Capítulo 9 - A queda de Modi

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      Nunca estive com tanta pressa para chegar num local, eu e Thor estamos andando há apenas três horas. Como... como Kelda pôde deixar de me contar algo deste nível? Eu... serei pai, e a última coisa que eu queria era que a pessoa mais próxima de mim escondesse isso. Essa situação me fez me sentir culpado, ou traído, ou ambos. Não sei dizer. Fico pensando por que Kelda escondeu isso de mim... ela não quer ter o bebê ou ficou com medo de minha reação? Ah... não importa, as duas alternativas são bobagens. A única coisa que me resta é o posto inteiro saber sobre o filho que teremos, e eu literalmente ter sido o último a saber disso.
       — Não estás feliz? — Thor perguntou.
       — E tenho motivo para estar? — Respondi sua pergunta com uma outra.
       — Claro, mais um membro, ou membra na família. Não vê o quão isso é importante, filho? — Sorriu. Thor, desde que descobriu não parava de sorrir, é como se isso fosse mais importante para ele do que a mim mesmo. E quer saber, talvez seja.
       — Não quero ter uma criança nesta época. O mundo acabará em cerca de três anos, e o que aconteceria com meu filho? Morreria junto?
        Thor não respondeu. Apenas fez-se silêncio em todo o local. Continuamos apertando os passos, porém, continuamos muito distantes do posto de batalha. Há um longo tempo penso no que dizer quando me encontrar com Kelda. Eu poderia ser grosseiro, simplesmente poderia descontar minha fúria nela, mas não sou assim. Não faria uma coisa dessa com minha amada, é só que... tem muitas coisas que estão sendo processadas ao mesmo tempo em minha mente, então fica difícil pensar em qualquer coisa. Nem lembro mais do que ensaiei para dizer a Kelda quando chegássemos lá. E não tenho nem ideia se ainda estarei com raiva até lá, porém, eu espero que não.
       — Modi, não poderemos ir ao posto até que me responda uma coisa.
       Então, parei a caminhada, e sem paciência, questionei Thor:
       — Qual a pergunta?
       Thor demorou um pouco para fazê-la. Muitas vezes olhava em meu rosto e disfarçava seu olhar. Muitas vezes disse "esquece", mas depois se arrependeu. É como se ele estivesse pensando que eu não aceitaria ficar para responder sua pergunta.
       — Você não sente raiva de verdade, ou sente?
       — Parcialmente, sim.
       — Tú não estás irritado, estás com medo. Medo da criança sofrer, e isso te afeta. Sei disso melhor do que ninguém.
       — Talvez... talvez seja verdade. — Eu disse. Agora eu penso melhor.
       Não tenho raiva de minha esposa, apenas possuo medo, insegurança, porém, tenho quase certeza de que estes sentimentos irão acabar quando eu vê-la depois deste tempo. Thor pode estar certo.
       — Eu pude criar pelo menos duas crianças. Não é uma má experiência. No início você pensa que tudo pode ser uma grande perda de tempo, mas só depois você nota o quão incrível isto é. Eu já quis um filho, mas isso foi antes mesmo de sair do Vale Cobblestone. E claro, antes de saber que sou um Deus. São tantas responsabilidades que precisam tomar... eu até pensei em viver normalmente depois que minha missão estiver completa. Talvez eu destrua minha arma, armaduras, e comece a agir mais como um caçador, ou algo do tipo.
       Thor conversou mais um pouco comigo, e eu finalmente entendi o que sentia, não só isso, mas eu me acalmei também. Agora eu fico pensando: por que estava sentindo toda aquela fúria? Foi uma ótima notícia, embora não tenha recebido a mesma da pessoa que desejava. Então... agora iremos descansar, continuar uma viagem mais tranquila no dia seguinte. E não é so porque me acalmei que devo deixar de falar com Kelda, suponho que devo tranquilizá-la, já que normalmente, mulheres grávidas precisam de apoio emocional. Nosso acampamento está pronto, fogueira acesa, o sol já se pôs, e agora só resta uma noite fria e escura, com milhares de estrelas no céu e com a lua cheia no mesmo. Os próximos dias com certeza serão longos e cansativos.

       Não faz cinco minutos desde que chegamos ao posto, fui recebido com grandes sorrisos, e me ofereceram o resto de hidromel da noite passada, a noite na qual comemoraram o aniversário de um velho soldado. Pensar nisso... me faz lembrar do meu aniversário de vinte e três anos. Parece que faz séculos desde que saí do Vale Cobblestone, conheci Mimir, descobri que sou um Deus, lutei com meu irmão, fui para Jotunheim com Thrud, destruí o martelo de Thor, retornei para Midgard, reuni um exército, ganhei uma arma mais poderosa que o Stormaxe, conheci meu pai, tive um certo contato com a Serpente do Mundo, e há pouco tempo descobri que serei pai. Quando eu era mais jovem, costumava acreditar que poderia fazer coisas deste nível em cerca de cinco anos, mas tudo isso aconteceu em menos de doze meses! Bom, para um mortal, tudo isso que passei significava algo bom, e que estou me aventurando demais. Porém, nenhum deles realmente entenderiam meus sentimentos, perder meu pai adotivo... ter que abandonar o Vale, ser obrigado a lidar com muitas mudanças... bom, não devo me preocupar com isto no momento. Agora, estou abraçado com Kelda, ouvindo-a dizer o quão estava com saudades de mim, e dizendo quanto minha presença faz falta. Eu sabia que não conseguiria ficar com raiva perto dela, devolvi todo o amor e carinho que ela sempre deu, e então, chamei para uma conversa séria.
       — Mimir me contou, não precisa mais esconder, tá...?
        — Esconder? Esconder o quê? -- Perguntou. Ela acha que estou falando de outra coisa, ou apenas está fingindo que não sabe que está grávida?
       — As vezes que seu humor, de repente, mudava. As vezes que você não queria me deixar sair para fazer algo importante... é porque você não quis me perder.
       — É, na verdade, eu não quero te perder, Modi.
        — Você não quer me perder porque está gravida! — Fui direto ao assunto. — Você não me contou antes por ter achado que eu ficaria irritado. Na verdade, eu realmente fiquei, mas isso, isso é algo importante. — Disse apontando para sua barriga. Kelda no início estava assustada, mas depois sorriu.
       — Pensei que pudesse me abandonar. — Ela disse.
       — Ah, claro, ainda posso, mas isto é no caso de você não me deixar responsável pelo nome.       Mais uma vez vi seu sorriso, aquele sorriso que me acalma, e aquece a alma, mas aquela sensação acabou rapidamente. Acabo de lembrar do ataque, dos treinos, e que a criança seria mais uma enorme responsabilidade para assumir. Além de que tenho de encontrar a amiga de Mimir no rio Vecker, espero que o que ela tenha para mim sirva para alguma coisa.

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