Capítulo 20

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Elena não conseguiu pregar os olhos um segundo na noite passada. Já era quase meio dia, as olheiras haviam aumentado, a fraqueza intensificado e já nenhuma lágrima era capaz de sair daqueles olhos. Era como se a mulher tivesse ficado fria e vazia. Olhava para o nada, quieta, como se não existisse sentimento algum ali dentro... mas ela sabia bem que existia.

Amélia leva todos para a mesa e força Elena se alimentar, afinal, ela carrega um filho e está totalmente fraca e pálida. A casa estava em total silêncio. Ninguém era capaz de proferir uma palavra e mesmo se fossem, não encontrariam o que dizer.

Marco havia atendido o pedido da filha na noite passada e ordenou a continuação das buscas pelo corpo carbonizado. Até aquela hora, nenhuma notícia havia sido dada e as esperanças não existiam mais, já havia sido descartado todas e qualquer chance de que ele ainda estivesse vivo.

- Cancele as buscas. - Elena disse.

- O que? - Marco não entendeu sua filha.

- O que ouviu. - foi fria.

- Você não pode. - Carmen disse.

- Nós que não podemos continuar aqui, de braços cruzados, esperando uma notícia que não vai aparecer. Ninguém aqui dormiu esperando alguma coisa, mas nós sabemos que não tem essa coisa. - frizou a última parte.

- Continue as buscas, Marco. Te peço. - Carmen suplicou. Era o seu filho e nada a faria desistir.

- Não pensem que estou fazendo isso porque não quero encontrá-lo, porque Deus sabe do sofrimento que está aqui dentro - bate no peito e uma lágrima escorre -, mas o que eu não posso é matar a mim e o meu filho agora, alimentando esperanças e achando que aquela porta vai se abrir a qualquer momento. Eu queria, Carmen, como eu queria encontrá-lo... - põe as mãos entre seus próprios cabelos, já não sabe mais o que fazer.

Elena não queria cancelar, era sua única forma de encontrá-lo, mas já não tinha forças para esperar. Suas esperanças foram todas jogadas no lixo. Eram mais de vinte e quatro horas de buscas e se nenhuma notícia havia sido dada até aquela hora, não adiantava mais esperar.

Sequer teria a oportunidade de enterrar o esposo.

Levantou-se da mesa e retornou a sala. A todo momento ela alisa a barriga e tenta imaginar como vai ser ver aquela casa vazia, sem o seu marido. Não sabe ser mãe, mas ele sabia ser pai. Esperava que ele a ajudasse, mas agora estava sozinha.

- Obrigada, meu amor. Eu prometo cuidar bem do nosso bebê. - falou enquanto olhava pela janela e alisava a barriga.

Carmen se senta ao sofá, um pouco distante da nora.

- Meu filho te amava tanto, Elena. Tanto.

A mulher sorriu, ainda de costas para a sogra.

Também o amava.

Tanto que doía.

- Eu também. Acho que sempre o amei. - virou-se para ela, que enxugava as lágrimas.

- Ele estava feliz com a gravidez... sempre quis ser pai.

Elena sorriu e viu sua mãe vindo com mais comida para ela. Negou com a cabeça, mas foi obrigada a aceitar. Sabia que apesar de tudo, tinha que se cuidar por alguém. Viu seu pai ao telefone e imaginou que ele estivesse fazendo o que lhe foi pedido, pois já não existiam mais esperanças.

A campanhia tocou e todos se assustaram. Elena não esperou por Susan, largou a comida na mesa de centro e foi para a porta, abri-la. Eram Benito, Oto, Roque, Lilow e Leoncio. Não pediram licença, apenas adentraram a casa.

- Marco! - o chamaram.

Sequer cumprimentaram a viúva. Mas o que era de se esperar de um grupo de brutamontes insensíveis como aquele?

