Capítulo 9

44 13 47
                                    

SE AMARES ALGUÉM, DIGA

Minha doce hermanita,

eu não sei se já viveu seu primeiro amor e sofreu sua primeira desilusão amorosa, mas acho que talvez saber sobre a primeira vez que amei de verdade, com todo meu coração, te ajude na sua vida amorosa. Se não, ao menos terá mais de mim contigo, e espero que isso faça brotar um sorriso em seu rosto, mi capullo de rosa.

Depois de sofrer duas desilusões de corazón, eu acabei decidindo que não gostaria de mais nenhum garoto por um bom tempo. E acredite, Clarita, essa foi uma decisão difícil, afinal, eu era uma romântica incurável que vivia dentro de romances e contos de fadas, por isso considero que esse tenha sido meu maior feito até então.

Foi no início de 2013, mais madura para entender que os corações partidos que tive não foram culpa de ninguém, que eu me permiti dar uma chance ao melhor amigo de Vinicius.

Mário Simões morava em Campinas e era um ano mais velho. Ele e Vini se conhecia desde a infância - falo no passado porque é mais simples assim, mas eles se conhecem, presente, pois ambos vivem, graças a Deus -, da época em que Vinicius morava com a mãe no subúrbio da cidade vizinha, antes dele e a mãe virem morar com a tia Marília.

Mário e eu nos falamos muito por telefone antes de nos veremos pela primeira vez, conversávamos sobre nossos gostos, objetivos de vida, planos para o futuro que ambos tinham medo de não conseguirmos realizar, afinal, Mário vinha de uma família humilde e com poucos recursos para algo que não fosse comida, higiene e estudo básico para os três filhos.

E eu era realista. Nossa família também era pobre. Nosso pai trabalhava em um caixa de supermercado e a mamãe dava aulas para o fundamental em uma escola próxima a nossa casa. Os dois ganhavam apenas o suficiente para manter a família, que consistia aos dois e nós duas, porque, como você sabe, hermanita, nascer-te exatamente na virada de 2012 para 2013, às 00h01min, no dia 1 de janeiro.

A verdade, mi capullo de rosa, é que na infância era divertida morar na casinha miúda em frente à quadra, só que depois de maior, isso passou a ser um aviso de que eu precisaria me esforçar mais para ter algo e que, mesmo assim, talvez não tivesse.

Nunca poderei reclamar do que nossos pais nos deram. Tínhamos amor, comida, estudos, camas limpas e roupas para usar nos dias frios. Havia pessoas em situações piores, enfrentando problemas maiores.

Enfim... Voltando ao Mário. Eu não imaginava que as coisas com ele fossem ser tão... naturais. Justamente com o rapaz que morava a mais de duas horas de casa.

Construímos uma amizade virtual, regada a cantadas entre risadas e ligações longas pela madrugada a dentro, o gostinho de "será que poderíamos dar certo?" ali, sempre nos rodeando. E foi aí, entre conversas e vindas e idas dele de Campinas para Sorocaba, que eu me peguei apaixonada pelo rapaz que fazia meu coração saltitar toda vez que sorria. E ele sorria muito.

Nosso primeiro beijo foi na praça de alimentação de um shopping qualquer. O lugar não importava. Só importava que estávamos juntos.

Eu lembro do calor da palma da mão dele tocando meu rosto. Lembro dos dedos dele afastando meu cabelo para trás da minha orelha. Seu rosto se aproximando do meu e eu sentindo que ia desmaiar.

Arfei e fechei os olhos, esperando o contato dos seus lábios com os meus. Sua mão se embolou nos meus cabelos, me trazendo para mais perto, e enfim eu senti o gosto de chocolate do sorvete que tínhamos tomado a alguns minutos. E o gosto de morango do meu se misturou ao sabor dele.

Não nos beijamos como fome, como quem está no deserto e procura água e comida, nos beijamos com carinho, prometendo que haveriam outros e outros e mais outros encontros como aquele. E houveram.

