e esperei ele me levar ao térreo, a mulher do meu lado não apertou nenhum botão e nem tentou mais falar comigo. Eu continuava encarando seus pés, talvez essa garota estivesse pensando que eu era tímida ou mal educada mas eu não ligava mais, eu só queria gritar muito com a Dinah e depois dar uma gargalhada muito alta, essa tinha sido a melhor pegadinha de todas. Valeu a minha noite e com toda certeza me tirou do tédio.

— Acho que o elevador deu algum problema porque estamos subindo... — disse a garota. A ignorei, pode continuar com o teatro o quanto quiser, eu não ligo mais. Ela parou do meu lado e eu só queria sair dali, estava começando a me sentir meio claustrofóbica. A única coisa de errado é que quando paramos e a porta do elevador finalmente abriu novamente e eu já estava pronta para sair eu notei uma plaquinha escrito "10°". Deveríamos estar no 1° andar.

A garota de salto ao meu lado deu uns passos para trás e deu risada. Ela riu bastante e sua voz era tão cortante quanto uma faca agora. Aquilo me arrepiou por inteira, parecia a gargalhada da Dinah.

— Certo, isso não tem mais graça. Merda. — apertei o botão do andar onde ficava o meu apartamento e nada da porta se mexer, apertei de novo e de novo e de novo. Nada aconteceu. Eu sentia um pavor de novo por não saber o que estava acontecendo. Tentei outros botões e a porta nem se mexia, não sabia como a Dinah tinha feito aquilo mas eu não queria mais ficar naquela brincadeira. A menina parou de rir porque provavelmente notou o meu desespero. Ótimo, ela ia mostrar um pouco de compaixão e me explicar como a menina que deveria ser minha melhor amiga tinha feito aquilo.

— Bem vinda ao meu mundo, Jaguar. — a garota disse com a sua voz que era muito firme e cortante.

Jaguar?

O ritual do elevadorOnde histórias criam vida. Descubra agora