Oxalá no Novo Mundo

56 1 0
                                    

No Novo Mundo, na Bahia particularmente, Oxalá é considerado o maior dos orixás, o mais venerável e o mais venerado.Seus adeptos usam colares de contas brancas e vestem-se, geralmente, de branco.Sexta-feira é o dia da semana consagrado a ele.Esse hábito de se vestir de branco na sexta-feira estende-se a todas as pessoas filiadas ao candomblé, mesmo aquelas consagradas a outros orixás, tal é o prestígio de Oxalá.É sincretizado na Bahia com o Senhor do Bonfim, sem outra razão aparente senão a de ter ele, nesta cidade, um enorme prestígio e inspirar fervorosa devoção aos habitantes de todas as categorias sociais.

Porém, em Cuba, Òsàlá é relacionado com Nuestra Señora de la Merced.Diz-se na Bahia que existem dezesseis  Oxalás;

Obatalá, Odudua, Orixá Okin, Orixá Lulu, Orixá Ko, Oluiá Babá Roko, Oxalufã, Babá Epe, Babá Lejugbe, Oxaguiã, Orixá Akanjapriku, Orixá Ifuru, Orixá Kere, Babá Igbô, Ajaguna, Olissassa.

Notemos que Babá Lejugbe é sem dúvida Òrìsà Ijùgbe na África, onde é igualmente chamado Òrìsà Eteko, um companheiro de Obàtálá; Orixá Kerê é na África Òrìsà Akiré ou Ìkìrè, um outro companheiro de Obàtálá; Ajaguna é um dos nomes de Òrìsà Ogiyán, que na Bahia é também chamado de Babá Elemessô; Babá Igbô é o próprio Òrìsàálá.Olissassa é no Brasil a versão daomeana (gêge) de Lisa.Quanto a Odùduà, ele figura nessa lista, sem dúvida por causa de sua presença nos mitos de criação do mundo.

Dos orixás funfun, os mais conhecidos na Bahia são os mesmos dos quais falamos para a África, Oxalufã, o Oxalá velho, e Oxaguiã, o jovem.

Existe uma lenda sobre eles, conhecida na Bahia e na África, da qual Lydia Cabrera dá tambem uma versão que recolheu em Cuba.

"Oxalufã, rei de Ifan,decidiria ir visitar Xangô, o rei de Oyó, seu amigo.Antes de partir , Oxalufã consultou um babalaô para saber se sua viagem se realizaria em boas condições .O bablaô respondeu que ele seria vitima de um desastre, não devendo, portanto, realizar a viagem .Oxalufã, porem , tinha um caráter obstinado e persistiu em seu projeto, perguntado que sacrifícios poderia fazer para melhorar a sua sorte.O babalaõ lhe confirmou que a viagem seria muito penosa, que teria de sofrer numerosos reveses e que, se não quisesse perder a vida, não deveria jamais recusar os serviços que, por acaso, lhe fossem pedidos, nem reclamar das conseqüências que disso resultassem.Deveria, também, levar três roupas brancas para tocar e sabão 

Oxalufã se pôs a caminho e, como fosse velho, ia lentamente, apoiado em seu cajado de estanho.Encontrou, logo depois, Èsù Elépo Pupa ('Exu-Dono-do-Azeite-de-Dendê'), sentado a beira da estrada com um barril de azeite-de-dendê ao seu lado.Após uma troca de saudações, Exu pediu a Oxalufã concordou e Exu aproveitou para, durante a operação, derramar, maliciosamente, o conteúdo do barril sobre Oxaulufã, pondo-se a zombar dele.Este não reclamou, segundo as recomendações do babalaô; lavou-se no rio próximo, pôs uma roupa nove e deixou a velha como oferenda.Continuou a andar com esforço, e foi vítima, ainda por duas vezes, de tristes aventuras com Èsù-Eléèdu ('Exu-Dono-do-Carvão') e Èsù Aláàdí ('Exu-Dono-do-Óleo-da-Amêndoa-de-Palma').Oxalufã, sem perder a paciência, lavou-se e trocou de roupa após cada uma das experiências.Chegou, finalmente, à fronteira do reino de Oyó e lá encontrou um cavalo que havia fugido, pertencente a Xangô.No momento em que Oxalufã quis amansar o animal, dando-lhe espigas de milho, com a intenção de levá-lo ao seu dono, os servidores de Xangô, que estavam à procura do animal, chegaram correndo.Pensando que o homem idoso fosse um ladrão, caíram sobre ele com golpes de cacete e jogaram-no na prisão.Sete anos de infelicidade se abateram sobre o reino de Xangô.A seca comprometia a colheita, as epidemias acabavam com os rebanhos, as mulheres ficavam estéreis.Xangô, tendo consultado um babalaô, soube que toda essa desgraça provinha da injusta prisão de um velho homem.Após seguidas buscas e muitas perguntas, Oxalufã foi levado à sua presença e ele reconheceu seu amigo Oxalá.Desesperado pelo que havia acontecido, Xangô pediu-lhe perdão e deu ordem aos seus súditos para que fossem, todos vestidos de branco e guardando silêncio em sinal de respeito, buscar água três vezes seguidas a fim de levar Oxalufã.Em seguida, este voltou a Ifan, passando por Ejigbô para visitar seu filho Oxaguiã, que, feliz por rever seu pai, organizou grandes festas com distribuição de comidas a todos os assistentes."

