Capítulo 19 - Sub-Reino

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Daina não demorou muito a retornar com meu café da manhã em quantidade medidamente duplicada, para que me acompanhasse.

A serviçal teve um pouco de dificuldade para aceitar ocupar um lugar na mesa redonda de meu quarto. Daina tinha uma personalidade muito metódica e pouco flexível:

- Diga-me, o que a trouxe até aqui. – questionei.

Por um instante ela me encarou, provavelmente confusa com minha pergunta íntima:

- Não precisa responder se não se sentir a vontade para tal. – emendei.

- Admito que poucas pessoas me fizeram essa pergunta, até mesmo por não terem interesse nas histórias de uma simples serviçal.

- Sendo bem honesta, você está bem mais próxima de governanta, parece que nada neste castelo se organiza sem você estar por perto.

- Procuro sempre fazer meu melhor. – ela sorriu por educação. – Mas se perguntar a outros serviçais, saberá que não estou aqui a tanto tempo, talvez poucas décadas.

- Você compreende que décadas são um longo tempo para mim...

- Sim, senhorita Agatha, infelizmente para nós é como se o tempo passasse tão lento quanto pode.

- Sinto muito. – respondi em solidariedade.

- Não sinta, nenhuma alma encontrou o caminho para este lugar sem desejar, todos estamos aqui por uma escolha e não por destino.

- E quais caminhos da vida te trouxeram tão longe?

- Nada muito distante do que a manteve aqui. – ela me encarou com um brilho diferente no olhar.

Sobrevivência, pensei em silêncio.

Daina não parecia muito disposta a falar sobre este assunto, então comecei a questionar sobre seus gostos alimentícios e nosso café da manhã se limitou a isso e a crítica a vestidos e sapatos incômodos:

- Honestamente, senhorita, devo admitir que cheguei me alegrar em silêncio por sua insistência no uso de calças. – ela sorriu. – Quem sabe a Estrela da Manhã não se comove com seu senso de moda prática e estende a possibilidade ao reino.

- Pensei que gostasse dos vestidos.

- Apenas sigo as ordens que me são direcionadas, meus gostos particulares não devem ser levados em consideração.

- Não seja radical, o que uma calça de couro e um par de botas pode fazer de tão mal?! – tentei fazê-la rir.

- Creio, senhorita, que se for para que eu quebre qualquer ordem o motivo deva ser maior que roupas e acessórios, mas relacionados a afeição e vidas.

Fiquei em silêncio com a resposta da serviçal.

Por mais que se encaixasse no contexto, era nítido que Daina estava me dizendo algo além da quebra de um mero protocolo:

- Perdoe-me se fui indelicada. – ela emendou. – Posso retirar a louça?

- Claro. – respondi, ainda perdida em pensamentos.

Enquanto ela recolhi os pratos e talheres sujos, tornei a lembrar da lista que Lúcifer havia deixado:

- Você também poderia providenciar um caderno, estou pensando em retomar um hábito que adquiri entre os caçadores de escrever meus pensamentos no papel.

- Certamente, senhorita.

Assim que Daina deixou o quarto, abri a gaveta de meu criado mudo e procurei os pedaços de papel que havia escondido entre outras cartas de Peter, Dulce e Ester.

Imortal - O RetornoOnde histórias criam vida. Descubra agora