O manicômio

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Baseado em fatos reais

Autora Eli Souza

Quando as enfermeiras trancaram a porta, me virei e fiquei na ponta dos pés olhando pelo pequeno quadrado com grades que tinha na porta.
Depois de ter tomado o eletro choque; eu estava mais calma; tão calma, que não condizia com o horror que eu estava passando.

Antes de ir para a missa, eu não havia tomado café, e como saí da igreja direto para o hospital , eu também não havia almoçado. Estava com fome.  Fiquei agachada com o rosto sobre os joelhos por um bom tempo. Quando eu me ergui, todas as crianças alí estavam olhando para mim. Muitas delas ainda de berço. A maioria ,com alguma deficiência física. Uma delas , era um garoto negro com uma deficiência na perna esquerda. Uma perna era menor que a outra.
Ele se aproximou e perguntou o meu nome, eu não respondi. Logo uma das crianças do berço , começou a chorar. Ele foi até ela e a pegou no colo. A criança devia ter uns 4 anos de idade. Ele tirou do bolso de sua bermuda rasgada , uma pedacinho de pão, e deu ao garotinho. Ao ver , lembrei-me da fome que eu sentia. Logo lembrei do meu pai, de minha casa e da minha vida. Levantei-me do chão e fui em direção a janela do quarto. Segurei nas grades e gritei por socorro querendo sair dalí. Logo sinto , por trás de mim , alguém que com suas mãos tapou a minha boca. Era aquele garoto e disse ao meu ouvido:
_Fique quieta. Eles vão vir aqui e vão te castigar.
Lembrei-me do choque e da sensação horrível que isso causava. Fiquei quieta e ele me soltou. Comecei a chorar e ele me abraçou.
_Chore. Chore o que você conseguir chorar. Desabafar, vai te fazer se sentir menos pior depois.
_Estou com fome.- disse a ele enxugando minhas lágrimas.
Ele tirou o pão do seu bolso, e colocou em minha mão.
_Essa é a única comida que você terá até de noite.
Aquele pão , mais parecia uma pedra ,de tão duro.
Tive que comer, porque eu já estava sentindo tontura de tanta fome. De tão duro , minha gengiva acabou sangrando. Mesmo comendo, ainda me senti fraca até de noite.
Na hora da janta, a porta foi aberta, e a enfermeira pediu que fizéssemos uma fila. As crianças maiores, pegaram as menores e fomos para o refeitório. Lá foi servido um mingau salgado de fubá. E depois foi entregue uma banana para cada criança. Eu comecei a descascar a minha, e aquele garoto me impediu.
_ Não coma agora. Mais tarde você vai sentir fome, e a única coisa que terá , é essa banana.
Então guardei no bolso do meu uniforme (A camisola azul do hospital).
Fomos novamente em fila para o quarto.

As noites de Barbacena ,eram frias. E naquele quarto, não haviam cobertores suficientes para todas as crianças. Então os cobertores eram rasgados no meio, e divididos entre eles. Eu não tinha um agasalho; estava tremendo de frio. E aquele garoto se aproximou e se deitou ao meu lado,  dividindo o seu pedaço de cobertor.
Como também não havia camas suficientes, muitos de nós dormíamos no chão.
Eu chorava baixinho e pensava no que meu pai iria fazer , quando chegasse em casa; e não me encontrasse.
Eu tinha esperanças, de que logo meu pai descobriria onde eu estava; e viria me buscar.pensei na promessa que ele me fez, de que me protegeria de tudo e de todos. Logo ele colocaria Ana Paula para fora de casa, e voltaríamos a ser uma família, meu pai e eu. Mas por muito tempo eu iria esperar e ele jamais apareceria. E naquele lugar de tanto sofrimento, eu encontraria uma nova família.

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