04 - GB (extra)

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— Cadê tua mãe? — o homem alto segurou meu braço

— Tá trabalhando, por que? — perguntei assustado

— Trabalhando? — perguntou confuso

— Uhum — murmurei puxando meu braço de volta

— E tu tá indo pra onde? — arrumou o cigarro na boca

— Pra escola — falei ajeitando a mochila

— E tu quer ser o que quando crescer? — perguntou rindo

— Piloto de avião — falei fazendo ele rir mais ainda — Mas não curto muito esse negócio de escola não — cocei a cabeça

E só não ir — balancei os ombros indiferente — Tu almoçou? — perguntou sentando na cadeira do bar

— Sim — respondi olhando os milhares de homens armados que tinha chegado

— Senta aí, tu não vai pra escola hoje não — o cara apontou pra uma cadeira vazia

— Mas a minha mãe vai — ele apontou pra cadeira novamente me interrompendo

— Depois eu falo com ela — falou

Meu primeiro contato direto com o Martins, eu tinha 12 anos e era filho único, depois desse dia eu não desgrudei mais dele, nunca ia imaginar que anos depois eu estaria fechando no tráfico com ele.

Nessa época eu nunca soube que ele e a minha mãe eram primos, antes da minha entrada pro tráfico, eu passei anos andando atrás dele, ele me tratava como se eu fosse um filho, me chamavam de chaveirinho.

O meu destino nunca foi o tráfico, a minha mãe era doméstica e meu pai um cuzão que foi expulso da favela pelo Martins, merecidamente já que o filho da puta batia na minha mãe.

Quando minha mãe partiu, eu me revoltei, fiquei sendo criado pela minha vó e comecei a escrever funk de facção, até então era só isso, mas aí eu comecei a gostar do bagulho de fato.

O Martins não me queria fechando com ele, foram várias as vezes em que eu pedi pra entrar e ele só negando, até que o Tico entrou de sub e me botou na segurança dele, lembro que o Martins na época ficou revoltado mas se acostumou e me trouxe pro lado dele do morro, onde estou até hoje.

Eu tinha 17 anos, era eu, LN, Maycon, FB e Jota os novinhos, nessa época só dava a gente, achávamos que éramos os picas, mas não éramos porra nenhuma, nem tiro dávamos, andávamos nem de pistolinha.

Desde daí, eu comecei a construir meus bagulhos, casa pica pra minha vó, arrumei uma mina pra ficar no meu porte, tudo do bom e do melhor pra ela e pra minha vó, mas o bagulho começou a desandar.

Quando eu me viciei? Eu não lembro muito, esse dia porra, é distante pra caralho da minha memória, mas lembro que foi após um baile, eu e a Tuane estávamos na onda máxima da maconha e ela fez uma carreira, depois daí é vago.

A dependência não me deixa largar, nem com uma maldita de uma overdose me fez parar, eu não conseguia, quando via já tava usando, por mais que eu tentasse, que eu visse meu estado, o estado péssimo que eu me encontro, ver tudo caindo na minha cabeça, a droga é uma das maiores destruições do ser humano.

Hoje, com a minha vó com câncer, com meu único alicerce quase indo embora, minha vida tá acabando, pra mim nada nessa porra faz mais sentido, se eu pudesse dar minha vida à ela eu daria.

— E agora? — olhei a Tuane encolhida no sofá

— Relaxa — falei indiferente

— Gabriel, tu foi jogado pra escanteio, fudeu — ela disse abafado

— Fudeu nada não, cara — levantei do sofá

— Você tá pouco se fodendo né?— falou me fazendo rir

— Tuane, para de neura cara, eu ainda tô fechado, só sai da gerência — acendi um cigarro

— Você é burro ou tá se fazendo de cego — se sentou no sofá

— Ah foda se — assopro a fumaça 

— Na próxima que ele tiver, ele vai te descartar totalmente, seu otário — falou se levantando

— Valeu bandida — falei dabochado vendo ela abrir a porta puta

Eu não tô preocupado com esse bagulho, eu tô foda se mesmo, confesso que dava uma revolta já que eu sou cria do bagulho, mas não dava pra bater de frente e é só aceitar e seguir o baile.

Eu tenho consciência de que sou um dos melhores e mais confiantes naquele meio, sem eu e o LN o Martins não é porra nenhuma.

Mensagem de LN: Menor, a Tuane ta aqui na 13 caindo no pau com uma mina.

Sai de casa puto, cada dia que passava a Tuane me dava mais estresse, já não basta os meus ela me arrumava mais, não via a hora de me livrar dessa porra, porrada com ela não adiantava, brigar não faz diferença, arrumar outras era só mais dor de cabeça, não tem nada que pare esse bicho que a Tuane carrega dentro dela.

— Coe — parei a moto do lado do LN observando a Tuane cair no pau com uma mina que eu não identifiquei

— Vai separar não? — perguntou rindo

— Quero que se foda — falei ligando a moto

Joguei a moto em cima delas fazendo a mina largar o cabelo da Tuane e a Tuane veio pra cima de mim gritando, larguei ela lá e parti pro alto do morro, tô sem cabeça pra qualquer bagulho, se eu for pra casa eu ia querer fazer besteira, me perder mais do que já tô perdido.

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Olhares - Livro 2.Onde histórias criam vida. Descubra agora