Essa lenda é comemorada todos os anos na Bahia, em certos terreiros, particularmente naqueles de origem Kêto, por um ciclo de festas que se estende por três semanas.

Numa sexta-feira, dia da semana que no Brasil é consagrado a Oxalá, os axés do deus são retirados do seu "pejí" e levados em procissão até uma pequena cabana, feita de palmas trançadas e simbolizando a viagem de Oxlufã e sua estadia na prisão.

Na sexta-feira seguinte, ou seja, sete dias após, representando os sete anos de encarceramento, tem lugar a cerimônia das "Águas de Oxalá", águas para lavar Oxalá.Todos os que participam da cerimônia chegam na véspera, à noite.O maior silêncio é observado, a partir da quinta-feira ao findar o dia, estendendo-se até a manhã do dia seguinte.Os participantes vão, antes de aurora, pegar as "Águas de Oxalá", todos vestidos de branco e com a cabeça coberta com um pano igualmente branco.Formam um longo cortejo que vai em silêncio, precedido por uma das mais antigas mulheres dedicadas a Oxalá, que agita, sem parar, um pequeno sino de metal branco, chamado adja .Fazem três viagens até a fonte sagrada.Nas duas primeiras, a água para Oxalufã lavar-se.Na terceira vez, que ocorre ao nascer do dia, os vasos cheiros d' água são arrumados em volta do axé de Oxalá.A proibição de falar é sustada, cânticos acompanhados pelo ritmo dos tambores são entoados e transes de possessão se produzem entre as filhas de Oxalá, como testemunho da satisfação do deus.

No domingo seguinte, tem lugar uma cerimônia, pouco importante, mas exatamente uma semana depois, realiza-se uma procissão que leva os axés de Oxalá ao seu "pejí" simbolizando a volta de Oxalufã ao seu reino.

O terceiro domingo, finalizando o  ciclo das cerimônias, é chamado de "Pilão de Oxaguiã" e evoca as preferências gastronômicas desse personagem.Ditribuições de comidas são realizadas em seu nome, a fim de festejar a volta do pai.Nesse dia, uma procissão leva ao barracão pratos contendo inhame pilado e milho cozido, sem sal e sem azeite-de-dend~e, mas com limo da costa.Pequenas varas de atorí, chamadas ìsán, são entregues aos oxalás manifestados, às pessoas ligadas ao terreiro e aos visitantes importantes.Uma roda se forma, onde os dançarinos passam curvados diante dos orixás, que lhes dão, à passagem, um ligeiro golpe de vara; por seu lado, os que foram assim tocados são e recebem, ao rodarem, golpes de vara de assistência.Há, sem dúvida, nessa parte do ritual, reminiscência da luta de Ejigbô, no dia da festa de Oxaguiã.

Uma versão sincretizada das "Águas de Oxalá" é a lavagem do chão da Basílica do Senhor do Bonfim que acontece todos os anos na Bahia, na quinta-feira precedente ao domingo do Bonfim.Alguns piedosos católicos tinham o hábito de lavar zelosamente o chão da igreja, um ato de devoção que não é particular a esse templo.No Bonfim, porém, tomou um caráter diferente, pois os descendentes de africanos, movidos por um sentimento de devoção, tanto ao Cristo como aos deus africano, fizeram uma aproximação entre as duas lavagens: a dos axés de Oxalá e aquela do solo da igreja que leva o nome católico do mesmo orixá.Os devotos aparecem em grande número a fim de participarem da lavagem, na quinta-feira do Bonfim.

Essa festa é, atualmente, uma das mais populares da Bahia,Nesse dia, as baianas, vestidas de branco, cor de Oxalá, vão em cortejo à Igreja do Bonfim.Trazem na cabeça potes contendo água para lavar o chão da igreja e flores para enfeitar o altar.São acompanhadas por uma multidão, onde sempre figuram as autoridades civis do Estado da Bahia e da cidade de Salvador.

ARQUÉTIPO

O arquétipo de personalidade dos devotos de Oxalá é aquele das pessoas calmas e dignas de confiança; das pessoas respeitáveis e reservadas, dotadas de força de vontade inquebrantável que nada pode influenciar.Em nenhuma circunstância modificam seus planos e seus projetos, mesmo a despeito das opiniões contrárias, racionais, que as alertam para as possíveis conseqüências desagradáveis dos seus atos.Tais pessoas, no entanto, sabem aceitar, sem reclamar, os resultados amargos daí decorrentes.

O imenso respeito que o Grande Orixá inspira às pessoas do candomblé revela-se plenamente quando chega o momento da dança de Oxalufã, durante o xirê dos orixás.Com essa dança, fecha-se geralmente a noite, e os outros orixás presentes vão cercá-lo e sustentá-lo, levantando a bainha de sua roupa para evitar que ele a pise e venha a tropeçar.Oxalufã e aqueles que o escoltam seguem o ritmo da orquestra, que interrompe a cadência em intervalos regulares, acompanhando o desfalecer do corpo e a retomada dos movimentos, conjuntamente com os orixás, num afã de comunhão com o Grande Orixá, aquele que foi, em tempos remotos, o rei dos igbôs, longe, bem longe, em Iluayê, a terra da África.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Jul 09, 2019 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Conhecimento dos OrixásOnde histórias criam vida. Descubra agora