Capítulo 28: Em Serviço

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  Encerrada a prece coletiva, ao crepúsculo, Tobias ligou o receptor, a fim de ouviros Samaritanos em atividade no Umbral.Justamente curioso, vim a saber que as turmas de operações dessa natureza secomunicavam com as retaguardas de tarefa, em horas convencionais.Sentia-me algo cansado pelos intensos esforços despendidos, mas o coraçãoentoava hinos de alegria interior. Recebera a ventura do trabalho, afinal. E o espírito deserviço fornece tônicos de misterioso vigor.Estabelecido o contato elétrico, o pequenino aparelho, sob meus olhos, começou atransmitir o recado, depois de alguns minutos de espera:- Samaritanos ao Ministério da Regeneração!... Samaritanos ao Ministério daRegeneração!... Muito trabalho nos abismos da sombra. Foi possível deslocar grandemultidão de infelizes, sequestrando às trevas espirituais vinte e nove irmãos. Vinte e doisem desequilíbrio mental e sete em completa inanição psíquica. Nossas turmas estãoorganizando o transporte... Chegaremos alguns minutos depois da meia-noite... Pedimosprovidenciar...Notando que Narcisa e Tobias se entreolhavam fundamente admirados, tão logosilenciou a estranha voz, não pude conter a pergunta que me desbordava dos lábios:- Como assim? Por que esse transporte em massa? Não são todos espíritos?Tobias sorriu e explicou:- O irmão esquece que não chegou ao Ministério do Auxílio de outro modo.28Em ServiçoConheço o episódio de sua vinda. É preciso recordar, sempre, que a Natureza não dásaltos e que, na Terra, ou nos círculos do Umbral, estamos revestidos de fluidospesadíssimos. São aves e têm asas, tanto o avestruz como a andorinha; entretanto, oprimeiro apenas subirá às alturas se transportado, enquanto a segunda corta, célere, asvastas regiões do céu.E deixando perceber que o momento não comportava divagações, dirigiu-se aNarcisa, ponderando:- É muito grande a leva desta noite. Precisamos tomar providências imediatas.- Serão necessários muitos leitos! - murmurou a serva algo pesarosa.- Não se aflija - respondeu Tobias resoluto -, alojaremos os perturbados noPavilhão 7 e os enfraquecidos na Câmara 33.Em seguida, levou a destra à fronte, como a ponderar algo muito sério, eexclamou:- Resolveremos facilmente a questão da hospitalidade; o mesmo, porém, não sedará no concernente à assistência. Nossos auxiliares mais fortes foram requisitados paragarantir os serviços da Comunicação nas esferas da Crosta, em vista das nuvens de trevaque ora envolvem o mundo dos encarnados. Precisamos de pessoal de serviço noturno,porquanto os operários em função com os Samaritanos chegarão extremamente fatigados.- Ofereço-me, com prazer, para o que possa aproveitar - exclameiespontaneamente.Tobias endereçou-me um olhar de profunda simpatia, mesclada de gratidão,fazendo-me experimentar cariciosa alegria íntima.- Mas está resolvido a permanecer nas Câmaras, durante a noite? - perguntou,admirado.- Outros não fazem o mesmo? - indaguei por minha vez - sinto-me disposto eforte, preciso recuperar o tempo perdido.Abraçou-me o generoso amigo, acrescentando:- Pois bem, aceito confiante a colaboração. Narcisa e os demais companheirosficarão também de guarda. Além do mais, mandarei Venâncio e Salústio, dois irmãos deminha confiança. Não posso permanecer aqui, de plantão noturno, em vista decompromissos anteriores; no entanto, caso necessário, você ou algum dos nossos mecomunicará qualquer ocorrência de maior gravidade. Traçarei o plano dos trabalhos,facilitando quanto possível a execução.E descortinou-se campo enorme de providências. Enquanto cinco servidoresoperavam em companhia de Narcisa, preparando roupa adequada e petrechos deenfermagem, eu e Tobias movíamos pesado material no Pavilhão 7 e na Câmara 33.Não poderia explicar o que se passava comigo. Apesar da fadiga dos braços,experimentava júbilo inexcedível no coração.Na oficina, onde a maioria procura o trabalho, entendendo-lhe o sublime valor,servir constitui alegria suprema. Não pensava, francamente, na compensação dos bônushora,nas recompensas imediatas que me pudessem advir do esforço; contudo, minhasatisfação era profunda, reconhecendo que poderia comparecer feliz e honrado, peranteminha mãe e os benfeitores que havia encontrado no Ministério do Auxílio.Ao despedir-se, Tobias voltou a abraçar-me e falou:- Desejo a vocês muita paz de Jesus, boa noite e serviço útil. Amanhã, às oitohoras, você poderá descansar. O máximo de trabalho, cada dia, é de doze horas, masestamos em circunstâncias especiais.Respondi que as determinações me enchiam de sincero contentamento.A sós com o grande número de enfermeiros, passei a interessar-me pelosdoentes, com mais carinho. Dentre as figuras de auxiliares presentes, impressionou-me abondade espontânea de Narcisa, que atendia a todos, maternalmente. Atraído pela suagenerosidade, busquei aproximar-me com interesse. Não foi difícil alcançar o prazer desua conversação carinhosa e simples. A velhinha amável semelhava-se a um livro sublimede bondade e sabedoria.- Mas, a irmã aqui trabalha há muito? - perguntei, a certa altura da palestraamistosa.- Sim, permaneço nas Câmaras de Retificação, em serviço ativo, há seis anos ealguns meses; entretanto, ainda me faltam mais de três anos para realizar meus desejos.Ante a silenciosa indagação do meu olhar, falou Narcisa amavelmente:- Preciso um endosso muito sério.- Que quer dizer com isso? - perguntei interessado.- Preciso encontrar alguns espíritos amados, na Terra, para serviços de elevaçãoem conjunto. Por muito tempo, em razão de meus desvios passados, roguei, em vão, apossibilidade necessária aos meus fins. Vivia perturbada, aflita. Aconselharam-me, porém,recorrer a Ministra Veneranda, e nossa benfeitora da Regeneração prometeu queendossaria meus propósitos no Ministério do Auxílio, mas exigiu dez anos consecutivos detrabalho aqui, para que eu possa corrigir certos desequilíbrios do sentimento. No primeiroinstante, quis recusar, considerando demasiada a exigência; depois, reconheci que elaestava com a razão. Afinal, o conselho não visava a interesses dela e sim ao meu própriobenefício. E ganhei muito, aceitando-lhe o parecer. Sinto-me mais equilibrada e maishumana e, creio, viverei com dignidade espiritual minha futura experiência na Terra.Ia manifestar profunda admiração, mas um dos enfermos próximos gritou:- Narcisa! Narcisa!Não me cabia reter, por mera curiosidade pessoal, aquela irmã dedicada,transformada em mãe espiritual dos sofredores.  

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