Marco estava no repartimento entre a sala e a cozinha. O grupo de dirigiu até lá sob os olhares de Henrique, que nunca aprovaria isso. Benito ficou e foi até Elena. Ele era mais velho e cansou de ver as esposas ficarem sem seus maridos. Hoje ele já não viajava em missões como antes, mas sabia a adrenalina que era.

- Meus pêsames, Elena. Queria te dizer que é normal isso acontecer, mas você é tão jovem pra ouvir isso. Fique bem, querida. Ele gostava muito de você e tenho certeza que a queria feliz.

Benito recorda-se da vez em que Elena foi atacada e em como Rico reagiu. Ele entendia. Apesar de ter suas amantes, sempre iria preferir sua esposa... pois era quem o esperava, a todo instante, nos quase trinta anos em que viveu nas missões.

A mulher agradeceu com um leve sorriso nos lábios e Benito procurou se juntar aos outros na conversa. Carmen e Henrique se perguntavam o que eles estavam falando e Elena, sem nenhum pudor, se juntou a eles. Logo foi repreendida com olhares. Ali não havia espaço para ela.

- Não adiantam me olharem dessa forma. Ouvirei tudo. É sobre meu marido, eu quero saber.

- Não há nada que você não saiba. - Lilow respondeu.

- Ótimo. Então ouvirei novamente.

Elena estava criando forças e não sabia de onde. Mas precisava, porque entendia que dali pra frente, era apenas ela e seu bebê e não havia outro para protegê-los.

- Eles estavam perguntando quem havia ordenado a continuação das buscas. - Marco explicava. Entendia a dor da filha... ou pelo menos tentava.

- Fui eu. - disse com propriedade.

- Eu ordenei que parassem porque queria os meus soldados aqui para que nos protegessem se houvesse algum ataque, já que a explosão é um ótimo aviso de que algo está para acontecer. - Oto, o responsável pelos soldados disse.

- Ou já aconteceu, não é?! Meu marido está morto e eu não estou nem aí para a segurança de ninguém, porque ninguém se importou com a segurança dele.

- Não seja mimada, menina. Vocês sempre tiveram os melhores seguranças. - Leoncio se pronunciou em defesa de Oto.

- Abaixe o tom ao falar comigo, seu porco sujo. Você está sob o meu teto e mais uma frase sua, eu estouro a sua cabeça aqui mesmo.

Leoncio sorriu. Era adulto demais para levar em conta a frase de uma viúva dolorida e ainda por cima, jovem demais. Olhou para Marco, que negava com a cabeça, pedindo para que ele não continuasse com aquela discussão boba e que não os levariam a lugar nenhum. Não continuou porque não tinha saco para jovens rebeldes, mas poderia e tinha coragem, de naquele momento, mostrar quem era capaz de estourar a cabeça de quem ali.

Elena estava completamente fora de si. Estava expondo todo o seu ódio pela máfia. Sempre odiou, mas nunca foi preciso sair gritando aos quatro cantos do mundo, mas hoje... hoje ela não estava com saco de olhar para a cara daqueles vermes, vendo que a única preocupação deles eram com seus soldados. E o seu marido?!

Marco queria parar a filha, mas quis deixar, ao menos uma vez na vida, que ela decidisse o que falar ou fazer. Apesar de tê-los ainda vivos, sabia que ela se sentia sozinha. Viu seus homens retornarem a porta de saída. Eles se despediram de Amélia, a considerada primeira dama e de Carmen e Henrique, que ficaram totalmente desajeitados com a presença e energia que aquele povo emanava.

Ao saírem, Marco abraçou a filha como se dissesse: você é tão forte. E ela era. Seu filho... ou filha, lhe dava forças. Seu amor por Rico lhe dava forças. A presença dele sempre estaria naquela casa e aquilo tudo lhe dava forças.

Ele seria para sempre o seu amor.

DONO DE TUDO - Trilogia: Guerra por Amor #1Onde histórias criam vida. Descubra agora