Mário se dividia entre Campinas e Sorocaba e eu ia até sua casa sempre que era possível. Sua família me adorava, me adoraram antes mesmo de que soubesse que tínhamos algo, embora fosse pouco discreto uma amiga de outra cidade fazer visitas tão frequentes.

Acho - tenho certeza - que todos sabiam, inclusive nossos pais, mas se fingiam de cegos para que pudéssemos viver nossa pequena aventura, desfrutando da juventude como se fôssemos imortais misteriosos que não devem ou temem a nada, e eu, que achava temer entregar meu coração para alguém novamente, me vi ali, amando. Deixe-me contar como fui surpreendida durante o que deveria ser mais uma ida comum ao cinema.

― Você quer com ou sem manteiga dessa vez? ― eu perguntei, fitando a pipoqueira. Apontei para a com manteiga ao escolher a minha. ― Eu quero uma com manteiga e uma... Mário, quer com ou...

Me calei assim que virei para trás e o encontrei ajoelhado, com uma caixinha nas mãos. Acabei dando um passo vacilante para trás, um tanto confusa e assustada.

Era uma etapa importante que estava acontecendo na frente de desconhecidos que eu nunca mais iria ver na vida, que nós nunca mais iríamos ver.

O que Mário estava fazendo, afinal?

Estava fazendo o que eu sempre sonhei, pedindo-me em namoro na frente de desconhecidos que nunca mais veríamos na vida.

Por que estava reagindo tão mal?

Acho que o medo de estar sonhando era o motivo, porque eu queria aquilo, de todo meu coração.

Senti meus ombros relaxarem aos poucos e sorri, quase rindo da expressão de pavor cravada no rosto do rapaz que eu amava.

― Estou fazendo algo errado? ― ele indagou, cochichando.

― Sabe que sou muito nova para casar, certo? ― brinquei, rindo e mordendo os lábios como uma típica adolescente apaixonada. Mário riu, seus dezoito anos estampados no seu rosto e na pele amendoada.

― Poxa, eu contava que seriam marido e mulher no pôr do Sol. ― Mário riu, encarando-me.

Estava perdidamente apaixonado, dava para ver no brilho que refletia em seu olhar, no sorriso que parecia não descolar do rosto, mas estava ali, indo e voltando, em frações de segundo, entre uma respiração ou outra, o nervosismo e a espera pelo sim ou o não fazendo suar sua nuca e suas pernas tremerem - algo que ele me contou depois.

― Não vai rolar uma declaração melosa, bem estilo filme adolescente? ― Encostei no balcão, sorrindo. Mário riu, balançando a cabeça.

― Ok, Julieta. Então ― Coçou o queixo, a caixinha ainda na mão direita ―, eu sou só um cara de dezoito anos que te ama muito, que ama o seu sorriso e a maneira como rir com os olhos quando está verdadeiramente feliz, então, se você disser sim hoje, eu prometo que vou continuar amando você rir com os olhos até o dia que permitir que seja eu o sortudo que vai te ver fazer isso. Aceita ser minha namorada?

Eu ri, me desgrudando do balcão e ajoelhando para beijá-lo. As pessoas ao redor, que acompanhavam o desenrolar da cena, aplaudiram e assobiaram, completando o desfecho de filme adolescente.

Nós dois sorrimos, achando graça de tudo aquilo, e, confesso, eu amei cada detalhe, até mesmo a simplicidade do ato.

― Você é maluco ― murmurei em sua boca.

― Por você. ― Ele sorriu e me beijou.

Não há bem como terminar essa carta, então apenas lhe deixo um conselho: se amares alguém, diga, sem temer a rejeição, porque ela pode vir, mas também pode ser o começo de uma história bonita. E os melhores livros foram feitos por corajosos, por isso, quando viver seu primeiro grande amor, escreva-o com coragem, mi hermana.

De sua hermanita,

Julieta.

As agridoces lembranças de Julieta (CONCLUÍDA)Onde histórias criam vida. Descubra agora