Farrapo Humano

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Sabe, eu sempre fiz
fé nessa sua
loucura. Sempre fiz
fé nesses arrepios que me
percorrem o corpo. E
mesmo diante de pessoas
fardadas batendo os
dedos, lhe escrevo poemas.

Fera para a beleza
disso. Cinco minutos de
total indisponibilidade e
um caderno pequeno
apoiado nas mãos
com uma lapiseira
preta (ora vinho)
apoiando todo o
meu corpo. Essa
lapiseira é o meu
guarda-chuva e
você é a minha
corda bamba.

Bamba sambando,
chapéu branco, ginga,
todo carnaval como
santa ceia com todos
sabendo da morte de Cristo.

Nada importa sem você.

Me disseram que a
chuva deu prego
agora de tarde e
isso me encheu de
melancolia.

Ontem tinham alguns
rockeiros no bar que
eu sempre vou e
começou a tocar um
samba rock e todos
eles sabiam cantar. Eles
cantavam de uma mesa e eu
cantava sozinho de
outra. Uma solidão de
suicídio com
caco de vidro.

Recorro novamente aos
mesmos versos antigos e
velhos cantores, sem a
pretensão de ver o que
não se via. Sem raspar
cores para o musgo
vir. Querendo falar de
amor morrendo com
esse mesmo velho
cheiro de mofo.

Queria tanto sentir
seu perfume! Queria tanto sem
meias palavras. Sem
meias linguas, nem
meios lábios. Sem
uma peça de roupa, nem
meias. Sem pudor. Poder
pintar essa parede
verde
feia
com todas as cores
que derramaremos nesses
velhos
outros
lencóis com furos incontáveis.

Ah, tanta força disponho
para essa melancolia! Tanta
avidez em ser ruim! e
ser miserável!

Mas, quando me
vem os dois dias de
respiro (pois estava
sufocando), vivo.

Peço que tenha paciência
para esse poema que
tanto anseia. Os dias
estão corridos e a
vida está curta, mas
meus pensamentos sempre
voam em direção à
mesma quadra e ao
mesmo lote desse
estranhamente lindo país.

E o poema pula
mais algumas
páginas. Entre
relatórios e
procedimentos eu
ainda te
respiro.

Respiro a poesia e
respiro o ar que
sai de seus pulmões.

Respiro com maior
bravura as letras
que não quer me
mostrar. Todo esse
desejo reprimido
está fazendo mal à
minha cabeça. Dores
nos olhos e tontura
são normais se as
comparo com a
vontade compulsiva de
morrer. Morrer apenas
para renascer como a
mais feia, que seja,
flor do seu jardim.

Falta uma conclusão
para tudo o que
sinto. Qualquer
frase de efeito para
me ligar ainda
mais a essas
generalidades que
estou fadado a
viver sem você.

Mas, depois do
almoço, meia
dúzia de palavras
trocadas já se
fazem suficientes
para pôr conclusão,
sob norma, em toda
essa falsa mitigação
que carrega em
seus remédios naturais.

Natureza ImpostaWhere stories live. Discover now