O ruído dos talheres soava irritante de tão alto em meio aquele silêncio. E o silêncio nem ao menos era a pior parte. A atmosfera pesava entre as três pessoas sentadas à mesa em sua sala de jantar, mas para Adrien a impressão era de que somente ele sentia o clima tenso. Afinal, o pai e o namorado agiam com a mesma calma fria durante o que deveria ser o primeiro encontro entre os dois, mas mais parecia ser o centésimo.
Desta vez, nem Nathalie os acompanhava durante a refeição, e eram apenas eles sozinhos no cômodo alto e comprido. Não sabia bem o que pensar da reação do pai à presença de Félix ― Gabriel Agreste não parecera incomodado pelo parceiro de seu filho ser um homem. No entanto, também não recebeu-o de maneira positiva, ainda relutante desde que Adrien contara-lhe a respeito do rapaz e de suas condições, diante da insistência do pai em conhecê-las.
Ao menos não expulsara seu namorado logo que chegara como já fizera diversas vezes, talvez porque vestindo terno e com os cabelos loiros penteados elegantemente para trás Félix exteriorizasse toda a sua conduta responsável. Depois de uma apresentação curta, seguiram logo para o jantar e felizmente o namorado conhecia bem as regras de etiqueta para apaziguar a implicância do senhor de idade.
― Não está com fome, Adrien? ― comentou Gabriel, interrompendo as divagações do filho. ― Mal tocou na comida.
― Eu só estou... um pouco nervoso.
― Por que estaria nervoso? ― Desta vez foi Félix a perguntar. Não era possível que eles não percebessem.
― Hm. Vocês dois são até que parecidos ― comentou, para arrepender-se logo em seguida.
Na verdade, não era aquilo o que queria dizer. Haviam semelhanças entre os dois, mas as diferenças eram tão significativas que mudavam completamente sua percepção a respeito dos dois. Félix permitira a sua aproximação depois de muita insistência, enquanto o pai nunca lhe deu o carinho de que mais precisava desde que a mãe partira. E, ao contrário do pai, o namorado nunca restringiu sua liberdade para "mantê-lo seguro dos males do mundo".
Os dois também pareceram incomodados demais com a comparação e, mais que nunca, Adrien desaprovou sua bendita mania de abrir a boca. Contudo, Gabriel aproveitou-se da deixa para, enfim, introduzir o assunto que os reunira ali naquela noite de sexta-feira. Inclusive, daquela vez ele até mesmo havia adiado um compromisso para recebê-los naquele horário.
― Pois bem, Félix.
― Sim, senhor Agreste?
― Imagino que Adrien já tenha-lhe dito a respeito dos meus parâmetros com relação a ele ― supôs, educado demais para o tom da conversa.
― Sim, eu soube que sua lista de critérios é bem extensa. ― Era desconfortável ouvi-los com uma cordialidade tão afetada.
― E você acha que encaixa-se entre os requisitos mínimos dessa lista?
― Na verdade, não ― admitiu e a sinceridade soou quase bruta depois de tanta artificialidade.
― Ora, então o que faz aqui nesta mesa?
― Estou aqui porque ele me escolheu.
― Acha que isso basta? ― Gabriel arqueou as sobrancelhas diante do atrevimento.
― Ao menos para ele, sim ― reafirmou a escolha de Adrien. ― Até porque é só a opinião dele que importa.
― Pai ― censurou o jovem. ― Já falamos sobre isso. Nenhum de nós veio aqui para mudar de ideia.
― Corajoso da sua parte assumir que tem algum poder de decisão, meu filho.
Provavelmente com isso pretendia intimidar a Félix assim como intimidava-o. Até porque era ligeiramente constrangedor ser o motivo de uma discussão em família como a que desenrolava-se. No entanto, Gabriel não contava que a resposta do rapaz às tentativas de amedrontá-lo só faziam dele mais seguro e arrogante e, por que não, também abusado, porque conhecia bem o jogo em que estava inserido. Foi categórico ao responder:
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Sadique | Chat Noir | Yaoi
أدب الهواةChat Noir encontrou alguém para compensar a solidão e o tédio de suas noites. Um rapaz, assim como ele. Difícil de lidar, divertido de provocar e delicioso de provar. "― Sei que no fundo gosta de mim. ― Baseado no quê? No desprezo ou na indiferença...