Capítulo 30-Impulsiva.

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"Uma atitude errada pode estragar dias, meses, anos e momentos. Nem todo lápis vem acompanhado de uma borracha".

(Michael Brainy)

Luna

Depois de passar no ensaio das minhas meninas e receber os olhares marejados e tristes quando contei com o coração apertado sobre meu afastamento, digo que estarei de volta para a apresentação e que sempre estarei assistindo os vídeos dos ensaios na internet, nunca deixarei de manter contato, voltarei sempre que possível para revê-las. Damos nosso abraço em grupo, recebo muitos abraços individuais apertados.

Saio de lá e não me seguro, vou as lágrimas no carro. Sentirei saudade de todas elas, do carinho que recebi, mas entendo que não posso ficar esperando o pior acontecer para sempre. Instrui a nova professora para que ela saiba identificar os sinais de abuso de todos os gêneros.

Sigo para a consulta com minha terapeuta. Dou uma checada no espelho e coloco os ósculos escuros para esconder meus olhos inchados. Não estive com a Dra. Maíra ainda desde o recebimento do pendrive. Ela estava viajando como disse com antecedência. Não vim as consultas com o terapeuta que ficou responsável do meu caso nesse período de ausência dela, e sei que receberei uma chamada.

Aguardo minha vez na recepção. Já estive tantas vezes aqui que é um ambiente bem familiar. A porta do consultório é aberta e um homem sai agradecendo, a recepcionista pede para que eu entre.

– Olá. – sorrio timidamente me sentando no sofá.

– Luna Rochetti. Finalmente nos revemos.

– Dra. Maíra...

– Não, Luna. Eu não quero desculpas. Você não é mais a menina que comecei tratando, sabe de sua condição e o quanto você e todos a sua volta podem perder com seu descompromisso com o tratamento. Tive que viajar para tratar de uma preparação de morte materna, com uma criança de 6 anos cuja a mãe está em estágio terminal de câncer. A única coisa que deixei avisado quando fui viajar foi para que não faltasse as suas consultas, e o que o fez? Você faltou a cada uma delas. Agora corremos o risco de retroceder e consequências severas podem ocorrer.

– Ele apareceu. – deixo sair como sussurro.

Não preciso dizer quem é "ele", ela sabe. Sua expressão assume o espanto, mas ela retorna ao tom profissional.

– Como assim apareceu? Em sua porta?

– Não. Ele me enviou "a música" em um pendrive. E eu caí em um limbo, não saí do quarto por um bom tempo. Eu chorei. Muito até. O difícil agora tem sido parar de chorar. – sorrio secando as lágrimas que tentam escapar. – Mas estou melhor, eu... superei e decidi não dar o que ele quer. Minha dor.

– Alegra-me ouvir isso Luna. Fico até mesmo admirada.

Passo a próxima hora derramando sobre tudo, tentando entender o que me deu força. Chorar após anos sem sequer uma lágrima rolar, foi algo grande. Contei sobre minha mudança para São Paulo e foi aí que tivemos nosso atrito.

– Você quer minha opinião pessoal ou a professional?– olha-me impassível.

– Pode me dar as duas? Acho que já passamos da relação paciente e terapeuta há muito tempo.– digo sinceramente.

– É verdade. Hoje o sentimento que tenho por você é de mãe, mesmo que seja antiético, minha filha tem a sua idade, e é impossível não se comover com tudo o que aconteceu com você. Minha opinião profissional... Não posso te impedir, ainda que as circunstâncias do seu caso sejam diferentes de outros casos. Só posso recomendar outro terapeuta em São Paulo.

Ele Vai Ser MeuOnde histórias criam vida. Descubra agora