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CAPITULO 2

—Se divertiu na noite passada Lana? — Ele pergunta com um tom de voz sarcástico.

Ele não está agindo da mesma forma sempre. Cadê os gritos e os xingamentos? Não vai tentar me obrigar a dizer aonde eu estava? Tem alguma coisa muito errada.

—Sim. Desde quando você se importa se você me diverti ou não? —

—Allana, acho que nós dois estamos cansados ​​de todas as brigas desses últimos meses—ele diz calmamente para mim.

Calmo de mais. Calmo de mais. Ele está muito calmo. Será que ele está chapado? Puta merda. O que tá acontecendo?

—Então quer dizer que você pode me deixar em paz? Vou poder aproveitar minhas noites sem ter que ficar me explicando pra você? —tento não dizer isso com um tom debochado, mas não da certo.

—Sim, decidi deixar em paz. Não, você não vai aproveitar suas noites. —ele diz, imitando meu tom debochado. Mas não consigo enxergar a graça por trás da revelação misteriosa dele.

Não entendi

—Então você não me deixou em paz. —minha voz revela minha dúvida.

— Sim, eu deixei. Você vai mudar para a casa da sua tia amanhã Allana. —desta vez ele não tenta ser debochado, mas eu nunca desejei tanto que ele tivesse o feito.

Nem fudendo! —explodo — Você tá maluco? Não pode me mandar pra lá! Você está se livrando de mim. Não pode me tratar como se eu fosse um peso na sua vida e simplesmente me jogar para outra pessoa! EU tomo as decisões na minha vida, não VOCÊ! — grito com toda a força, fazendo a ressaca ir embora de uma forma inexplicável.

—Não Allana, não estou tentando me livrar de você, estou tentando cuidar de você! —ele agora está exaltado, cuspindo as palavras em mim. —Já perdi uma das duas mulheres que mais amo na vida, não posso perder outra. Amo você minha filha, mas você não sabe lidar com o luto. As bebidas e o sexo não vão fazer você esquecer que ela foi. Se você bebe, vê, ela sonha com ela, escuta você falando ou o nome dela à noite. Não adianta fugir disso. Não aguarde você nessa situação, você está sofrendo e está sozinho porque não se abre para ninguém. Me escute e siga meus conselhos. Lá é um bom lugar pra você ... —não consigo mais escutar nada disso.

—NÃO! —interrompo antes que ele fale mais merda —Não pai. Não vou pra cidade aonde ela viveu. Eu vou sofrer mais lá do que aqui. Não posso e não vou.— digo com a voz embargada.

Não vou me mudar pra lá. Consigo imaginar minha tia me mostrando fotos da infância dela e da minha mãe. Vai ser uma tortura. Não vou ter forças para lidar com ela, nem com uma casa onde minha mãe viveu. Será que ele não entende isso?

Só imaginar toda a situação fez meu estômago revirar e antes de me conseguir me mexer e correr para o banheiro já estou vomitando de novo no chão de madeira do apartamento. Droga

—É disso que estou falando Lana. — Ele fala enquanto se abaixa ao meu lado e segura meus cabelos.

Devo admitir que gostei desse jeito carinhoso dele. Não quero ir embora daqui.

—Pai —falo tentando me recuperar —Por favor, não quero ir pra lá. Por favor, não faz isso comigo, não me abandona igual a ela. —as lágrimas caem sem parar de meus olhos.

—Sinto muito minha filha, mas você precisa mais disso do que eu. —seu tom de voz indica que ele está tentando segurar as lágrimas

Afasto suas mãos que estavam acariciando minhas costas, levanto com dificuldade e vou até meu quarto, fecho e tranco a porta. Tiro minha roupa com dificuldade, a náusea bate forte em minha cabeça. Devagar, tentando não vomitar novamente, me deito na cama apenas com as roupas intimas. Nunca me senti tão vazia e perdida em toda a minha vida.

Estou surpresa de ver que meu pai está distante ainda se preocupa comigo, mas eu não preciso dessa preocupação, não agora. Eu preciso me afastar de tudo isso, dessa dor, precisa esquecer por um tempo que ela foi.
Não quero que ele sinta a pena de mim, não é preciso que fique preocupado e tome decisões por mim, achando que vai fazer o melhor quando na verdade ele vai pensar apenas em sí mesmo. Se eu morar com minha tia, essa dor que eu sinto vai piorar. Eu mudar para o mesmo lugar onde ela crescerá será uma tortura, mas também não saberá nada que tenha nessa cidade e nesse lugar sejam bons para mim.

As únicas coisas que estão me ajudando a esquecer tudo isso são as bebidas e as baladas, mas elas estão realmente me ajudando? Acho que não. Não tenho amigos aqui, todos eles são seres vivos egoístas e inúteis, não são reais, vivem de ilusões no seu mundo perfeito aonde o único problema é não ter nenhum problema. Eles não me ajudam, estão cagando para mim. sabem que estou de luto, mas não me lembro de uma unica vez em que um deles veio me dar um abraço ou me ajudar. Qual é a porra do meu problema? Por que eu andava com eles?

Acho que não vai ser uma ideia tão ruim. Pelo menos eu tenho certeza de que nenhuma dor que eu sinto lá vai ser pior do que a que eu sinto aqui. Se é que eu consigo sentir alguma coisa com toda aquela bebida...

Desço da cama, entro no banheiro e me avalio no espelho. Desde que tinha 10 anos sempre fui elogiado pela minha beleza em todos os lugares. Ainda consigo lembrar dos caras mais velhos da empresa do meu pai me encarando nas festas como se eu fosse o prato principal do jantar.


Com o passar dos anos acabei com um corpo que não condiz com a minha idade, um corpo de uma mulher adulta em uma mente de uma adolescente de 18 anos.

Avalio as tatuagens que tenho no meu corpo, uma flor na virilha, um olho com lágrimas abaixo do peito, e minha frase favorita de Tolstoi na costela "O homem não tem poder sobre nada enquanto tem medo da morte. E quem não tem medo da morte possui tudo". Eu e minha mãe fomos fazer essa tatuagem juntas , em homenagem a ela e na esperança de que ela não morresse. Não funcionou, 3 semanas depois ela morreu.

Não me reconheço mais, não sou mais a menina de 16 anos que tinha vergonha até sorrir para alguém na rua. Não aguento mais viver insatisfeita comigo mesma, achando que tudo vai voltar a ser como antes. Eu tentei, mas não deu certo.

Esta é uma hora de recuperação, de encarar o passado e deixar de ir uma vez.

Tomo mais um banho e visto uma roupa adequada e vou até o escritório do meu pai falar com ele. Bato na porta e entro. Ele está prestes para falar algo, mas eu interrompo.

— Pai, eu vou. Eu aceito ir morar com minha Tia pelo tempo que você achar necessário.

Maré De EmoçõesOnde histórias criam vida. Descubra agora